Acórdão nº 2583/20.0T8VFR.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelFERANDO BAPTISTA
Data da Resolução30 de Novembro de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, Segunda Secção Cível I – RELATÓRIO Ângelo Sá & Silva, Ldª instaurou ação contra Positive Signs, L.da, pedindo a sua condenação a pagar-lhe € 52.533,00 e juros de mora vincendos.

Fundamentou o seu pedido alegando, em resumo, ter sido contactada pelo gerente da empresa “S... L.da”, para prestar serviços de carpintaria, com fornecimento e colocação de cozinhas, em regime de subempreitada, num empreendimento propriedade da Ré. Esse acordo foi posteriormente corroborado em reunião dos legais representantes das 3 entidades (Autora, Ré e S...), tendo ficado combinado que seria a Ré a pagar diretamente à Autora todos os serviços efetuados.

Tendo a Autora prestado todos os serviços acordados, a Ré recusou o pagamento.

Em contestação, a Ré impugnou, específica e motivadamente, a factualidade alegada.

Foi proferido despacho saneador, fixando o tema do litígio e os temas de prova, sem reclamações.

Realizada audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente.

Inconformada, apelou a Autora Ângelo Sá & Silva, Ldª, vindo a Relação do porto, em acórdão, a revogar a sentença recorrida, “condenando a Ré a pagar à Autora, a quantia de € 52.533,00 (cinquenta e dois mil, quinhentos e trinta e três euros), acrescida de juros de mora vincendos, contados desde a data da citação até efetivo e integral pagamento”.

** Agora inconformada a Ré Positive Signs, L.da, vem interpor recurso de revista para este Supremo Tribunal de Justiça, apresentando alegações que remata com as seguintes CONCLUSÕES[1] 1. O acórdão ora em crise faz uma errada interpretação da prova produzida, valorando, em concreto, as declarações de parte prestadas pelo legal representada Ré, em detrimento de toda a prova produzida, testemunhal e documental, durante as audiências de discussão e julgamento, recorrendo amiúde das vezes a meras presunções, sem quaisquer factos, decorrentes da prova, que as sustentem.

  1. Violou, ainda, o acórdão o princípio da inversão do ónus da prova e o princípio da livre apreciação da prova.

  2. Entendeu o tribunal a quo, vertido no acórdão, que os factos provados sob o nº10 e 11, forçosamente teriam de ser dado como não provados, decidindo alterar, dessa forma os fatos dados como provados.

  3. Acontece, que entende a recorrente que tal interpretação denuncia um erro claro na apreciação da prova documental, fazendo, uma inversão do ónus da prova.

  4. Entende a ora recorrente, que o contrato assinado e não impugnado, é prova bastante dos factos alegados.

  5. Dessa forma, e ignorando o conteúdo do contrato, violou, o acórdão recorrido, o princípio relativamente à apreciação da prova documental.

  6. Insinua, o acórdão recorrido que a diferença de 50 mil euros parece excessiva, contudo, tal insinuação só poderá existir se o acórdão recorrido não tiver, como certamente fez, atentado ao contrato junto, no que concerne ao prazo de entrega dos bens e à penalização dos atrasos, pois por simples cálculo aritmético tinha obtido tal montante.

    8. Assim, o acórdão proferido, em crise com a prova documental e testemunhal existente, violou, expressamente, o disposto nos artigos 349º do C. Civil e 607º, nº4 do Código de Processo Civil.

  7. Entendeu, o acórdão recorrido, alterar os factos dados como não provados na primeira instância, passando a dar os mesmos como provados, nomeadamente os elencados nas alíneas a), b) e c).

  8. Sendo que para justificar tal alteração, recorreu o acórdão à análise da prova testemunhal conjugada com as declarações prestadas pelo legal representante da A., fazendo transparecer uma descrença total face à prova produzida, subjacente ao tom de voz da testemunha, o que, salvo o devido respeito, nos merece a completa censura.

  9. Na verdade pretendeu o tribunal a quo, com a análise da prova, retirar toda e qualquer credibilidade às testemunhas, e atribuir toda credibilidade às declarações prestadas pelo legal representante da R., 12. Dessa forma, violando claramente o princípio da livre apreciação de prova, bem como o princípio da prova testemunhal e da prova por declarações de parte.

  10. Por outro lado, entendeu o acórdão recorrido invalidar depoimentos, devido ao tom de voz.

  11. Foi, pois, a suposta mudança de tom de voz que permite ao acórdão recorrido invalidar e equacionar a veracidade do testemunho daquela testemunha, sem contudo perguntar quantas vezes foi a testemunha questionado sobre esse facto.

  12. Assim, nenhuma censura merece o depoimento da testemunha AA, o qual, lembramos, vai no sentido proferido pelas restantes testemunhas.

  13. Recorre ainda, o tribunal a quo, à presunção de que teria a R. de contratar nova empresa, para terminar a obra, pelo que tudo levaria a crer que haviam contratado a A., facto que só nos parece verossímil se ignorarmos toda a prova produzida.

