Acórdão nº 3/21.1T8VRL.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Janeiro de 2023

Magistrado ResponsávelMARIA CLARA SOTTOMAYOR
Data da Resolução17 de Janeiro de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I - Relatório 1. INVICTA MARMORISTA UNIPESSOAL, LDA., sociedade unipessoal por quotas de responsabilidade limitada, com sede em lugar ..., ..., instaurou a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra LIBERTY SEGUROS - COMPANHIA DE SEGUROS Y REASEGUROS, S.A. – SUCURSAL EM PORTUGAL, peticionando a sua condenação no pagamento da quantia global de €31.599,00.

Alegou, para tanto e em síntese, que no exercício da sua atividade comercial, celebrou um contrato de seguro do ramo «Multirriscos Indústria», titulado pela Apólice n.º ...40, conforme condições particulares e especiais, sendo que, de acordo com as “Condições Particulares e Especiais” dessa apólice de seguro, a Ré, além de outros danos, responde civilmente pelos prejuízos decorrentes de danos em equipamento industrial e por riscos elétricos.

Alega ainda que no dia 10/05/2020, a cidade ... foi atingida por um temporal, com trovoadas fortes e que em 11/05/2020, no início da sua laboração, ao ligar a máquina de corte de pedra, marca “JMM”, constatou que a mesma não funcionava, pelo que chamou um técnico que se deslocou ao local, em 11/05/2020.

Mais alegou que depois de lhe ter sido entregue o “Relatório de Avaria” e a “Fatura Proforma”, em 18/05/2020, a Autora participou o sinistro à Ré com a anexação dos aludidos relatórios e fatura, e, por missiva datada de 24/07/2020, cerca de 2 meses depois da visita do perito da Ré, esta comunicou a recusa da responsabilidade, por entender que o sinistro em crise não se enquadra nas garantias da sua apólice, uma vez que do teor daquela missiva é lá descrito que a apólice não cobre o sinistro por a máquina em causa ter 19 anos e que de acordo com o clausulado na apólice, os danos em equipamentos com mais de 10 anos de fabrico estão excluídos.

Que do teor das “Condições particulares e Especiais” não resulta qualquer exclusão por efeito da idade das máquinas que fazem parte do acervo industrial da Autora, pois se aquando da celebração do contrato de seguro tivesse sido esclarecido à Autora que se encontravam excluídas da responsabilidade da R. as máquinas com idade superior a 10 anos, jamais a Autora outorgaria tal contrato, uma vez que todas as máquinas que fazem parte do seu acervo industrial têm idade superior a 10 anos.

Regularmente citada, a Ré defendeu-se por impugnação e por exceção, reconhecendo ter celebrado com a Autora o contrato de seguro do ramo “Multirriscos Indústria”, titulado pela Apólice n.º ...40, que inclui, entre o mais, a responsabilidade por danos ocorridos no conteúdo da Fábrica de artigos de granito e de rochas da Autora, no qual se encontram incluídas as garantias complementares de “Riscos Elétricos” e “Danos em Equipamento Industrial”, tendo cada uma das mencionadas coberturas o limite de €12.500,00 e tendo ficado convencionada, quanto à cobertura de “Riscos Elétricos” uma franquia de 10% do valor de sinistro, com o mínimo de €50,00 e o máximo de €500,00 e quanto à cobertura de “Danos em Equipamento Industrial” uma franquia de 10% do valor de sinistro, no mínimo de €250,00.

Mais alega que relativamente à cobertura de Riscos Elétricos, dispõe a Apólice de Seguro em vigor, no ponto n.º 2 da CONDIÇÃO ESPECIAL 15 - RISCOS ELÉTRICOS, sob a epígrafe “Exclusões” que “Ficam excluídos do âmbito desta garantia complementar os danos: e) Que afetem equipamentos administrativos com mais de cinco anos de fabrico; f) Que afetem equipamentos da atividade com mais de dez anos de fabrico”.

E, no que respeita à cobertura de Danos em Equipamentos da Atividade, dispõe, igualmente, a mesma Apólice de Seguro em vigor, no n.º 2 da CONDIÇÃO ESPECIAL 18 - DANOS EM EQUIPAMENTOS ADMINISTRATIVOS E EM EQUIPAMENTOS DA ATIVIDADE, sob a epígrafe “Exclusões” que “1. Para além das exclusões constantes do Artigo 4. das Condições Gerais, ficam igualmente excluídas do âmbito de cobertura desta garantia as perdas ou danos verificados: em equipamentos administrativos com mais de cinco anos de fabrico; em equipamentos da atividade com mais de dez anos de fabrico”.

Entende a Ré que, como alega a Autora, o equipamento cujos danos são reclamados, tem mais de 10 anos de idade, está in casu afastada a responsabilidade da demandada e esta mostra-se exonerada da obrigação de indemnizar.

A Autora veio a responder à matéria de exceção, alegando que nada do que a Ré alega no seu articulado está conforme o clausulado das “Condições Gerais”, ou seja, do teor das cláusulas não se encontra lá determinada a exclusão de responsabilidade em equipamentos da atividade com mais de 10 anos de fabrico, que a Ré alega em sua defesa e que, para além das “Condições Particulares”, a Ré nunca entregou à Autora as “Condições Gerais” aqui em crise e, não fazia qualquer sentido a um pater familias médio celebrar com a Ré o contrato de seguro em mérito com as exclusões alegadas pela mesma, na medida em que todas as máquinas de laboração da Autora têm mais de 10 anos de idade.

