Acórdão nº 771/22 de Tribunal Constitucional (Port, 15 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelCons. Teles Pereira
Data da Resolução15 de Novembro de 2022
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 771/2022

Processo n.º 641/2022

1.ª Secção

Relator: Conselheiro José António Teles Pereira

Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – A Causa

1. A., B., C., D. e E. (os ora recorrentes) foram condenados, entre outros arguidos, em primeira instância (processo n.º 85/15.5GEBRG, do Juízo Central Criminal de Braga), nas seguintes penas:

[A.] o arguido A. na pena única de 11 anos de prisão, em cúmulo jurídico de penas parcelares aplicadas pela prática de crimes de furto qualificado e detenção de arma proibida;

[B.] o arguido B. na pena única de 8 anos e 2 meses de prisão, em cúmulo jurídico de penas parcelares aplicadas pela prática de crimes de furto qualificado e detenção de arma proibida;

[C.] o arguido C. na pena única de 5 anos e 4 meses de prisão, em cúmulo jurídico de penas parcelares aplicadas pela prática de crimes de furto qualificado e detenção de arma proibida;

[D.] o arguido D. na pena de 3 anos e 11 meses de prisão, pela prática de um crime de furto qualificado; e

[E.] o arguido E. na pena única de 6 anos e 10 meses de prisão, em cúmulo jurídico de penas parcelares aplicadas pela prática de crimes de furto qualificado, falsificação ou contrafação de documento, recetação e detenção de arma proibida.

1.1. Desta decisão recorreram os identificados arguidos para o Tribunal da Relação de Guimarães.

1.1.1. Das alegações de recurso apresentadas pelo arguido A. consta, designadamente, o seguinte:

“[…]

[Sobre a valoração probatória de certos factos relacionados com depósitos bancários em numerário:] Extrair daí a conclusão de que os valores creditados pelo Recorrente nas diversas contas bancárias por si detidas, eventualmente poderiam ter advindo do furto à casa do ofendido perpetrado no dia 18/011/2017 viola de forma frontal o princípio constitucional de in dubio pro reo. Circunstância que contamina irremediavelmente a decisão com o vício de inconstitucionalidade por violação do artigo 32.º da CRP.

[…]

[Sobre irregularidades apontadas à prova por reconhecimento:] Ainda que se considere retirado o valor probatório autónomo que este concreto meio de prova detém, entendemos que a mesma não poderá, em todo o caso, ser subsumível e apreciado à luz do artigo 127.º do CPP, pois neste sentido já se pronunciou o Tribunal Constitucional no Acórdão 137/2001 no sentido de o art. 147.º/7 estabelece uma proibição de prova, ao determinar que “o reconhecimento que não obedecer ao disposto neste art. não tem valor como meio de prova” (…) julgar inconstitucional, por violação das garantias de defesa do arguido consagradas no n.º1 do art. 32º CRP, a norma constante do art. 127.º CPP, quando interpretada no sentido de admitir que o princípio da livre apreciação da prova permite a valoração, em julgamento, de um reconhecimento do arguido realizado sem a observância de nenhuma das regras definidas pelo art. 147.º CPP”. Assim, escorando-se a condenação do Recorrente num meio de prova ao qual foi esventrado todo o seu valor probatório, é manifesto que essa decisão se encontra inquinada, impondo-se, por conseguinte, a sua revogação.

[…]

[Novamente sobre irregularidades apontadas à prova por reconhecimento:] Ainda que se considere retirado o valor probatório autónomo que este concreto meio de prova detém, entendemos que a mesma não poderá, em todo o caso, ser subsumível e apreciado à luz do artigo 127.º do CPP, pois neste sentido já se pronunciou o Tribunal Constitucional no Acórdão 137/2001 no sentido de o art. 147.º/7 estabelece uma proibição de prova, ao determinar que “o reconhecimento que não obedecer ao disposto neste art. não tem valor como meio de prova” […] julgar inconstitucional, por violação das garantias de defesa do arguido consagradas no n.º1 do art. 32º CRP, a norma constante do art. 127.º CPP, quando interpretada no sentido de admitir que o princípio da livre apreciação da prova permite a valoração, em julgamento, de um reconhecimento do arguido realizado sem a observância de nenhuma das regras definidas pelo art. 147.º CPP”. […] Assim, escorando-se a condenação do Recorrente num meio de prova ao qual foi esventrado todo o seu valor probatório, é manifesto que essa decisão se encontra inquinada, encontrando-se eivada da nulidade ínsita na alínea c) do n.º 1 do artigo 379.º do CPP, decorrente da violação do elenco normativo integrado pelas disposições dos artigos 147.º, 148.º e 149.º todos do CPP.

