Acórdão nº 010/12.5BEPDL 0381/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelANABELA RUSSO
Data da Resolução07 de Dezembro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACÓRDÃO 1. RELATÓRIO 1.1.

A……. intentou a presente Oposição, dirigida ao processo de execução fiscal n.º 2992201101096680, instaurado pelo Serviço de Finanças de Ponta Delgada com base em certidão de dívida emitida pela Região Autónoma dos Açores - Direcção Regional de Saúde, pedindo, a final, que a execução seja declarada extinta ou, caso assim não se entenda, que lhe seja reconhecido o “direito de exercer medicina a título de serviço público ou privado, por prazo conveniente à condução da sua vida privada, ordenando o mesmo, e consequentemente decrete ilegítimo, por violação do princípio da proporcionalidade, o pedido indemnizatório constante do pretenso título”.

1.2.

Tendo em vista a procedência dos pedidos formulados invocou a Oponente a nulidade do título executivo, nos termos dos artigos 162°, 163°; 165° do CPPT; a incompetência do órgão administrativo para a emissão do título executivo - certidão de dívida à RAA; a nulidade do acto administrativo por objecto legalmente impossível nos termos do artigo 133° n°2 al. c) do CPA; a nulidade do título executivo por inexistência de lei conferindo força jurídica executória ao tipo de documento em causa; falta de fundamentação nos termos dos artigos 286º n°3 da CRP, 123°, 124°, 125° do CPA, 203° e 204.° n.º 1 al. i) do CPPT; duplicação de colecta nos termos do artigo 204.° n.º 1 al. g) do CPPT; ilegalidade do acto de administração nos termos do artigo 204° al. i) CPPT, 37,° e 39.º CPPT; violação do princípio da audiência nos termos dos artigos 100° e seguinte do CPA; 267.º n°1 e 5 da CRP, 133 n°2 al. a) do CPA e inconstitucionalidade por violação do direito ao trabalho previsto no artigo 47.º da CRP e do Código de Trabalho e dos princípios da legalidade e da proporcionalidade.

1.3.

Por sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Tribunal foi julgada procedente a excepção de erro na forma de processo que o Ministério Público havia suscitado no seu parecer relativamente ao pedido de reconhecimento de direito e conhecido o mérito da Oposição, fora, julgados totalmente improcedentes os vícios invocados.

1.4.

Inconformada, a Oponente (doravante Recorrente) recorre para este Supremo Tribunal Administrativo, tendo concluindo as suas alegações com a formulação das seguintes conclusões: «1.

É posto aqui em crise a certidão de dívida à Região Autónoma dos Açores emitida a 16 de Novembro de 2011 pela Sra. Diretora Regional da Direção Regional de Saúde, referenciada em 16) dos factos provados.

  1. O artigo 155.º do CPA em vigor na data dos autos estipulava que competia ao órgão administrativo competente, a emissão de certidão com valor de título executivo e, 3.

    O artigo 2 n.º 4 alínea a) do novo CPC define que são órgãos da Administração pública, os órgãos do Estado e das Regiões autónomas que exercem funções administrativas.

  2. Ora quem, na área da saúde detém competências nesse sentido, é a Secretaria Regional da saúde nos termos do disposto nos artigos 3.º alínea g) e 14.º do DRR n.º 25/2008/A de 31 de Dezembro, sendo a Direcção Regional da Saúde, por sua vez, um órgão executivo da própria Secretaria Regional da Saúde.

  3. Aliás, nem do teor dos artigos 14.º e 15.º do DRR n.º 13/2010/A de 12 Julho que definem as competências da Direcção Regional da Saúde, é possível concluir o contrário.

  4. Assim, uma vez que não resulta da lei a competência da Direcção Regional da Saúde nem houve delegação de competência por parte da Secretaria Regional da Saúde, é forçoso concluir que a certidão carece de força executiva por não ter sido emitida pelo órgão competente.

  5. Pelo que o Tribunal a quo andou mal quando decidiu que “a única formalidade imposta é que a certidão de dívida seja assinada pelo funcionário ou agente que constata a existência de uma determinada dívida”, não tendo fundamentado concretamente a competência da Direcção Regional de Saúde.

    Sem prejuízo do que antecede, 8.

    A certidão aqui em crise foi emitida tendo por base uma lei que já não estava em vigor uma vez que tinha sido revogado pelo DLR n.º 17/2008/A de 18 de Junho e não fez qualquer referência a quaisquer disposições transitórias.

  6. O que leva à inexistência do imposto, pois a legitimidade da sua cobrança à data em que ocorreu a respectiva liquidação não ficou demonstrada aquando a instauração do correspondente processo de execução fiscal.

  7. Além de que, verifica-se uma desconformidade entre o título executivo e a base fáctico-documental cuja atestação nele se exprime, 11.

    Pois, o caso dos autos não se enquadra em nenhuma das situações previstas nas alíneas do ponto 11.º do dito regulamento conforme a certidão remete como também, 12.

    O previsto na alínea b) do n.º 7 do Regulamento não se enquadra numa das supra mencionadas situações.

    Além de que, 13.

