Acórdão nº 331/18.3T8PRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelAFONSO CABRAL DE ANDRADE
Data da Resolução24 de Novembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I- Relatório J. M.

, titular do número de identificação fiscal ……… e P. C.

, titular do número contribuinte nº ………, casados no regime da comunhão de adquiridos e residentes no Lugar ...

, n.º …, da freguesia de ...

, ...

, actualmente emigrados na Bélgica, onde residem em Rue … Bruxelas Intentaram a presente acção declarativa, que segue a forma de processo comum, contra J. C.

e mulher M. C.

, casados no regime da comunhão de adquiridos, residentes no Lugar ...

, da freguesia de ...

, em ..., Pedindo que se declare os autores legítimos proprietários do prédio urbano identificado no artigo 1.º da petição inicial e condenar os Réus a reconhecer essa propriedade, nomeadamente de uma parcela de terreno do logradouro do prédio e que se encontra ocupada pelos réus, e consequentemente condenar os Réus a restituir tal parcela livre e devoluta.

Para tanto, alegam que por escritura pública de compra e venda adquiriam o prédio urbano descrito no artigo 1.º da petição inicial. Que tal prédio se encontra registado na Conservatória do Registo Predial em nome dos autores e é composto pela casa e por um logradouro com área de 1.573m2, situado do lado poente da casa. Para além disso, alegam que por si e antepossuidores, têm vindo a exercer sobre este prédio uma posse pública, pacífica, continua e de boa-fé por mais de 20 anos consecutivos. Acrescentam que uma parcela do terreno se encontra ocupada pelos réus desde finais de 2016/2017, sendo que estes se recusam a entregar tal parcela, a qual faz parte integrante do logradouro do seu prédio.

Os réus foram regularmente citados, apresentaram contestação, alegando que anteriormente à construção do prédio dos autores, em 2016, aquela área de terreno era dividida em duas parcelas, sendo que uma delas (e de que faz parte a parcela aqui reivindicada pelos Autores), sempre foi utilizada pelos réus, há mais de 20/30 anos, e deduziram para o efeito pedido reconvencional no qual pediram o reconhecimento desse direito de propriedade sobre a parcela reivindicada pelos autores.

Os autores apresentaram réplica na qual e no essencial invocaram que os réus utilizavam parte do prédio que veio a ser adquirido pelos autores, por mera tolerância dos seus donos.

Realizou-se a audiência final com observância do formalismo legal.

Foi então proferida sentença, que julgou a acção parcialmente procedente e a reconvenção totalmente procedente, e em consequência: a) declarou os autores como legítimos proprietários do prédio urbano sito no Lugar ...

, da União das Freguesias de ... e ..., do concelho de ...

, descrito na Conservatória de Registo Predial, sob o n.º ...

/20160511 e inscrito na matriz sob o artº ...

com exclusão da parcela de terreno referida nos factos provados 7, 8 e 10.

  1. condenou os réus a reconhecer os autores como legítimos proprietários do prédio urbano sito no Lugar ...

    , da União das Freguesias de ... e ..., do concelho de ...

    , descrito na Conservatória de Registo Predial, sob o n.º ...

    /20160511 e inscrito na matriz sob o artº ...

    com exclusão da parcela de terreno referida nos factos provados 7, 8 e 10, absolvendo os réus do demais peticionado; c) condenou os autores reconvindos a reconhecer que a parcela de terreno referida em 7, 8 e 10 dos factos provados - que se situa no limite poente do prédio dos autores, confrontando com o muro de suporte do caminho público e com a área aproximada de 37,50 m2, com cerca de 2,50m de largura e cerca de 15 metros de cumprimento - é propriedade dos réus e que faz parte do prédio descrito no facto 5.

    Inconformados com esta decisão, os autores dela interpuseram recurso, que foi recebido como de apelação, a subir imediatamente nos próprios autos, com efeito meramente devolutivo (artigos 629º,1, 631º,1, 637º, 638º,1, 644º,1,a), 645º,1,a) e 647º,1 do Código de Processo Civil).

    Terminam a respectiva motivação com as seguintes conclusões: 1ª) O presente recurso é interposto da douta sentença que julgou a acção parcialmente procedente e a reconvenção procedente.

    1. ) Os apelados consideram que ocorreu incorrecto julgamento da matéria de facto, quanto à factualidade provada e não provada, que redundou na incorrecta interpretação e aplicação do direito, assim recorrendo da decisão de facto e de direito.

    2. ) Ocorreu erro de julgamento, por errada depreciação de prova documental, parte dela com valor probatório pleno, confirmada por declarações confessatórias dos apelados e por prova testemunhal produzida em audiência, cujo valor e análise impõem o aditamento de dois novos factos provados 16. e 17., o esclarecimento e/ou a concretização do início do período temporal da ocorrência dos factos provados 11., 12., 13. e 14., o aditamento de um novo facto não provado f. e a eliminação, ou a sua consideração como não escrita, de matéria jurídica – conclusiva contida no facto não provado c.

