Acórdão nº 357/16.1TXEVR-J.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Janeiro de 2023

Magistrado ResponsávelMOREIRA DAS NEVES
Data da Resolução24 de Janeiro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Évora

Nota prévia Este processo foi redistribuído ao presente relator no dia 18 de janeiro de 2023. ACÓRDÃO I – Relatório 1. Por decisão proferida no processo supra identificado, do 3.º Juízo (1) do Tribunal de Execução de Penas de Évora, não foi concedida a liberdade condicional a AA, solteiro, nascido a …/…/1994, melhor identificado nos autos, em cumprimento de pena, no Estabelecimento Prisional de …. Inconformado com tal decisão recorre o recluso concluindo a sua motivação do seguinte modo: «1 – O presente recurso tem por objeto a Douta Sentença pelo Tribunal de Execução de Penas de Évora, que não concedeu a liberdade condicional ao ora recorrente cumpridos, neste momento, quase 5 dos 6 anos de pena de prisão a que foi condenado

2 – Este jovem atingiu o meio da pena em 09.09.2020, tendo apenas sido ouvido em 01.07.2021 para a liberdade condicional no meio da pena, ou seja, por erro grave e atraso não imputável ao arguido, este foi ouvido para o meio da pena quando já se encontrava a cerca de dois meses para atingir os dois terços, o que terá tido repercussões gravíssimas na sua situação, isto é, não terá sido ouvido nos dois terços, tendo sido ouvido apenas em 2022

3 – Com respeito aos factos provados a Douta Sentença considerou os pontos 1 a 12 que aqui se dão por reproduzidos e que nas motivações se transcreveram para melhor exposição

4 – O Douto Tribunal considerou que os pressupostos materiais e requisitos substanciais para a concessão da liberdade não se encontravam preenchidos

5 – Após a reunião do Conselho Técnico, emitiram, por unanimidade, parecer desfavorável à concessão da liberdade condicional. 6 – Ouvido o recluso, o mesmo declarou aceitar a liberdade condicional, preenchendo o pressuposto do art.º 61.º, n.º1 do Código Penal

7 – Entendemos que os pressupostos encontram-se preenchidos. Ora vejamos, 8 – Este jovem nunca tinha estado preso, agora, cumpridos quase 5 dos 6 anos de pena prisão a que foi condenado, sem qualquer medida de flexibilização da pena, já entendeu a relevância das suas condutas criminosas que anteriormente praticou e certamente não voltará a praticar

9 – Aquando do início do cumprimento da pena a que foi condenado, o arguido prestava trabalho num hotel, trabalho esse que se encontra assegurado pelo seu antigo patrão que, por diversas vezes, afirmou estar garantido assim que este jovem fosse devolvido à liberdade

10 – O recluso beneficia de apoios no exterior, nomeadamente da família que muito precisa dele, especialmente a irmã mais nova que sofre de patologia física e psiquiátrica grave, bem como tem perspetivas de integração laboral uma vez que tem emprego garantido pelo seu antigo patrão como supra se expôs, e ao contrário do que na Douta Sentença se afirmou

11 - O seu regresso ao meio exterior não evidencia qualquer problemática relevante junto da comunidade local

12 - Mais ainda, o ora recorrente tem investido no seu percurso, na sua formação, frequentando cursos e mantendo sempre ocupação profissional, o que demostra a sua vontade em manter hábitos de trabalho e de formação, objetivando, tal como já se referiu, uma mudança de vida, demonstrando comportamentos opostos aos de futilidade e imaturidade, como se afirmou na Douta Sentença de que se recorre

13 – Este jovem mantém um comportamento prisional adequado às normas institucionais

14 – O seu trajeto prisional bem como o modo adulto e honroso com que sempre assumiu os actos que cometeu, tendo confessado livre e integralmente os factos em todas as condenações que determinaram a sua actual prisão, são demonstrativos do grau de arrependimento e do espírito critico desenvolvido pelo arguido desde a sua reclusão

15 – Os resultados dos testes realizados em 06.02.2020 e 02.12.2021 onde o ora recorrente acusou positivo a canabinóides não correspondem à realidade, pois o arguido não consome qualquer tipo de estupefacientes desde que se encontra em privação de liberdade, tendo já entendido que tais condutas não o levariam a um porto seguro

16 – Para a realização da contraprova exigiu-se que a mesma fosse paga, despesa essa que este jovem não quis dar aos seus pais, desempenhando um digno comportamento de adulto consciente

17 – Não tendo sido autorizado ao recluso a possibilidade para realizar a contraprova com os meios financeiros de que dispunha dentro do estabelecimento prisional, viu os seus direitos, defesas e garantias restringidos

18 – No que concerne às declarações prestadas pelo arguido, tais são uma exteriorização clara da suficiente consciência crítica e arrependimento face à conduta ilícita pela qual foi condenado

