Acórdão nº 6913/18.6T8BRG.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Dezembro de 2022
Data | 15 Dezembro 2022 |
Órgão | http://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal) |
* I - Relatório O Autor propôs a presente ação declarativa condenatória, com processo comum, pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe uma indemnização no valor global de 996.680,77 €, acrescida de juros de mora desde a citação.
Alegou como causa de pedir ter sido vítima de um acidente de viação quando se dirigia para o seu local de trabalho num motociclo, totalmente imputável a um segurado da Ré, tendo sofrido lesões que lhe causaram prejuízos patrimoniais e não patrimoniais que devem ser indemnizados através do pagamento de uma quantia no valor peticionado.
Contestou a Ré, aceitando a validade do contrato de seguro do veículo interveniente no acidente e assumindo a imputação da responsabilidade única, exclusiva e culposa na eclosão do embate ao condutor desse veículo.
Alegou ainda que, sendo o acidente em simultâneo de trabalho e de viação, que a Ageas Portugal – Companhia de Seguros, S.A., seguradora para quem estava transferida a responsabilidade infortunística através da apólice n.º ...75, procedeu ao acompanhamento clínico do autor, já lhe tendo pago diversas quantias, pelo que requereu a intervenção ao lado do Autor daquela Companhia de Seguros.
Foi admitida a intervenção principal ao lado do Autora da Ageas Portugal – Companhia de Seguros, S.A., a qual apresentou o seu articulado, pedindo que a Ré fosse condenada a pagar-lhe, relativamente a quantias adiantadas ao Autor, 85.479,26 €, acrescido do que vier ainda a pagar ao Autor, a fixar em liquidação posterior.
A Ré, contestou, impugnando os valores alegadamente pagos pela Interveniente.
A Interveniente ampliou o pedido inicialmente formulado, somando-lhe mais € 7.104,00.
Realizou-se audiência de julgamento, tendo sido proferida sentença que decidiu: a) condenar a ré Allianz Portugal a pagar ao autor AA a quantia global de € 637.030,22, sendo: - € 512.030,22, a título de danos patrimoniais [sem prejuízo da subtração das quantias já recebidas e/ou a receber, no processo de acidente de trabalho, designadamente a título de pensão anual e vitalícia e/ou salários perdidos]; - € 125.000,00, a título de danos não patrimoniais sofridos.
Tudo acrescido de juros de mora, à taxa supletiva legal de 4%, contados sobre a quantia fixada a título de danos patrimoniais desde a data da citação e sobre a quantia a título de danos não patrimoniais desde a data da presente sentença, até efetivo e integral pagamento.
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condenar a Ré Allianz Portugal a pagar ou a fornecer ao autor AA todas as ajudas técnicas, tratamentos e medicamentos que necessita até ao final da sua vida, mormente reembolsando-o dos valores que venha a suportar com a aquisição de analgésicos e do suporte branquial, com tratamentos de medicina física e de reabilitação e com revisões cirúrgicas, ou em alternativa, no caso de cirurgias ou sessões de MFR que a Ré as faculte ao Autor nos seus serviços clínicos.
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absolver a ré Allianz Portugal do demais peticionado pelo autor.
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condenar a ré Allianz Portugal a pagar à chamada “Ageas Portugal -Companhia de Seguros, S.A” a quantia de 92.222,96 Eur., acrescida de juros de mora, à taxa supletiva legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento, bem ainda no pagamento das quantias que a chamada venha ainda a pagar ao autor.
O Autor interpôs recurso desta decisão para o Tribunal da Relação.
O mesmo fez a Ré, subordinadamente.
Foi proferido acórdão pelo Tribunal da Relação que julgou: A - parcialmente procedente a apelação da recorrida Seguradora, e consequentemente revogar parcialmente a decisão recorrida, condenando a Ré a pagar ao Autor as seguintes quantias: a) € 20.814,53 a título de indemnização pela perda de salários (no que apenas se retifica a sentença que havia condenado no pagamento da quantia de € 20 830,22), b) € 300.000,00 a título de indemnização pela perda de rendimentos e ganhos futuros (revogando a sentença na parte em que condenou no pagamento da quantia de € 340 000,00), B) parcialmente procedente a apelação do recorrente autor, e consequentemente revogar parcialmente a decisão recorrida, condenando a Ré a pagar ao Autor: a) € 237.000,00 a título de indemnização pela contratação de terceira pessoa (revogando a sentença na parte em que condenou no pagamento da quantia de € 151 200,00), b) a quantia que se vier a liquidar no incidente de liquidação de sentença a respeito do rendimento mensal que o autor retirava com os biscates ao fim de semana com trabalhos de mecânica e eletricidade na casa dos pais e a respeito do rendimento anual que o autor retirava com a compra e venda de 3 carros por ano até ao limite do pedido de € 46.776, 65 e reportado ao período do acidente até ao fim do mês de novembro de 2018.
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Tudo sem prejuízo da subtração das quantias já recebidas e/ou a receber, no processo de acidente de trabalho, designadamente a título de pensão anual e vitalícia e/ou salários perdidos.