  14. Por outro lado, decide o tribunal a quo atribuir uma maior credibilidade ao legal representante da A., em detrimento de toda a prova testemunhal produzida, o que viola o princípio da livre apreciação da prova, e os princípios subjacentes às declarações de parte.

  15. Estas declarações de parte não são suficientes para estabelecer, por si só, qualquer juízo de aceitabilidade final, podendo apenas coadjuvar a prova de um facto desde que em conjugação com outros elementos de prova.

  16. O que se assiste no acórdão recorrido, é descredibilizar a prova testemunhal, só para poder valorar a prova prestada pelo represente legal da A, e nem com o recurso às regras da experiência, seria possível obter conclusão diferente da douta sentença em primeira instância.

  17. Alegou, ainda, o acórdão recorrido que, no âmbito destes contratos de construção civil, acontece com frequência, recorrendo mais uma vez, desta forma, a um conjunto de presunções, sem qualquer prova, ou mesmo justificação para tal, sendo que se tivesse sido atentada à prova produzida, facilmente concluiria de outra forma.

  18. Recorre, mais uma vez a presunções obtidas pela data da fatura, pelo suposto abandono da obra, da ocorrência da reunião em causa, e ainda os presentes em tal reunião, para justificar que tudo se passou de forma diversa da constante da sentença em primeira instância, mais uma vez sem atentar à prova produzida, que invalidaria tal presunção! 22. Mais, é afirmado que a obra havia sido abandonada pelo A., quando tal facto é contrariado, em absoluto pela prova produzida, uma vez que a A., no dia da dita reunião, se encontrava em obra a retificar medidas, na obra, logo como poderia ter abandonado a mesma? 23. Assim, entende a recorrente que o tribunal a quo violou o princípio da livre apreciação de prova, princípio do ónus da prova, e o disposto no art. 466 nº3 do CPC, uma vez que se limitou a valorar as declarações de parte, sem que exista, em toda a prova produzida, qualquer indício que as sustentem, com as consequências previstas no disposto no art. 674º nº3 do CPC.

  19. Por outro lado, entendeu, o acórdão recorrido que a situação dos presentes autos, se subsume no instituto da fiança, sem que exista, nos autos, qualquer facto alegado nesse sentido.

  20. A ser assim, e atendendo ao princípio consagrado no disposto do art. 628º nº1 do C.C., tinha a fiança que ser reduzida a escrito, o que não sucedeu, pelo que seria a mesma nula.

  21. Por outro lado, e acreditando em tal qualificação jurídica, não se demonstra de que forma a mesma foi exercida, o que, só com o recurso a mais presunções, conseguiríamos obter tal explanação.

  22. E por fim, o óbvio, se existiu uma relação de fiança, como se explica nunca ter sido a mesma alegada em sede própria, pois reportando à PI, e mesmo á prova produzida, não resulta nada sobre tal instituto.

  23. Ao fazer a subsunção dos factos ao direito, aqui vertida, a verdade é que o tribunal a quo, violou, claramente, os princípios referentes ao instituto da fiança, (art. 627º, 637º, 638º, 640º, 641º e 642º do CC), pelo que forçosamente terá, o douto acórdão recorrido, que ser considerado nulo, o que se requer atento o exposto no art. 674 nº1 a) e nº2 do CPC! 29. Nenhuma censura merecia a sentença da primeira instância, a qual de forma linear teve em consideração toda a prova produzida, e soube, de forma critica e livre analisar a mesma.

    NESTES TERMOS, E NOS DEMAIS DE DIREITO, DEVE SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, REVOGANDO-SE O DOUTO ACÓRDÃO RECORRIDO, SÓ ASSIM SE FAZENDO A TÃO NECESSÁRIA JUSTIÇA! * Contra-alegou a Autora, concluindo pela improcedência do recurso, com a consequente confirmação do acórdão recorrido.

    Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

    ** II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Nada obsta à apreciação do mérito da revista.

    Com efeito, a situação tributária mostra-se regularizada, o requerimento de interposição do recurso mostra-se tempestivo (artigos 638º e 139º do CPC) e foi apresentado por quem tem legitimidade para o efeito (art.º 631º do CPC) e se encontra devidamente patrocinado (art.º 40º do CPC). Para além de que tal requerimento está devidamente instruído com alegação e conclusões (art.º 639º do CPC).

    ** Considerando que o objecto do recurso (o “thema decidendum”) é estabelecido pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, atento o estatuído nas disposições conjugadas dos artigos 663º nº 2, 608º nº 2, 635º nº 4 e 639º nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil (CPC), as questões a decidir consistem em saber: § IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO Se mal andou o tribunal recorrido em: ü concentrar num único facto provado (nº 10[2]) a matéria que na sentença constava dos factos provados 10 e 11[3]; ü dar como provados os factos que na sentença figuravam como não provados sob as alíneas a), b) e c)[4].

    § DO DIREITO Da subsunção jurídica dos factos provados: ao instituto da fiança, como considerou o acórdão recorrido? ** III – FUNDAMENTAÇÃO III. 1.

    FACTOS PROVADOS É a seguinte a matéria de facto provada (após impugnação em recurso na Relação): 1.

    A Autora é uma sociedade comercial que se dedica, nomeadamente, à...

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