Acórdão nº 86/22.7GGSTC.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 22 de Novembro de 2022

Data22 Novembro 2022

Acordam em Conferência na Secção Criminal (2ª subsecção) I – Relatório 1.

No processo sumário n.º 86/22.7GGSTC, da Comarca de ... – Juízo Local Criminal de ... – ...

, foi proferida nova sentença em que se decidiu condenar o arguido AA, solteiro, filho de BB e de CC, nascido a .../.../1981, portador do Cartão do Cidadão nº ...22 ..., residente em Rua ..., ..., ..., como autor de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. pelo artigo 292.º, nº 1 do Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão suspensa na execução pelo período de 2 (dois) anos com a condição de cumprimento, como regra de conduta a executar sob apoio e fiscalização dos serviços de reinserção social – tratamento da alcoologia, devendo submeter-se a consulta de alcoologia, cumprindo o tratamento que lhe venha, eventualmente, a ser prescrito e, bem assim, na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados por um período de 8 (oito) meses, nos termos do estatuído no artigo 69.º, nº1, alínea a) do Penal.

  1. Inconformado com o decidido, recorreu o arguido questionando a pena que lhe foi cominada, concluindo: (transcrição) 1.Ao abrigo do artigo 412.º, n.º 1 do Código do Processo Penal segue-se a formulação das conclusões do presente recurso, não obstante da recomenda leitura da motivação do mesmo.

  2. AA foi condenado no passado dia 21 de abril, em processo sumário (artigo 381.º do Código do Processo Penal), por um crime de condução de veículo em estado de embriaguez (previsto e punido pelos artigos 292.º, n.º 1 do Código Penal) a uma pena de 6 (seis) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 (dois) anos, com a condição do cumprimento pelo arguido no cumprimento da regra de conduta a executar sob apoio e fiscalização dos serviços de reinserção social, designadamente o tratamento da alcoologia, devendo para o efeito submeter-se a consulta de alcoologia, cumprindo o tratamento que lhe venha, eventualmente, a ser prescrito de acordo com o previsto no artigo 50.º, n.º 1 e 52.º ambos do Código Penal.

  3. O Tribunal recorrido condenou ainda o aqui recorrente a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, de qualquer categoria, por um período de 8 (oito) meses, nos termos do artigo 69.º, n.º 1, alínea a) do Código Penal.

  4. Importa aprofundar os efeitos do alcoolismo quer no plano dos factos quer no plano do direito e, quanto a este último, aferir qual a influência que deverá ter na medida concreta da pena principal e acessória.

  5. O recorrente à hora de almoço consumiu bebidas alcoólicas em quantidade socialmente aceite e já ao final do dia terá decidido deslocar-se a um café próximo da sua habitação dado que não era sua intenção voltar a conduzir naquele dia quer por não ter qualquer necessidade quer por saber que não podia conduzir após o consumo de álcool.

  6. O recorrente só se consegue recordar de parte do período de tempo em que esteve no café. O recorrente afirma que não se consegue de lembrar do intervalo de tempo que intermedeia a sua presença naquele estabelecimento comercial e o momento em que foi intercetado pelas forças de segurança.

  7. Tal ficou a dever-se ao consumo de álcool naquele dia, mas não só, como se pretende demonstrar com a interposição do presente recurso.

  8. No posto da Guarda Nacional Republicana, não obstante da dificuldade do recorrente em proferir declarações, solicitou, da forma que sabia, a contraprova. Pelos elementos da Guarda Nacional Republicana terá sido dito que não valia a pena, dissuadindo o aqui recorrente do exercício do seu direito à realização da contraprova. Sem prejuízo do exposto, o recorrente colaborou exemplarmente com os elementos da Guarda Nacional Republicana.

  9. Acresce que o recorrente padece ainda de problemas de ansiedade aguda e de privação de sono. Aliás, na noite anterior à audiência de discussão e julgamento, o recorrente não conseguiu dormir e descansar devido ao nervosismo e ansiedade sentidos, encontrando-se em juízo com manifestas dificuldades de discernimento como certamente este Venerando Tribunal Superior entenderá.

  10. É do conhecimento dos advogados e magistrados os benefícios do processo sumário devido à sua celeridade e simplicidade processual sentidos na vertente da administração da justiça e a tramitação dos milhares de processos que correm os seus termos nos tribunais da nossa ordem jurídica, assume de enorme relevância questionar se em alguns casos concretos a aplicação da tramitação do processo sumário é suficientemente respeitadora dos princípios e das regras do Estado de Direito, nomeadamente quanto às garantidas de defesa do arguido.