A Ré interpôs recurso de revista desta decisão, tendo concluído as suas alegações do seguinte modo: 1. Não pode a Recorrente conformar-se com o douto acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação do Porto relativamente ao decidido quanto ao dano patrimonial, na vertente do dano patrimonial futuro e perdas salariais quanto ao período que medeia entre a data do acidente (21 de dezembro de 2015) e a data de 30 de novembro de 2018, quanto à necessidade de auxílio de terceira pessoa e ainda quanto ao alegado rendimento que o Recorrido retirava dos biscates e compras e vendas de veículos automóveis.
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Com efeito, no que concerne ao dano patrimonial do Recorrido, sempre se dirá que do decidido resulta uma duplicação de indemnizações para o mesmo dano, uma vez que o A. encontra- se a ser indemnizado simultaneamente pela perda da capacidade de ganho absoluta desde a data do acidente e ainda pela sua perda salarial desde tal data até à data de consolidação médico-legal das lesões para si advindas do acidente de viação.
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O acórdão em crise, nessa medida, viola a lei substantiva, concretamente o disposto no artigo 562.º, 563.º, 564.º e 566.º do Código Civil, uma vez que, sendo as suas decisões incompatíveis entre si, geram um enriquecimento ilegítimo no património do Recorrido, através da condenação da Recorrente a pagar em duplicado um mesmo dano patrimonial resultante da perda de capacidade de ganho.
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Por outro lado, considerando um rendimento anual de Eur. 7.070,00 e o período de 815 dias de incapacidade temporária, temos que a quantia perdida pelo A. a título de salários no período de incapacidades parciais ascende a Eur. 15.786,44, montante ao qual deverá ser deduzido a quantia de 11.486,93€, já pago por via do acidente de trabalho, simultaneamente ocorrido 5. Considerando ainda um rendimento anual apurado de €7.070,00, a percentagem de incapacidade de que ficou a padecer de 51,35029, a idade de 32 anos à data da alta e tomando como guia os sistemas de orientação maioritariamente seguidos na jurisprudência dominante e que balizam os montantes indemnizatórios dos danos corporais decorrentes de acidentes de viação, designadamente o período de vida ativa e ainda a dedução pelo recebimento instantâneo de uma quantia que apenas iria ser auferida ao longo de uma vida de trabalho, de forma a evitar uma situação de enriquecimento sem causa, temos que a indemnização a arbitrar a título de dano patrimonial futuro será quantia não superior a Eur. 140.000,00.
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Não pode a Recorrente conformar-se, do mesmo modo, com o decidido no que diz respeito à indemnização fixada a título de auxílio de terceira pessoa, porquanto a prova produzida não suporta tal conclusão.
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Na verdade a prova produzida limitou-se á prova pericial (com indeferimento de realização de segunda pericial) e prova testemunhal prestada por pessoas que não residem com o A., desconhecendo como tal o seu quotidiano, não lhe prestando auxílio diário e sem qualquer conhecimentos médico-legais.
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Assim, perante os concretos meios de prova disponíveis nos autos, o Venerando Tribunal da Relação, ao invés de simplesmente sufragar o entendimento da primeira instância com base em “regras da experiência comum” quanto à perda de utilidade de um membro (sem identificar que concretas regras serão essas), podia/devia ter ordenado novos meios de prova, ordenando, no mínimo a produção de segundo relatório médico legal, com vista a aferir da autonomia diária do Recorrido e da necessidade de auxílio de terceira pessoa, por forma a sustentar tal conclusão e fixação da tal indemnização.
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Subsidiariamente, atendendo ao princípio da imediação e à prova pericial produzida nos autos, bem como a ausência de qualquer dano patrimonial efetivo comprovado nos autos, sempre se dirá não há fundamento probatório ou fáctico que permita concluir nos termos feitos pelo Tribunal a quo para tomar os 29 anos de idade como período de referência para tal cômputo indemnizatório, devendo, pelo supra exposto, ser o acórdão recorrido alterado nesta parte, conformando-se a idade referência de 50 anos, como decidido em 1.ª Instância.
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A decisão do Tribunal da Relação, nesta senda, violou o artigo 662.º, n.º 2, alínea b) do Código de Processo Civil quanto ao julgamento do facto 49 e 53, omitindo ainda o dever de ordenar a produção de novos meios probatórios, o que configura uma violação de lei de processo, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 674.º do Código de Processo Civil.
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Por fim, no que concerne ao alegado rendimento que o Recorrido retirava dos biscates e compras e vendas de veículos automóveis, sempre se dirá que não é legalmente possível relegar para execução de sentença a determinação e a prova dos próprios danos, uma vez que não foi apurado que o Recorrido retirava das mesmas lucro e/ou um rendimento positivo por tal atividade.
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Ao decidir como decidiu o Tribunal a quo violou lei de processo, concretamente o artigo 342.º do Código Civil e 414.º do Código de Processo Civil o que se invoca nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 674.º, n.º 1, al. b) do Código de Processo Civil.
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