Acórdão nº 1169/19.6T9BCL.G1-A.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelANTÓNIO GAMA
Data da Resolução21 de Dezembro de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo n. º1169/19.6T9BCL.G1 Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: I.

  1. AA, arguido, interpôs recurso extraordinário para fixação de jurisprudência do acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 30.06.2022, alegando encontrar-se em oposição com o acórdão do mesmo Tribunal da Relação de Guimarães, de 07.06.2021, proferido no processo nº 162/19.3GBBCL.G1.

  2. No requerimento alega em conclusão (transcrição): «(…) II - Existe uma contraposição óbvia e evidente entre o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães do processo nº 162/19.3gbbcl.g1 proferido a 07/06/2021 com o acórdão desta mesma relação do processo nº 1169/19.6t9bcl.g1 proferido a 30/06/2022.

    III. Ao abrigo do artigo 437º, nº 2cpp, a existência destas decisões opostas é motivo suficiente para a admissibilidade do recurso para o supremo tribunal de justiça, verificando-se, nomeadamente, uma contradição com outro acórdão anteriormente proferido pelo mesmo tribunal, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito.

    IV. No processo n.º 162/19.3gbbcl figurava como queixoso/assistente o arguido BB, e assumia o papel de arguido o ora ofendido/assistente AA. Pelo contrário, no processo nº1169/19.6t9bcl.g1 figurava como queixoso/assistente o arguido AA, e assumia o papel de arguido o ora ofendido/assistente BB.

    1. Em ambos os processos estamos perante um episódio em que intervieram assistente e arguido, no dia 13 de fevereiro de 2019, na rua ..., em ..., ....

      vi. A identidade da situação fáctica é reforçada com o deferimento do pedido de escusa do mmo. juiz sr. dr. CC, para intervir no processo comum (tribunal singular) nº 1169/19.6t9bcl, que correu termos no tribunal judicial da comarca de Braga, juízo local criminal ... - juiz ....

      vii. No processo nº 162/19.3gbbcl, ali se decidiu verificada uma situação de legítima defesa, como causa de justificação da conduta do (ali) arguido AA, e, consequentemente, absolveu-se este da prática do imputado crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo art. 145º, nº1, al.a), e nº2, por referência ao art. 132º, nº2, al. h)e 143º, nº1, do código penal.

      viii. No processo nº 1169/1169/19.6t9bcl, ali se decidiu verificada uma situação de legítima defesa, como causa de justificação da conduta do (ali) arguido BB, e, consequentemente, absolveu-se este da prática do imputado crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo art. 145º, nº1, al. a), e nº2, por referência ao art. 132º, nº2, al. h) e 143º, nº1, do código penal.

      ix. Quando o agente atue em legítima defesa, não lhe pode ser oposto pelo visado o direito à legítima defesa. Contra legítima defesa não vale legítima defesa.

    2. Dispõe o art.32.º do código penal: «constitui legítima defesa o facto praticado como meio necessário para repelir a agressão atual e ilícita de interesses juridicamente protegidos do agente ou de terceiro xi. Ao abrigo do artigo 32º do código penal, exige a presença de cinco requisitos objetivos e um elemento subjetivo, a saber, a agressão de interesses juridicamente protegidos do agente ou de terceiro, a atualidade da agressão, a ilicitude da agressão, a necessidade da defesa, a necessidade do meio e o conhecimento da situação de legítima defesa, sendo que os três primeiros requisitos objetivos se referem à situação em que o agente atua e os dois últimos à ação de defesa.

      xii. Posto que a agressão perpetrada pelo BB ao AA, antes de este lhe desferir com o martelo, se mostrava atual, ilícita (também ela, consubstanciando, pelo menos, ela própria a prática do crime de ofensa à integridade física, p.e p. pelo art.143.º,n.º 1,do código penal)e atingia o referido bem jurídico (integridade física, senão avida, do AA), não se nos colocam dificuldades quanto à verificação do requisito da defesa.

      xiii. Por outra banda, considerando a disparidade de forças (desde logo face às especiais características pessoais dos contendedores, nomeadamente a sua idade) e a possibilidade de AA se puder socorrer de outro meio, afigura-se-nos proporcional e, por isso, de arredar a concitação de uma eventual desproporção ou excesso de meios empregos, o desferir do martelo, tanto que o arguido não previu o local onde o mesmo pudesse vir a atingir o assistente.

      xiv. Só a versão espelhada nos autos do processo nº 162/19.3gbbcl, poderá ter cabimento e assentimento para o conhecimento do tribunal ad quem, pois é nesta que se apresentam clara e cristalinamente aplicados os requisitos e pressupostos já supra enunciados da aplicação da legitima defesa ao assistente AA em virtude da ação direta, ilícita e criminosa, do arguido BB.

      xv. No que diz respeito à legítima defesa e como estamos no nosso entender perante tal instituto vejamos o seguinte, seguindo a opinião tecida no processo nº 162/19.3gbbcl.g1 de 07/06/2021, dispõe o art. 32.º do código penal: «constitui legítima defesa o facto praticado como meio necessário para repelir a agressão atual e ilícita de interesses juridicamente protegidos do agente ou de terceiro».

      xvi. Consideram-se como sendo «meios adequados» para impedir ou repelir a agressão, mas mais danosos (para o agressor) do que aqueles que, sem deixarem de ser adequados (suficientes, eficazes), causariam menores lesões ou prejuízos ao agressor, serão considerados desnecessários e, como tal, excluirão a justificação do facto praticado pelo agredido (posto que qualquer meio que transponha a barreira da estrita necessidade – necessidade do meio mas também necessidade da própria defesa – entrará num excesso de legítima defesa).

      xvii. Igualmente, devem ser considerados inadequados os meios que, apesar de pouco danosos para o agressor, não dispõem de quaisquer possibilidades de impedir a agressão ou de dissuadir o agressor.

      xviii. Por isso, tem-se decidido que o juízo sobre a adequação do meio de defesa não pode deixar de ter em consideração as circunstâncias concretas de cada caso: o bem ou interesse agredidos, o tipo e a intensidade da agressão, a perigosidade do agressor e o seu modo de atuar, a capacidade físico-atlética do agressor e do agredido, bem como os meios de defesa disponíveis e as demais circunstâncias relevantes ocorrentes (Taipa de Carvalho, a legítima defesa,1995, p. 318).

      xix. A defesa só é...

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