Acórdão nº 2816/20.2T8BRG.G2-A.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Janeiro de 2023

Magistrado ResponsávelMARIA CLARA SOTTOMAYOR
Data da Resolução17 de Janeiro de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam em Conferência no Supremo Tribunal de Justiça I – Relatório 1.

SPORTING CLUBE DE BRAGA, notificado da Decisão Singular da Relatora que confirma o despacho reclamado (proferido pelo Tribunal da Relação), na parte em que neste não se admite o recurso de revista como revista “normal”, vem reclamar para a Conferência ao abrigo do disposto no artigo 652.º, n.º 3, do CPC, aplicável à revista por força da remissão do artigo 643.º, n.º 4, do CPC, com os seguintes fundamentos: «1. O Recorrente, quando notificado do douto acórdão da Relação de Guimarães que confirmou o saneador-sentença que havia julgado a acção improcedente por não provada e absolvido o Réu AA dos pedidos, interpôs dele recurso de revista, nos seguintes termos: a) Interpôs recurso de revista “normal”, nos termos do disposto no artigo 671.º, n.º 1, do C.P.C.; b) Interpôs também, prevenindo a hipótese de aquele não ser admissível, recurso de revista excepcional ao abrigo do disposto no artigo 672.º, n.º 1, al.

a), do C.P.C., por estarem em causa questões cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é necessária para uma melhor aplicação do Direito.

  1. No que se refere ao recurso de revista “normal”, o Mmo. Desembargador Relator não o admitiu por entender que existe no processo dupla conforme, pelo que não eria admissível recurso ordinário de revista.

  2. A Mma. Conselheira-Relatora, pronunciando-se sobre a reclamação deduzida pelo Recorrente, entendeu, quanto à questão da dupla conformidade, que “tendo o Tribunal da Relação exercido os seus poderes de substituição, cumprindo o contraditório omitido no tribunal de 1.ª instância e decidido a questão da autoridade do caso julgado, ficou sanada a nulidade da sentença e estamos perante uma situação de dupla conformidade, impeditiva da revista normal”.

  3. No entender do Recorrente, pese embora o douto entendimento contido na Decisão Singular a este respeito, não existe efectivamente dupla conformidade impeditiva da revista normal por não existirem duas pronúncias das instâncias sobre a questão da autoridade do caso julgado, razão pela qual deduz a presente reclamação para a Conferência, com os fundamentos que seguidamente expõe.

  4. Como se disse, o recurso de revista “normal” foi rejeitado pela Mma. Conselheira Relatora por entender que existe dupla conforme, dado que a Relação usou os seus poderes de substituição e, cumprindo o contraditório omitido em Primeira Instância sobre a questão da autoridade do caso julgado, decidiu essa questão ficando assim sanada a nulidade da sentença recorrida.

  5. O Recorrente permite-se discordar da afirmação de que a utilização dos poderes de substituição pela Relação, ao abrigo do artigo 665.º do C.P.C., sanou a nulidade da decisão recorrida — pelo menos se entendida com o sentido de que tal substituição convalida a decisão recorrida de modo a esta passar a valer com o sentido dado pela decisão do recurso.

  6. Na realidade, e sempre ressalvado o respeito por diverso entendimento, afigura-se ao Recorrente que a substituição ao tribunal recorrido, quando o recurso se funda em nulidade da decisão recorrida, supõe que a Relação julgue nula esta decisão, caso em que, quando disponha dos elementos necessários para o efeito, a Relação pode ainda assim conhecer do objecto da apelação em lugar de ordenar a descida dos autos para ser proferida nova decisão pela Primeira Instância (artigo 665.º, n.º 1, do C.P.C.).

  7. O que, aliás, é consonante com a constatação de que a substituição ao tribunal recorrido conduz à supressão de um grau de jurisdição (LEBRE DE FREITAS e RIBEIRO MENDES, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 3.º, tomo I, 2.ª ed., p. 132).

  8. Assim, a sentença recorrida não fica sanada — pelo contrário, ela é julgada nula. O vício de que o processo padecia em resultado da sua nulidade é que é sanado por força da substituição da sentença recorrida pelo julgamento feito em sede de recurso.

  9. Ora, se assim é, como parece dever ser, então não ocorre no processo dupla conforme e não tem aplicação o disposto no n.º 3 do artigo 671.º.

  10. Na situação sub judice, a decisão proferida pela Relação assenta no juízo que a Relação fez sobre a existência de uma vinculação do Tribunal, na acção, ao decidido no recurso de revisão que foi interposto numa acção laboral que a precedeu.

  11. Concretamente, entendeu a Relação que, tendo aquele recurso de revisão decidido pela não verificação da falsidade de um recibo de vencimento apresentado pelo aqui Réu na acção laboral, e sendo essa questão da falsidade do recibo causa de pedir da presente acção, tal questão não pode ser novamente apreciada e decidida sob pena de desrespeito pela autoridade do caso julgado ali formado.

  12. Sucede que o acórdão recorrido reconhece, do mesmo passo, que a questão da autoridade do caso julgado não foi discutida em Primeira Instância, e reconhece também que isso é causa de nulidade do saneador-sentença por excesso de pronúncia, por constituir decisão-surpresa, em violação do contraditório.

  13. É inequívoco o acórdão a este respeito: “A sentença recorrida padece pois de nulidade por excesso de pronúncia, podendo este Tribunal supri-la ao abrigo do disposto no art. 665º, nº 1 do C. P. Civil”.

  14. Usando os seus poderes de substituição, a Relação, tendo considerado que as partes tiveram oportunidade de discutir a questão nas...

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