[…]

[Uma vez mais sobre irregularidades apontadas à prova por reconhecimento:] Ainda que se considere retirado o valor probatório autónomo que este concreto meio de prova detém, entendemos que a mesma não poderá, em todo o caso, ser subsumível e apreciado à luz do artigo 127.º do CPP, pois neste sentido já se pronunciou o Tribunal Constitucional no Acórdão 137/2001 no sentido de o art. 147.º/7 estabelece uma proibição de prova, ao determinar que “o reconhecimento que não obedecer ao disposto neste art. não tem valor como meio de prova” […] julgar inconstitucional, por violação das garantias de defesa do arguido consagradas no n.º1 do art. 32º CRP, a norma constante do art. 127.º CPP, quando interpretada no sentido de admitir que o princípio da livre apreciação da prova permite a valoração, em julgamento, de um reconhecimento do arguido realizado sem a observância de nenhuma das regras definidas pelo art. 147.º CPP”. […] Assim, embora nenhum dos objetos apreendidos ao Recorrente tenha sido reconhecido pelos titulares dos cofres, a verdade é que, a sua condenação também ela é estribada num meio de prova ao qual havia sido esventrado todo o seu valor probatório, por força do n.º 7 do artigo 147.º, sendo manifesto que a decisão em mérito se encontra irremediavelmente inquinada, impondo-se, por conseguinte, a sua revogação.

[…]

Isto posto, do texto da decisão recorrida brota a delicadeza dos indícios aos quais se encontra ancorada a decisão recorrida, insuficientes para fundamentar uma condenação o que, redunda na violação da presunção de inocência e in dubio pro reo (art. 32.º, n.º 2, da CRP), repescável enquanto erro notório na apreciação da prova (art. 410.º nº 2 al. c) do CPP), (…).

[…]

Condenando o arguido nos termos supra expostos, a douta decisão violou o artigo 127.º do CPP e, concomitantemente o artigo 32.º da CRP.

[…]”.

1.1.2. Das alegações de recurso apresentadas pelo arguido B. consta, designadamente, o seguinte:

“[…]

[Invoca-se] desde já a inconstitucionalidade dos artigos 148.º, 149, e 147.º, n.º 1, 2, 5 e 7, todos do CPP, quando interpretados no sentido de que o reconhecimento de objetos pode ser feito por fotografia, ou por fotografia seguido de reconhecimento presencial do objeto a reconhecer e sem que a este se juntem pelo menos dois outros objetos semelhantes, bem como pode ser feito por mais do que uma pessoa, em simultâneo, e ainda relativamente a vários objetos a reconhecer também em simultâneo.

[…]”.

1.1.3. Das alegações de recurso apresentadas pelo arguido C. consta, designadamente, o seguinte:

“[…]

O recorrente entende que deve ser apreciada a inconstitucionalidade da interpretação normativa do artigo 127.º do Código Processo Penal, acolhida na decisão recorrida de que a apreciação da prova segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador, permite o recurso às presunções de prova previstas nos artigos 349.º e 350.º do Código Civil, considerando e com o devido respeito, que tal interpretação ora colocada em crise viola as garantias de defesa e da presunção de inocência e o princípio in dubio pro reo, consagrados no artigo 32.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, bem como, do dever de fundamentar, estatuído no artigo 205.º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa.

O recorrente considera e com o devido respeito que o Tribunal recorrido deveria ter aplicado os princípios constitucionais suprarreferidos aquando da interpretação normativa do artigo 127.º do Código de Processo Penal, enquanto expressão garante da minimização de equívocos irrefletidos quando se recorre a este tipo de prova, como resulta do acórdão recorrida quando formou a sua convicção sobre a verdade do facto e o seu convencimento da veracidade do mesmo, para lá da dúvida razoável, sustentando tal convencimento em elementos de prova que mesmo concatenados com outros não deveriam ter permitido formar a convicção do Tribunal a quo, pela verdade do facto e sua demonstrabilidade no que concerne à prática dos crimes em causa.

[…]”.

1.1.4. Das alegações de recurso apresentadas pelo arguido D. consta, designadamente, o seguinte:

“[…]

[Sobre a valoração de um alegado meio enganoso de prova:] Em suma, a utilização deste meio de prova em clamorosa violação do disposto no artigo 126.º do CPP e, ainda, do artigo 32.º, n.ºs 2 e 8, da CRP, o que consubstancia uma inconstitucionalidade material, o que desde já se invoca, ofende, igualmente, o artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

[…]

Ora, como se disse supra, não resultou demonstrado que o arguido tenha consultado o Facebook, sendo que a este propósito é das regras da experiência e um facto do conhecimento geral que toda e qualquer pessoa acede ao Facebook e podia ter acedido ao Facebook para saber da atuação musical dos assistentes F. e a sua banda,

Sendo meramente conclusivo ao arrepio do disposto no art 127.º e do princípio da livre apreciação da prova que também tem regras e em violação do artigo 32/2 da CRP, em verdadeira inconstitucionalidade uma vez mais.

[…]

Pelo que não pode, como já referido, concluir-se como no acórdão: “a notícia de que os mesmos estariam ausentes do seu domicílio na data em que os factos foram executados não seria do natural domínio dos residentes no meio ou nas zonas circundantes. Porém, o arguido D., pessoa ligada ao meio e com amigos em comum, detinha condições para poder estar no domínio desse...

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