Acórdão nº 0981/10.6BESNT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Janeiro de 2023

Magistrado ResponsávelANABELA RUSSO
Data da Resolução18 de Janeiro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acórdão 1. RELATÓRIO 1.1.

“B..., Lda.”, notificada do acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo, que confirmou o despacho da relatora de rejeição do Recurso para Uniformização de Jurisprudência por absoluta falta de conclusões, veio, ao abrigo do preceituado no artigo 652.º, n.º 5, al. a) do Código de Processo Civil (CPC), apresentar a presente reclamação.

1.2.

Como fundamento do pedido de revogação do acórdão de rejeição e consequente prolação de acórdão de uniformização, alega, em síntese nossa, que: - O acórdão reclamado do Pleno da Secção “é de opinião” de que havendo omissão total de formulação de conclusões nas alegações de Recurso para Uniformização de Jurisprudência, este deve ser liminarmente indeferido, nos termos dos artigos 642.º, n.º 2 e 639.º do CPC; - “A verdade é que a reclamante não partilha desse entendimento”, entendendo que as alegações só têm que conter, de forma precisa e circunstanciada, os aspectos de identidade que determinam a contradição alegada e a infracção imputada ao acórdão recorrido, nos termos do artigo 284.º, n.º 1 e 2 do CPPT; - o recurso só não deve ser admitido, como estabeleceu o legislador, se “a orientação perfilhada pelo acórdão impugnado estiver de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo»; - a falta de conclusões é um mero entrave formal, pelo que, ao abrigo do dever de cooperação, devia o Tribunal ter convidado a parte à sua sanação, o que, inclusive, a Recorrente fez ao ter optado por interpretar o despacho da Excelentíssima Juíza Conselheira Relatora como se um convite se tratasse e apresentando novas alegações contendo já a formulação de conclusões; - Assim não sendo entendido, verificar-se-á uma manifesta violação do princípio de igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, uma vez que, nos termos do n.º 5 do artigo 639.º do CPC, a disciplina normativa consagrada nos números 1 a 4 do citado preceito não se aplica ao Ministério Público quando recorra por imposição legal; - o artigo 690.º do CPC na redacção do Decreto n.º 29637, de 28 de Maio de 1939, consagrava a possibilidade de haver convite à formulação de conclusões; - consta de uma declaração de voto de vencido de um Senhor Juiz Desembargador do Tribunal da Relação de Lisboa, em que a Reclamante se revê e louva, que na interpretação das normas o intérprete deve sempre privilegiar o entendimento de que decorra uma mais ampla faculdade de exercício dos direitos em causa; - a Reclamante, “por uma razão de coerência e seguimento jurisdicional da motivação do indeferimento liminar do requerimento de interposição do Recurso para Uniformização de Jurisprudência não pode deixar de alegar a inconstitucionalidade da interpretação/aplicação” dos artigos 692.º, n.º 1 e 639.º do CPC.

1.3.

Conclui, advertindo este Supremo Tribunal que “em caso de insucesso, que intenta haver um último recurso para o Tribunal Constitucional, com fundamento no que acaba de ser exposto, no seguimento do que dispõe o artigo 70.º, n.º 1 b) e n.º 2 e artigo 71.º n.º 1 da Lei do Tribunal Constitucional”, caso não seja proferida “uniformização de jurisprudência no caso hic et nunc”.

1.4.

Em cumprimento de despacho proferido pela ora Relatora, foi a Reclamante notificada para, querendo, se pronunciar sobre a eventual aplicação da taxa sancionatória prevista no artigo 531.º do CPC, o que veio a fazer, defendendo que tal aplicação carece de fundamento uma vez que (em resumo nosso): - Apenas insistiu na desigualdade processual que existe na lei, por atribuir ao Ministério Público, no artigo 639.9 n.9 5 do CPC, o privilégio de não ser sancionado pela omissão de conclusões, que o CPPT apenas exige que se identifiquem e revistam de forma precisa os aspectos de identidade que determinam a contradição alegada, que a omissão de conclusões constitui um entrave meramente formal a que o princípio da cooperação se deve sobrepor, o que significa que este Supremo Tribunal tinha que a ter convidado a aperfeiçoar a sua peça recursiva e que o artigo 639.º do CPC é inconstitucional; - para aplicar a taxa sancionatória excepcional é necessária uma actuação imprudente e manifestamente infundada e abusiva, correlacionada, todavia, com uma decisão judicial de fundamentos válidos e concretos, pela qual resulte evidente que a parte não agiu com a prudência ou diligência devida, o que não é o caso manifestamente: a chamada ao contraditório, sob a aplicabilidade do artigo 531º não foi motivada e surge sem mais na marcha do processo, frustrando-se o contraditório constitucional.

- não parece à Reclamante ser possível concluir pela verificação dos requisitos enunciados, uma vez que o recurso ao disposto no artigo 652.º, n.º 5, al. a) do CPC não configura a utilização de um meio processual abusivo, antes se trata de uma sofisticação do exercício do direito de defesa, antes de mais, no âmbito e alcance do due process of law; - a chamada a uma decisão definitiva por parte de sua “Excelência, o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça”, intentada pela Reclamante não é um ato processual manifestamente infundado, nem tão pouco revela falta de prudência ou de diligência, muito pelo contrário; - a Reclamante limitou-se a utilizar um meio que a lei [no artigo 652.º, n.º 5 a) do CPC] contempla e adequado de reagir à complexa situação processual ocorrida, não constituindo a sua actuação, portanto, uma atitude abusiva; - é possível e desejável, neste caso, aplicar a norma citada, descobrindo nela uma ampliação de sentido, que a não restrinja à simples apreciação da competência tal e qual do tribunal, mas ao campo de um exercício do Tribunal da Relação mais perfeito e de acordo com a lei.

- neste sentido, não parece ser demasiado trazer à colação o que refere o acórdão de 07-10-2021 do Tribunal da Relação do Porto, proferido no proc. n.º 27758/18.8T8PRT.P1: "O que significa, em síntese, que esta taxa poderá/deverá ser aplicada só quando o ato processual praticado pela parte seja manifestamente infundado, tendo ainda a parte revelado nessa prática falta de prudência ou de diligência, a que estava obrigada, assumindo o ato um carácter excepcionalmente reprovável, por constituir um incidente anómalo, um desvio acentuado e injustificado à tramitação regular e adequada do processo.

Tipicamente cabe nessa previsão a utilização de meios não previstos na lei ou a sua utilização claramente abusiva para dificultar a marcha do processo, ou seja, a prática de actos meramente dilatórios completamente infundados." - não pode, por isso, o Tribunal considerar a atitude da Reclamante como abusiva, já que a mesma apenas praticou um ato susceptível de conduzir a um resultado de maior aperfeiçoamento da...

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