Acórdão nº 3364/18.6T8CBR-A.C2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA DA GRAÇA TRIGO
Data da Resolução15 de Dezembro de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1. AA veio deduzir oposição à execução contra o Banco Comercial Português, pedindo a extinção da acção executiva e o levantamento das penhoras efectuadas, ou subsidiariamente, a extinção da acção executiva quanto à quantia excedente a €.45.077,19.

O embargado contestou.

A acção executiva tem por base dois contratos de mútuo com hipoteca.

Por sentença de 4 de Novembro de 2021 foi proferida a seguinte decisão: «1) Julgar totalmente improcedentes os Embargos de Executado.

2) Determinar o prosseguimento da Acção Executiva pela eventual e previsível diferença entre o pagamento parcial a obter pela Exequente/Embargada no Processo de Insolvência e o que ficar por pagar, após os pagamentos, à Exequente/Embargada no Processo de Insolvência.

3) Determinar que a Exequente/Embargada apenas poderá obter pagamento na presente Acção Executiva após a determinação do remanescente em dívida no Processo de Insolvência e sobre esse montante serão cobrados juros moratórios, à taxa anual de 3,527%, desde a data do pagamento no Processo de Insolvência até efectivo e integral pagamento.

4) Custas pelo Executado/Embargante, sem prejuízo do apoio judiciário de que possa beneficiar.».

Inconformado, o embargante interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra.

Por acórdão de 8 de Março de 2022, foi proferida a seguinte decisão: «Julga-se parcialmente procedente, confirma-se a decisão recorrida de improcedência dos embargos e de prosseguimento da execução e revoga-se o restante (a partir da expressão: “pela eventual e previsível diferença” ...).».

  1. Novamente inconformado, veio o embargante interpor recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, por via normal, e, subsidiariamente, por via excepcional, formulando as seguintes conclusões: «A) O acórdão recorrido incorreu em violação do art. 5.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, do ónus de alegação e do princípio do dispositivo, quanto às matérias integradoras de autoridade do caso julgado e quanto à cláusula 9, alínea b), do documento complementar das escrituras de mútuo com hipoteca e quanto a esta cláusula também incorreu em violação das normas legais dos arts. 635.º, n.º 4, e 636.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, que balizam o objecto de recurso às conclusões das alegações e à ampliação requerida (que não foi) do objecto do recurso em resposta ao mesmo, e mesmo, por conseguinte, cometimento da nulidade prevista nos arts. 615.º, n.º 1, d), e 666.º, n.º 1, do Código de Processo Civil. Como tal, B) Em cumprimento de tais normas e remédio do acórdão recorrido, devem extirpar-se tais matérias considerações da autoridade do caso julgado e da cláusula 9, alínea b), do documento complementar das escrituras de mútuo com hipoteca.

    Aliás, C) Não se vê como a verificação e graduação de créditos na insolvência da ex-cônjuge do executado e a acção de separação de bens dessa massa insolvente podem ter por efeito o vencimento e exigibilidade da dívida do executado nos presentes autos. É que D) Quer um quer outro dos referidos meios processuais são incidentes do processo de insolvência, execução universal da ex-cônjuge do executado, mas quanto a este restrita aos ónus hipotecários titulados pela insolvente ex-cônjuge e pelo executado, não havendo, para além dos ónus hipotecários, efeito externo e material de caso julgado de acertamento de dívida e seu vencimento e exigibilidade para fora da insolvência, para os presentes autos de execução ou para quaisquer outros em que o património geral (e não apenas as garantias especiais hipotecárias) do executado possa responder. Ademais, E) Não existe identidade de sujeitos: o executado não é insolvente; nem de objectos processuais: na insolvência é o património do insolvente incluindo ónus hipotecários do património conjugal não partilhado a ser liquidado; na execução é o património geral do executado não insolvente que ainda deva responder pelo pagamento de dívida. E F) O aqui executado jamais foi citado para o processo de insolvência, para a ela se opor ou dela recorrer, nem para os termos da reclamação, verificação e graduação de créditos, designadamente da sentença de graduação de créditos. Pelo que G) Não se verifica qualquer caso julgado nos termos dos arts. 580.º, 581.º e 619.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, em que a sentença recorrida terá (já que é falha de fundamentação) incorrido. Aliás, H) Quanto à acção de separação de bens o seu efeito é apenas o de manter ou separar bens da massa insolvente sujeita a liquidação, e não outro. E I) Quanto à verificação e graduação de créditos na insolvência, o seu efeito é o de definição de dívida e seu vencimento e exigibilidade restrito ao próprio processo de insolvência e aos bens da massa insolvente a liquidar para pagamento das dívidas verificadas e graduadas na insolvência incluindo os ónus hipotecários não partilhados do casal dissolvido por divórcio em que um dos ex-cônjuges é insolvente, e não outro, como definição de dívida, noutros processos como o presente, de quem não é o insolvente, que responde com o seu património geral. Acresce que J) Assim terá que se entender necessariamente desde logo por força e sob pena de violação do princípio da reserva da função jurisdicional previsto nos arts. 20.º, n.ºs 1, 4 e 5 e 202.º, n.ºs 1 e 2 da Constituição, em que a sentença recorrida incorreu, já que no processo de insolvência a verificação e graduação de créditos foi mera homologação da lista de credores reconhecidos elaborada administrativamente pelo administrador de insolvência. Ademais, K) Tal questão de violação do princípio da reserva da função jurisdicional previsto nos arts. 20.º, n.ºs 1, 4 e 5 e 202.º, n.ºs 1 e 2 da Constituição, foi objecto do recurso de apelação, nas suas alegações e conclusões, mas o Meritíssimo Tribunal a quo e o acórdão recorrido sobre tal nada apreciaram ou decidiram, incorrendo assim na nulidade prevista nos arts. 615.º, n.º 1, d), e 666.º, do Código de Processo Civil. Aliás, L) O entendimento do acórdão recorrido, à luz das normas legais dos arts. 580.º, 581.º e 619.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, de que o sentido destas e da autoridade de caso julgado é o de a decisão verificação e graduação de créditos que foi mera homologação da lista de credores reconhecidos elaborada administrativamente pelo administrador de insolvência («termos em que foram reconhecidas, verificadas e graduadas no processo de insolvência») obrigar o aqui executado e recorrente impondo-se-lhe com autoridade de caso julgado, viola flagrantemente o princípio da reserva da função jurisdicional previsto nos arts. 20.º, n.ºs 1, 4 e 5 e 202.º, n.ºs 1 e 2 da Constituição. Pelo que M) Tal inconstitucionalidade deve ser declarada.

