Acórdão nº 0304/99.3BTLSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Janeiro de 2023

Magistrado ResponsávelSUZANA TAVARES DA SILVA
Data da Resolução26 de Janeiro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1 – BB e AA, ambos com os sinais dos autos, instauraram no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (TAC de Lisboa), em 16 de Dezembro de 1999, recurso contencioso de anulação contra a Câmara Municipal de Albufeira, e contra os recorridos particulares A...- Sociedade… Lda., na qual impugnaram a deliberação de 12 de Janeiro de 1996, da Comissão Administrativa da Câmara Municipal de Albufeira, pela qual foi deferida a concessão de uma licença de construção de obra particular, Os AA. Formularam o seguinte pedido: “[…] Termos em que, invocando o douto suprimento de V. Exa., deve dar-se provimento ao recurso, declarando a nulidade, com todas as legais consequências, do despacho, de 12 de Janeiro de 1996, da Comissão Administrativa da Câmara Municipal de Albufeira, que deferiu a concessão da licença do alvará de construção de obra particular n.º 259/96, despacho esse que enferma do vício de violação de lei em virtude de desrespeitar: · Seguintes artigos do PROT-Algarve (Decreto Regulamentar n.º 11/91, de 21 de Março): o do n.º 2 do artigo 14.º; o da alínea g) do n.º 2 do artigo 11.º; o do n.º 3 do artigo 11.º (violação das alíneas a), b), c) e f) do artigo 1.º do Despacho Conjunto MPAT/MCT, de 15 de Dezembro de 1992, publicado no Diário da República, IP Série, de 5 de Janeiro de 1993).

Sendo que: o De acordo com a alínea b) n.º 2 do artigo 52.º do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro, tal como vigente aquando da prolação do acto recorrido, são nulos os actos administrativos que "violem o disposto em plano regional de ordenamento do território". Nulidade, em caso de desconformidade com um PROT, que já vinha cominada pelo n.º 2 do artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 176-A/88, de 18 de Maio.

· violação do despacho vinculativo de incompatibilidade parcial de Sua Excelência o Senhor Estado da Administração Local e Ordenamento do Território. De acordo com a alínea a) n.º 2 do artigo 52.º do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro, tal como vigente aquando do deferimento do acto recorrido, são nulos os actos administrativos que "não estejam em conformidade com os pareceres vinculativos, autorizações ou aprovações legalmente exigíveis".

· violação dos seguintes artigos do P.D.M. de Albufeira: n.º 2 do artigo 25.º; n.º 1 e n.º 3 do artigo 49.º; alínea a) do artigo 2.º do Anexo II; n.º 1 da alínea f) do artigo 2.º do Anexo II, sendo que: o a alínea a) do n.º 1 do artigo 63.º do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro, prevê o indeferimento de pedido de licenciamento de obra particular em desconformidade com instrumento de planeamento territorial válido; o a alínea b) do n.º 2 do artigo 52.º do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro, em conjugação com o disposto no n.º 1 do artigo 133.° do Código de Procedimento Administrativo, comina a nulidade dos actos administrativos que violem Plano Municipal de Ordenamento do Território.

· dos princípios constitucionais vinculativos: o - da justiça, da boa fé, da segurança jurídica e da confiança legítima, consagrados no n.º 2 do artigo 266.º da C.R.P. e nos artigos 6.º e 6.º-A do C.P.A.; o - da igualdade e imparcialidade, consagrados nos artigos 13.º, 18.º, n.º 1 e 226.º, n.º 2, todos da C.R.P.; o - da tutela dos direitos subjectivos à propriedade privada (artigo 62.º da C.R.P.), a uma habitação que preserve a intimidade pessoal e privacidade familiar (n.º 1 do artigo 65.º da C.R.P.) e a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado (n.º 1 do artigo 66.° da C.R.P.).

2 – A autoridade recorrida apresentou contestação, defendendo-se por excepção e por impugnação (cfr.

fls. 92ss).

3 – A Recorrida particular também apresentou contestação (cfr.

fls. 249ss).

4 – No despacho saneador, o TAC de Lisboa julgou improcedentes as excepções e questões prévias (fls. 396), tendo sido interposto recurso dessa decisão (fls. 471).

5 - Por sentença, foi declarada a nulidade da deliberação recorrida, com fundamento na violação do disposto no artigo 49.º, n.º 1 do PDM de Albufeira.