    3. ) A alteração da decisão de facto no sentido pugnado pelos apelantes importará necessariamente a alteração da decisão de direito, no sentido da procedência total da acção e da improcedência da reconvenção, porquanto os apelantes gozam da presunção derivada da inscrição registal do seu direito de propriedade sobre o prédio urbano do facto provado 1., que abrange a parcela de terreno reivindicada, e os apelados não ilidiram tal presunção ou, pelo menos, os apelantes ilidiram a presunção de posse que eventualmente beneficiasse os apelados.

    4. ) As questões submetidas à apreciação deste Venerando Tribunal, que fixam e delimitam o objecto do presente recurso, estão indissociavelmente interligadas, procedendo-se à sua argumentação e apreciação conjunta.

    5. ) A presente acção é de reivindicação, discutindo-se nela a titularidade de uma determinada parcela de terreno, cuja procedência depende da verificação de três requisitos: que o autor seja titular do direito real invocado; que o réu tenha a coisa em seu poder; que o réu não prove ser titular de um direito que lhe permite ter a coisa.

    6. ) A prova pelo autor da aquisição originária da coisa reivindicada pode ser difícil ou impossível, pelo que o ordenamento jurídico consente o recurso a determinadas presunções legais da existência e da titularidade do direito real, designadamente a presunção da sua existência a favor do titular inscrito no registo predial – artº 7º C.R.P.

    7. ) Se o autor beneficiar desta presunção registal, a causa de pedir na reivindicação satisfaz-se com a invocação do facto que serve de base àquela presunção legal, que é o registo do título aquisitivo.

    8. ) Quem tem a seu favor um registo predial determinado, escusa de provar quer que o direito existe, quer que é titular deste direito, quer que o prédio tem a configuração dada pelo registo e, por isso, quem entenda que esta configuração não é exacta, terá que provar a respectiva inexactidão.

    9. ) O núcleo essencial da descrição do prédio, como seu marco diferenciador ou de identificação, está protegido pela aludida presunção, sob pena de se presumir a propriedade de coisa nenhuma.

    10. ) In casu, os apelantes arrogam-se legítimos proprietários da parcela de terreno reivindicada, invocando a compra do prédio urbano com logradouro de que ele faz parte, isto é, uma forma derivada da aquisição desse direito.

    11. ) Nos factos provados 1., 2., 3.e 4. ficou assente que tal prédio urbano está registado definitivamente a favor dos apelantes e que, pelo seu lado poente, que é onde se localiza a parcela reivindicada, ele confronta com caminho público, o que tudo resulta demonstrado pelos docs nºs 1 e 2 da P.I., respectiva caderneta e certidão predial, e nºs 1 e 2 do requerimento com a refª 41524680, de 05.03.2022, relativos à respectiva informação cadastral.

    12. ) Beneficiando os apelantes da presunção registal de que são titulares do direito de propriedade sobre aquele prédio, que no registo vem descrito com aquela confrontação imutável pelo lado poente, a presunção abrange esta confrontação e, por isso, a parcela de terreno reivindicada.

    13. ) Não tendo os apelados ilidido tal presunção, demonstrando a inexactidão do registo, é manifesta a procedência da reivindicação.

    14. ) Mesmo assim se não entendendo, porque os apelados, efectivamente, demonstraram factos consubstanciadores de corpus possessório que têm exercido sobre a parcela de terreno em litígio, o que lhes poderia conferir a presunção do correspondente animus, os apelantes consideram que ilidiram vigorosa e indisputadamente tal presunção, como aqui demonstram.

    15. ) Relativamente à impugnação da decisão sobre a matéria de facto, o documento designado por “Acordo”, que constitui o doc. nº 5 da Contestação junto pelos apelados com o requerimento com a refª 318097717, de 11.03.2019, as declarações confessatórias dos apelados ínsitas nos arts 33º, 34º, 37º, 38º e 54º da Contestação e os excertos de depoimentos testemunhais que se assinalarão nestas conclusões e se transcreveram na motivação, são os concretos meios probatórios constantes do processo e da gravação que os apelantes entendem que impõem que seja proferida decisão diversa da recorrida quanto à seguinte materialidade: que sejam aditados dois novos factos provados 16. e 17., que seja esclarecido e/ou concretizado o início do período temporal da ocorrência dos factos provados 11., 12., 13. e 14., que seja aditado um novo facto não provado f.) e que seja eliminada, ou considerada como não escrita, matéria jurídico - conclusiva do facto não provado c.

    16. ) Com efeito, na sua Contestação, os apelados alegaram que em 30 de Março de 2016 celebraram com o pai do apelante marido um acordo escrito, que juntaram como doc. nº 5, no qual “reproduzindo a vontade” de uns e de outros, ficou consignado, além do mais, que J. M., que é o pai do apelante marido, “cede” ao apelado marido a parcela de terreno em mérito na acção, reconhecendo que a “parcela de terreno cedida passa a fazer parte integrante do prédio urbano” deste – cfr. cláusulas 4. e 5 do citado documento.

    17. ) E alegaram ainda que “o referido acordo foi cumprido” e que, a...

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