Acórdão nº 159/18.0GCPBL.C2-B.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Janeiro de 2023

Magistrado ResponsávelM. CARMO SILVA DIAS
Data da Resolução12 de Janeiro de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc. n.º 159/18.0GCPBL.C2-B.S1 Fixação de jurisprudência Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça I. Relatório 1.

Em 29.09.2022 os arguidos MGSI - Acessórios para Indústrias Ldª e AA interpuseram recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, nos termos do artigo 437.º, n.º 2 do CPP, por haver oposição entre o acórdão recorrido do TRC de 20.04.2022 proferido nestes autos n.º 159/18.0GCPBL.C2 e o acórdão do TRP de 8.03.2017, proferido no processo n.º 121/15.5JAPRT.P1.

  1. Para o efeito, apresentou os seguintes fundamentos (transcrição, sem sublinhados, nem negritos): O Tribunal a quo, julgando parcialmente improcedente o recurso interposto da decisão da primeira instância, condenou os arguidos pela prática de um crime de violação das regras de segurança previsto e punível pelos artigos 11.º, n.º 2, al. a) e n.º 4 e 152.º-B, n.º 1 e 4, al. a) do Código Penal, nas seguintes penas: - O arguido AA, na pena de três anos e quatro meses de prisão, suspensa na sua execução, por igual período temporal; - A arguida MGSI - Acessórios para Indústrias, Lda., na pena de quatrocentos e vinte dias de multa à taxa legal de cento e vinte euros, o que perfaz a multa global de cinquenta mil e quatrocentos euros; E manteve a condenação de ambos os arguidos a pagarem, solidariamente, a quantia indemnizatória de oitenta mil euros aos demandantes cíveis.

    No acórdão recorrido, o Tribunal a quo decidiu não conhecer da impugnação dos factos provados sob os pontos 16 a 20, com excepção da factualidade de “à data do acidente os arguidos não sabiam que a plataforma estava a ser usada”, nem dos factos não provados com os n.ºs 7, 8 e 9, por entender que tal factualidade não foi objecto de impugnação individualizada.

    Nos termos do n.º 3 do artigo 412.º do CPP, “Quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, o recorrente deve especificar: a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida; c) As provas que devem ser renovadas.” O n.º 4 do mesmo normativo estabelece, ainda, que “quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na ata, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 364.º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação.” A parte que impugna matéria de facto tem um duplo ónus: por um lado, o de circunscrever ou delimitar de forma precisa e sintética, o objecto do recurso, indicando claramente a parcela ou segmento da decisão que considera viciada e, por outro lado, fundamentar as razões por que discorda do decidido, indicando os meios probatórios que conduzam a decisão diversa da tomada, quanto a concretos pontos de facto que pretende impugnar.

    Os ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão em matéria de facto decorrem dos princípios estruturantes da cooperação, lealdade e boa-fé processuais, com vista a assegurar a seriedade do recurso e obviar que os poderes da Relação sejam utilizados para fins dilatórios.

    Cumpridos que sejam os requisitos estabelecidos no artigo 412.º, n.ºs 3 e 4 do CPP, o Tribunal da Relação ad quem deve reapreciar a matéria de facto impugnada.

    Nas suas alegações de recurso para o Tribunal da Relação, os recorrentes impugnaram, entre outra, a factualidade dada como provada sob os pontos 16 a 20 e não provada sob os pontos 7, 8 e 9.

    Os recorrentes impugnaram em conjunto os referidos pontos 16. a 20 dos factos provados e 7., 8, e 9 dos factos não provados. Mas não deixaram de indicar os concretos pontos de facto que consideram incorrectamente julgados, nem de indicar as concretas provas que, no seu entender, impõem decisão diversa da recorrida, indicando e transcrevendo concretamente as passagens dos depoimentos gravados em que fundamentam a sua impugnação.

    Os recorrentes fizeram, ainda, uma análise crítica da prova que concretamente convocaram para alterar a decisão dos concretos pontos da factualidade em causa.

    Os factos em causa estão interligados entre si e é a mesma a prova convocada pelos recorrentes para impugnar a decisão que sobre os mesmos recaiu.

    A impugnação em bloco desta factualidade evitou que os recorrentes repetissem várias vezes e fastidiosamente a indicação dos mesmos meios de prova e das mesmas passagens dos depoimentos que, no seu entender, impõem a alteração da decisão da factualidade provada sob os pontos 16 a 20 e não provada sob os pontos 7, 8 e 9.

    A técnica adoptada pelos recorrentes é perfeitamente perceptível, não configurando um mero ataque de forma genérica e global à decisão de facto, pelo que os recorrentes cumpriram o ónus de impugnação, não sendo obstáculo à apreciação a opção pela impugnação conjunta dos factos em causa.

    A impugnação dos factos provados sob os pontos 16 a 20 e dos factos não provados sob os pontos 7, 8 e 9, não redunda numa impugnação genérica ou vaga.

    No seu recurso, os recorrentes deram, assim, cabal cumprimento ao ónus de especificação dos pontos de facto impugnados e de especificação das concretas provas que impõem decisão diversa da factualidade recorrida, com indicação das concretas passagens da prova gravada convocada nesse sentido, fazendo uma análise crítica da prova e indicando o sentido que defendem dever ser alterada a tal factualidade.

    Em situação semelhante – em que o arguido impugnou em bloco a decisão de facto -, o Tribunal da Relação do Porto, proferido em 08/03/2017, no âmbito do processo n.º 121/15.5JAPRT.P1, publicado em www.dgsi.pt, decidiu que: “O arguido impugna, em bloco, toda a matéria de facto considerada provada no acórdão recorrido, com exceção dos seguintes: (…); Entende-se que essa técnica processual – de impugnação em bloco, por exclusão – não é a mais correta - tanto mais que pode resultar em erros notórios de motivação, como é o caso, uma vez que, através dessa modalidade, o recorrente também impugnou a factualidade pertinente à ausência de antecedentes criminais e à sua situação pessoal, o que não é...

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