6 – Inconformada, a Câmara Municipal de Albufeira, recorreu daquela decisão para este Supremo Tribunal Administrativo, que, por acórdão de 12 de Maio de 2010 (fls. 825ss) concedeu provimento ao recurso, entendendo que o TAC de Lisboa não fizera uma correcta interpretação do artigo 49.º, n.º 1 do RPDM, aí dispondo o seguinte: «[…] 2.2.6.3. Ora, atentos os termos fundamentadores da sentença não foi feita a distinção que se impunha. A sentença interpretou, afinal, o artigo 49.º, n.º 1, como se nele estivesse contida, na ausência de plano de pormenor, uma norma de suspensão total de licenciamento de novas construções. Claro que pode ocorrer que, efectivamente, não fosse possível o licenciamento, exactamente por a construção licenciada implicar ocupação não prevista para a área em que se implantou. E a própria recorrente, afinal, parece admitir essa ocupação não prevista, quando aceita que o prédio se implanta "na sua larga medida, em zona de ocupação turística", mas não totalmente, portanto. Mas essa aceitação não vale por confissão, pois não se está em sede de direitos disponíveis, havendo, aliás, contra-interessado. Ademais, em matéria de facto não ficou fixado, exactamente, que zonas ficaram abrangidas pelo licenciamento em discussão. Esse foi, aliás, um ponto de divergência entre a Câmara Municipal e o Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território, conforme as alíneas O) a T) da matéria de facto, e discutido pela sentença na apreciação do outro alegado vício, que julgou improcedente. Assim, torna-se necessário fixar, exactamente, face ao Plano Director Municipal de Albufeira, onde é que se encontra implantado o prédio e qual a ocupação ou ocupações previstas no PDM nessa área de implantação, apreciando-se, em conformidade, o vício que se acaba de analisar. Pelo exposto concede-se provimento ao recurso, revoga-se a sentença e ordena-se a baixa para prosseguimento dos autos para as diligências necessárias e conhecimento de vícios não apreciados, sendo o caso.

[…]».

7 – Após a baixa dos autos foi produzida prova documental e pericial e foi proferida nova sentença em 31 de Outubro de 2019 que decidiu “conceder provimento ao presente recurso e, em consequência, declarar a nulidade da deliberação da Comissão Administrativa da Câmara Municipal de Albufeira, proferida em reunião de 12 de Janeiro de 1996, pela qual foi licenciada à A..., Lda., a construção do hotel sito em ..., por vício de violação de lei (do despacho do SEALOT de 15/09/1995 e art.º 40.º/1 do PROT Algarve, aprovado pelo Dec. Reg. n.º 11/91, art.º 25.º/2 do RPDM de Albufeira, ratificado pela RCM n.º 43/95 e art.º 49.º/3 do referido RPDM).” 8 – Inconformada, a Câmara Municipal de Albufeira, recorreu daquela decisão para este Supremo Tribunal Administrativo, apresentando alegações que rematou com as seguintes conclusões: «[…] I. O acto administrativo que vem posto em causa licenciou a construção de um hotel.

  1. O processo de licenciamento seguiu o regime do Decreto-Lei n.º 328/86, de 30 de Setembro, segundo o qual a competência para aprovar quer a localização quer os projectos daquele estabelecimento pertencia à Direcção-Geral do Turismo (“DGT”).

  2. A DGT aprovou a localização, o projecto de arquitectura e o projecto de alterações do hotel, com pareceres favoráveis da Comissão de Coordenação da Região do Algarve (CCR) e da Câmara Municipal de Albufeira.

  3. Aquelas aprovações, e pareceres favoráveis, não continham quaisquer reservas relativamente à localização ou aos índices urbanísticos que vieram a coincidir com a proposta final acolhida na deliberação municipal aqui sindicada.

  4. Na sentença proferida pelo Tribunal a quo em 13.12.2007, julgou-se não existir na deliberação impugnada o vício de violação do PROT-Algarve que lhe havia sido imputado pelos Recorrentes; VI. A mesma sentença, referida na conclusão que antecede, considerou que o acto administrativo sub iuditio não respeitava o disposto no n.º 1 do art. 49.º do Regulamento do Plano Director Municipal de Albufeira (“RPDM”), e declarou aquele nulo.

  5. Desse julgado, de 2007, interpôs a CMA, e apenas esta, recurso jurisdicional, tendo por objecto, exclusivamente, a reapreciação da decisão no que à ilegalidade declarada pelo Tribunal a quo dizia respeito; VIII. Nem os recorrentes contenciosos, nem a recorrida particular, nem o Ministério Público deduziram recurso, principal ou subordinado, daquela sentença de 2007 do Tribunal a quo.

  6. Por douto Acórdão de 12 de Maio de 2010, o Supremo Tribunal Administrativo, conhecendo apenas do vício invocado pela CMA, deu provimento ao recurso jurisdicional, revogou a sentença, e ordenou a baixa dos autos à instância para que que conhecesse dos vícios não apreciados.

  7. Significa o que vai exposto que, quanto à alegada violação das disposições do PROT-Algarve, aprovado pelo Decreto Regulamentar n.º 11/91, uma vez que tal questão já havia sido apreciada e julgada pelo Tribunal a quo, e não foi objecto de qualquer reapreciação ou censura do S.T.A., o poder jurisdicional encontrava-se esgotado, nessa matéria.

    Certo é que, XI. Tornados os autos ao Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, foi determinada a realização de perícia colegial, e, volvidos cerca de vinte anos desde a abertura da instância, proferida a sentença de que ora se recorre, XII. Sentença essa que assenta, em matéria de probatório, para lá do que já se dera por assente na (entretanto revogada) decisão de 2007, no relatório e esclarecimentos apresentados pelos peritos; XIII. Em síntese, com base na referida perícia, a douta sentença recorrida declarou nula a deliberação controvertida, por violação do despacho do SEALOT de 15.09.1995, do n.º 1 do art. 40.º do PROT-Algarve, e dos arts. 25.º, n.º 2, e 49.º, n.º 3, do RPDM de Albufeira.

  8. Sem prejuízo do que aos demais vícios da douta sentença ora recorrida adiante se aponta, esta, ao decidir que o acto...

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