19 – São mais do que claros os objetivos deste jovem que passam por refazer a sua vida familiar, laboral, continuar a prestar auxílio à sua irmã mais nova com patologia física e psiquiátrica grave, bem como continuar a ajudar a sua mãe, evitando, assim, desvios de condutas que anteriormente praticou, mas que não voltará a praticar

20 - Pergunta-se que mais será necessário, uma vez que já se encontram preenchidos todos os pressupostos exigidos, em nosso entender, para que seja concedida ao agente a liberdade condicional? 21 – E mais, se o recluso nunca beneficiou de licenças de saída jurisdicionais e por isso nunca foi possível testar o seu comportamento em meio livre, como se pode afirmar de que existe um perigo e elevado risco do arguido voltar a delinquir? 22 – Assim, deve o Douto Tribunal, em nosso entender, e salvo melhor e mais Douta opinião, analisar a condição actual do recluso, a sua evidente evolução e motivação, para aferir da sua interiorização das condutas criminosas que praticou, ao invés do que fez a Douta Sentença ao basear-se no passado do recluso para concluir pelo perigo de reincidência

23 – Sublinha-se que este jovem nunca beneficiou de uma saída precária, perguntamos, porque? Será que este recluso, tão jovem, não pode ter uma oportunidade para refazer a sua vida e demostrar que não voltará a delinquir? 24 – Não obstante o nosso sistema prisional português visar a reintegração do agente na comunidade, sendo a liberdade condicional o meio adequado para esse fim, tal realidade parece-nos absolutamente utópica

25 – Face ao supra exposto, não foi possível ao Douto Tribunal fazer um juízo de prognose favorável? 26 – Atento ao tudo quanto se expôs, mostram-se, assim, verificados os pressupostos materiais e requisitos substanciais, previstos no art.º 61.º do Código Penal, devendo assim, o Douto Tribunal, colmatar as lacunas, restituindo o arguido à liberdade, para assim cumprir o remanescente da pena, mediante concessão da liberdade condicional podendo, de uma vez por todas, ter a oportunidade de demostrar que entendeu e tem consciência acerca das suas condutas delinquentes e que não voltará a delinquir.» 3. Admitido o recurso o Ministério Público junto do Tribunal de Execução de Penas de Évora apresentou-se a responder sustentando a decisão recorrida, aduzindo em síntese o seguinte: «1. A questão suscitada quanto à oportunidade da douta decisão recorrida [conclusão 2 da peça recursiva] trata-se de uma não-questão, já que o recorrente se limita a afirmar que foi ouvido para a apreciação por referência ao meio da pena já em data próxima dos dois terços da pena e, consequentemente, que a presente apreciação está distanciada dos dois terços da pena, não invocando qualquer violação legal ou consequência jurídica – porventura porque nenhuma existe

  1. Quanto à oportunidade da apreciação dos pressupostos da liberdade condicional nenhum preceito legal foi violado porquanto o recorrente viu esta ser apreciada por referência ao meio da pena não nesse momento mas logo que a sua situação jurídico-penal estabilizou – seguindo a jurisprudência dominante de que é exemplo o Ac. do STJ de 6.9.2012, ainda que apreciando situação de habeas corpus (in www.dgsi.pt) – e vê a sua situação ser apreciada agora na sequência da douta decisão exarada em 11.7.2021 e transitada em julgado, que perfilhou o entendimento de Douto ac. do TRE de 14.2.2012 no sentido de cumprir existir um tempo mínimo de reclusão de 6 meses entre apreciações

  2. Verificados que estão os pressupostos formais, e já tendo sido atingido o cumprimento de dois terços da pena única de seis anos de prisão pela prática de dois crimes de detenção de arma proibida, um crime de consumo de estupefacientes, um crime de condução de veículo em estado de embriaguez e um crime de tráfico de estupefacientes, a concessão da liberdade condicional depende apenas da verificação do requisito material previsto no art. 61º, nº 2, al. a) do Código Penal, ou seja, que fundadamente seja de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da pena de prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável e sem cometer novos crimes

  3. A decisão recorrida – de não concessão da liberdade condicional – baseou-se nos elementos constantes dos autos, de cuja conjugação resulta a conclusão de que não é possível efetuar um juízo de prognose positivo de que o recorrente, uma vez em liberdade, adote um comportamento conforme às regras penais

  4. À formulação de tal juízo de prognose estão subjacentes fortes razões de prevenção especial assentes numa inadequada consciência crítica do recorrente e ausência de reflexão sobre as consequências dos seus atos que, ademais, surgem aliadas ao registo de antecedentes criminais e à forte propensão para o incumprimento de regras

  5. A Mmª Juíza não podia ter deixado de valorar negativamente os factos objetivos relacionados com os testes de despiste de consumo...

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