  11. A título de exemplo, na declaração de voto vencido formulado pela Veneranda Juíza Desembargada do Douto Tribunal da Relação do Porto, Exma. Sra. Dra. Paula Cristina Passos Barradas Guerreiro são apontados alguns efeitos negativos relativamente ao processo sumário: “considero que em nada são afetadas as garantias de defesa do arguido julgado em processo comum, - desde que este seja decidido em tempo útil -, pois, nesta forma de processo até terá possibilidade de se defender dos factos que lhe são imputados com mais tranquilidade e sem a pressão do julgamento no momento: que tendo a vantagem da celeridade, apresenta como desvantagem um certa precipitação dos acontecimentos que pode, em ultima análise, perturbar a defesa a apresentar.” 12. Dado que ao arguido não foi providenciada uma efetiva oportunidade de defesa em sede de audiência de discussão e julgamento ou até em momento posterior devido à redução de atos e prazos resultando na decisão do tribunal recorrido, que se pretende que seja revogada, uma vez que materializa uma decisão injusta assente numa incorreta e incompleta apreciação dos factos e que por este motivo, de acordo com o preceituado no artigo 410.º, n.º 1, 2, alínea a) e c) do Código do Processo Penal, padece dos vícios constantes no artigo supramencionado.

  12. Sucede que, para além da dependência do arguido ao álcool, este também sofre de problemas psiquiátricos, nomeadamente bipolaridade e que não foi possível produzir prova a favor do arguido em sede de audiência de discussão e julgamento dado que o arguido foi presente a juízo 13 horas depois dos factos.

  13. É neste sentido que em sede de recurso para este Venerando Tribunal se afirma que no circunstancialismo já exposto que resulta uma compreensível impossibilidade do arguido, de acordo com a exigível diligência no caso concreto, ter oportunidade para procurar os ditos documentos e juntar aos autos a documentação ou declarar a sua situação clínica-psicológica sobretudo quando esteve praticamente sob privação de sono.

  14. A admissibilidade de junção excecional de prova (documental) aos autos, verificados os pressupostos acima descritos, já em sede de recurso da sentença de primeira instância para o Tribunal da Relação é atualmente pacífica na jurisprudência. Neste sentido, decidiu o Supremo Tribunal de Justiça no processo n.º 396/03 - 5.ª secção, a 27 de março de 2003, que “Qualquer que seja a proposta interpretativa para contemplar o termo do prazo de junção de documentos traduzido pela expressão 'até ao encerramento da audiência' - em alternativa entra a da 1.ª e a da 2.ª instância -uma coisa é certa: esse limite não pode, em qualquer caso, ultrapassar encerramento da audiência em 2.ª instância, já que o Supremo Tribunal, em recurso, como tribunal de revista que e não conhece de matéria de facto. IV- Por isso, é intempestiva a junção de documentos não apreciados pelo tribunal recorrido, para efeito de prova de factos atinentes à medida da pena, apenas aquando da interposição do recurso para o STJ.” 16. Dito de outro modo, sempre que esteja em causa a reapreciação da valoração e demais considerações sobre factos pelo Tribunal da Relação é admissível a junção de documentos no recurso para este Tribunal pelo efeito que terá essa reapreciação na escolha e medida da pena.

  15. A sua admissibilidade também se verifica dado que os documentos que agora se juntam são um contributo indispensável á descoberta da verdade e da boa decisão da causa e cujo princípio os Tribunais Superiores também estão sujeitos.

  16. Deste modo, juntam-se aos autos o Doc. 1 e 2.

  17. Através da apreciação provar-se-á que o recorrente foi obrigado a terminar precocemente o seu percurso militar devido a problemas psicológicos. (Doc. 1) 20. Ao longo dos anos, já como civil, o seu estado psicológico levantou a preocupação de alguns familiares tendo sido internado compulsivamente na ala psiquiátrico do Hospital ..., em .... Após alcançar um estado emocional equilibrado, passou a frequentar regularmente consultas na especialidade e a tomar medicação prescrita pela equipa médica.

  18. Por maioria de razão somos impelidos a questionar se não estamos perante um caso de inimputabilidade.

  19. Determina o artigo...

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