    Estamos perante uma duplicação da colecta.

  8. Com efeito, estamos perante duas certidões com exactamente o mesmo teor, ou seja, com a menção de que a quantia aí referida corresponde ao dobro da totalidade dos valores recebidos a título de bolsa.

  9. Ora, para afastar qualquer duplicação da colecta, a certidão aqui em crise deveria mencionar que o valor constante da mesma corresponde ao remanescente da dívida em virtude de por lapso ter sido cobrado apenas o valor em singelo.

  10. O que não sucedeu.

  11. Por fim, a obrigação de reembolsar no dobro, o valor recebido a título de bolsa viola manifestamente o princípio da proporcionalidade, no contexto dos seus sub princípios da adequação, necessidade e, complementarmente, da razoabilidade; nos termos do n.º 2 do artigo 18.º da Constituição.

  12. Na verdade, a proporcionalidade terá ainda de se verificar entre as circunstâncias de facto que dão causa e as medidas tomadas.

  13. Ora, consta da matéria de facto dada como provada que a Opoente continua vinculada até hoje à Região Autónoma dos Açores, embora exerça a sua actividade no sector privado.

  14. Dessa forma, é excessivo e desproporcional no caso em apreço exigir o pagamento do dobro do valor recebido a título de bolsa.

  15. Isto porque o interesse da Região Autónoma dos Açores, visado pela portaria não ficou prejudicado, que é o exercício da medicina na Região neste caso por parte da Opoente.

    1.5.

    A Autoridade Tributária e Aduaneira produziu contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso, aí concluindo nos seguintes termos: «A recorrente vem repetir nas conclusões das suas alegações os pedidos, e a fundamentação, anteriormente efetuados perante o Tribunal a quo em sede de oposição judicial, tendo este julgado sem mácula todas as questões que lhe foram colocadas, não podendo ser-lhe feito qualquer reparo, pelo que se acolhe a Douta sentença como conclusões das contra-alegações, uma vez que não aportaram as presentes alegações de recurso qualquer novidade relativamente as questões inicialmente apresentadas.”.

    1.6. O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.

    1.7.

    Cumpre decidir.

  16. OBJECTO DO RECURSO 2.1 Como é sabido, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva oficiosamente conhecer, o âmbito de intervenção do tribunal de recurso é determinado pelo teor das conclusões com que a Recorrente finaliza as suas alegações [artigo 635.º do Código de Processo Civil (CPC)].

    Essa delimitação do objecto do recurso jurisdicional, numa vertente negativa, permite concluir se o recurso abrange tudo o que na sentença foi desfavorável ao Recorrente ou se este, expressa ou tacitamente, se conformou com parte da decisão de mérito proferida quanto a questões por si suscitadas, desta forma impedindo que essas questões voltem a ser reapreciadas pelo Tribunal de recurso (artigos 635.º, n.º 3 e 4 do CPC). Numa vertente positiva, a delimitação do objecto do recurso, especialmente nas situações de recurso directo para o Supremo Tribunal Administrativo, como é o caso, constitui ainda o suporte necessário à fixação da sua própria competência, nos termos em que esta surge definida nos artigos 26.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) e 280.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

    2.2.

    Nas suas alegações invoca a Recorrente, tal como o havia feito anteriormente na petição inicial, a ilegalidade da dívida por os preceitos legais invocados no ofício que lhe foi dirigido não serem susceptíveis de fundamentar juridicamente a dívida que lhe é imputada.

    Como ficou decidido na sentença recorrida, a Oposição à Execução Fiscal não é o meio próprio para atacar eventuais ilegalidades concretas da dívida. Discordando a Recorrente do fundamento do acto que lhe foi oportunamente enviado (incluindo para se pronunciar em audição prévia) devia ter procedido, querendo, à sua Impugnação. Não o tendo feito, não pode, com este fundamento e em sede de execução fiscal, questionar a legalidade ou ilegalidade concreta do referido acto.

    Tudo, pois, para que se consigne, desde já que tal questão, que em recurso surge suportada em diferente terminologia ou redacção, como se denota da leitura das conclusões 10. a 12., tal questão não integrará o objecto deste.

    2.3.

    Assim, no caso concreto, tendo por referência o que ficou dito, são quatro as questões a decidir, que enunciamos da seguinte forma: 1) Carece a certidão de força executiva por não ter sido emitida pelo órgão administrativo competente, atento o teor, conjugadamente, dos artigos 155.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA), na redacção então em vigor, e dos artigos 2.º, n.º 4, al. c) do CPC e 3.º al. g) e 14.º do DDR n.º 25/2008/A, de 7 de Julho? 2) Fundando-se a certidão de dívida em Lei que já não estava em vigor na data da sua emissão, por ter sido entretanto revogada pelo DLR n.º 17/2008/A de 18 de Junho, devia o Tribunal a quo ter concluído que estamos perante uma situação de “inexistência de imposto”? 3) O Tribunal a quo errou ao não julgar verificada existência de uma situação de duplicação de colecta, uma vez que o imposto cujo pagamento está a ser exigido à Oponente é o mesmo nas duas certidões de dívida emitidas pela...

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