    N) Mesmo havendo caso julgado impositivo de vencimento e exigibilidade imediata dos créditos, este, porque visando a liquidação dos bens apreendidos na insolvência da ex-cônjuge insolvente, por serem bens comuns do património conjugal, e que aí estão a ser liquidados, restringe-se apenas a esses bens comuns do património conjugal apreendidos na insolvência da ex-cônjuge insolvente. Como tal, O) Decidindo diversamente o acórdão recorrido incorreu em violação das normas legais estatuídas nos arts. 580.º, 581.º e 619.º, n.º 1, do Código de Processo Civil. Por conseguinte, P) Contrariamente ao decidido pelo acórdão recorrido, impõe-se a apreciação da (in)exigibilidade das dívidas por incumprimento pela exequente de procedimento extrajudicial de regularização de situações de incumprimento previsto nos arts. 12.º a 21.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, e sobretudo o seu art. 18.º, n.º 1, b), bem como o art. 27.º do Decreto-Lei n.º 74-A/2017, normas e regimes jurídicos de natureza imperativa que as estipulações das partes não podem afastar sob pena de nulidade nos termos do art. 294.º do Código Civil. Pelo que, Q) Tendo aqui inteira pertinência o vertido nas páginas 13 e 14 da sentença de primeira instância, que se dá por integralmente reproduzido, e que deve ser repristinado, impunha-se como se impõe agora a procedência dos embargos de executado e a extinção da execução, contrariamente ao que, em violação dos arts. 12.º a 21.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, e sobretudo o seu art. 18.º, n.º 1, b), bem como o art. 27.º do Decreto-Lei n.º 74-A/2017, decidiu o acórdão recorrido.

    R) Os fundamentos do acórdão recorrido de (i) autoridade de caso julgado do vencimento e exigibilidade imediata das dívidas nos termos em que foram reconhecidas, verificadas e graduadas no processo de insolvência e do (ii) estipulado na cláusula 9, alínea b), do documento complementar das escrituras de mútuo com hipoteca dadas à execução: “A presente hipoteca poderá ser executada: b) se o imóvel ora hipotecado vier a ser alienado, onerado, arrendado, total ou parcialmente, objecto de arresto, execução ou qualquer outro procedimento cautelar ou acção judicial, casos em que se consideram igualmente vencidas e exigíveis as obrigações que assegura”, não constavam da sentença de 1.ª instância, e, como tal, não se verifica a hipótese do art. 671.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, sendo normalmente admissível o presente recurso de revista.» [excluem-se as conclusões relativas à admissibilidade por via excepcional] Termina pedindo a revogação do acórdão recorrido com as necessárias consequências.

  2. O Recorrido contra-alegou, pugnando pela inadmissibilidade do recurso e, subsidiariamente, pela improcedência do mesmo com fundamento na verificação do efeito de autoridade do caso julgado.

  3. Em 18 de Julho de 2022 foi proferida decisão da relatora do seguinte teor: «2. Nos termos do disposto no art. 671.º, n.º 3, do CPC, não é admissível revista por via normal do acórdão que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível.

    No presente caso, o acórdão recorrido confirmou a decisão de 1.ª instância, não existindo qualquer voto de...

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