Mais alegou que a Ré em momento algum deu cumprimento às suas obrigações de informação e esclarecimento, designadamente, as previstas nos artigos 18º a 21º do DL 72/2008. Foi dispensada a realização da audiência prévia, foi proferido despacho saneador e despacho destinado à identificação do objeto do litígio e a enunciar os temas da prova.

  1. Veio a efetivar-se a audiência de discussão e julgamento com a prolação de sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva: “Em face do exposto, nos presentes autos de ação declarativa, sob a forma de processo comum, julga-se parcialmente procedente por provada a presente ação e em consequência decide-se: 1- Condenar a Ré LIBERTY SEGUROS - COMPANHIA DE SEGUROS Y REASEGUROS, S.A. – SUCURSAL EM PORTUGAL, a pagar à Autora INVICTA MARMORISTA UNIPESSOAL, LDA., a quantia de 7.749,00 euros, (sete mil setecentos e quarenta e nove euros) acrescida de juros legais, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento - deduzindo-se o montante atinente à franquia respetiva.

    2- Absolver a Ré LIBERTY SEGUROS - COMPANHIA DE SEGUROS Y REASEGUROS, S.A. – SUCURSAL EM PORTUGAL, do demais peticionado pela Autora”.

    ***** Nos termos do artigo 527.º n.º 1, do CPC, “a decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa, ou não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito.” No n.º 2, do mesmo artigo “entende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.” Resulta do artigo 607.º n.º 6, do CPC que, no final da Sentença, o juiz deve condenar os responsáveis pelas custas processuais, indicando a proporção da respetiva responsabilidade.

    Assim, nos termos conjugados, pelos artigos 607.º n.º 6, 527.º n.º 1 e 2, todos do Código de Processo Civil, as custas da presente ação, serão suportadas na proporção de 80% para a Ré Seguradora LIBERTY SEGUROS - COMPANHIA DE SEGUROS Y REASEGUROS, S.A. – SUCURSAL EM PORTUGAL, e 20% para a Autora.

    Registe e notifique.” 3.

    Inconformada, apelou a Autora da sentença, tendo o Tribunal da Relação decidido julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida, embora com um fundamento distinto.

  2. Novamente inconformada, a autora interpõe recurso de revista normal, por entender que a fundamentação das instâncias é essencialmente diferente, formulando as seguintes conclusões: «1 – A Recorrente não se conforma com o d.

    acórdão em reapreciação porquanto no mesmo apresenta, com o devido respeito, inadequada aplicação das regras de direito na parte em que absolve a recorrida dos pedidos de indemnização pelas perdas e danos sofridos pela recorrente.

    2 – A Apelante conforma-se com a decisão na parte em que imputa a responsabilidade de indemnização pela avaria da máquina industrial à recorrida, bem como a quantia de 7.749,00 euros (sete mil setecentos e quarenta e nove euros) em que a mesma foi condenada a pagar.

    3 – No nosso modesto discernir da recorrente mal andou o d.

    acórdão, quanto à obrigação da Seguradora indemnizar por perdas e danos, ao entender que:

    1. O que está em causa é a ausência de convenção sobre o dano dos chamados lucros cessantes e a aplicação do regime supletivo consagrado no artigo 130º do RJCS e não a clara violação dos deveres de não entrega das “Condições Gerais e Especiais” do contrato de seguro e comunicação e informação expressos nos arts.

      5º e 6º do do D.L.

      nº 446/85, de 25 de Outubro.

    2. A recorrida violou deveres legais acessórios de conduta, mas, apesar disso, decide absolvê-la por, no seu entendimento, a violação dos deveres acessórios que se impunham por aplicação do princípio da boa-fé e consequente indemnização só se vencem, nos termos do nº 1, do art.

      102º e 104º do RJCS, depois de decorridos 30 dias sobre o apuramento dos factos.

      4 – No seu modesto discernir, entende a Recorrente que que ocorreu um manifesto e notório erro na apreciação da matéria de facto e de direito, impondo-se a sua reapreciação por V. Ex.ªs.

      5 – Em relação à al.

      a) do ponto anterior resulta a prova dos seguintes factos: «25 - Se aquando da celebração do contrato de seguro em mérito lhe tivesse sido esclarecido que se encontravam excluídas da responsabilidade da R. as máquinas com idade superior a 10 anos a A. jamais outorgaria tal contrato, uma vez que todas as máquinas que fazem parte do seu acervo industrial têm idade superior a 10 anos.

      26 - Nunca a R., para além das “Condições Particulares e Especiais”, entregou à A. qualquer outro documento referente ao contrato de seguro.

      27 - Não foi entregue à A. quaisquer exemplares, que não sejam as “Condições Particulares e Especiais”.

      28 - Não foram cumpridos os deveres de comunicação e de informação, requisi-tos de validade do contrato de adesão».

      6 - Ora, dos factos dados como provados e acima transcritos resulta a certeza que a Ré não cumpriu com os deveres de comunicação e de informação impostos pelos arts.

      5º e 6º do D.L.

      nº 446/85 sobre as condições do contrato de seguro.

      7 - Em face de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT