Acórdão nº 57/18.8GACMN.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelF
Data da Resolução07 de Novembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

(Secção Penal) I. RELATÓRIO A. No processo comum singular nº 57/18.8GACMN.G1, do Juízo Local de Competência Genérica de Caminha, do Tribunal Judicial da Comarca de Viana o Castelo, na sessão da audiência de julgamento realizada em 21 de fevereiro de 2022 foi indeferido o requerimento apresentado pelo arguido R. A. para visualização em audiência de julgamento de um vídeo alegadamente referente aos factos ocorridos a 8 de fevereiro de 2018, por despacho com o seguinte teor: B. «Nos termos previstos no n.º 4 do artigo 340º do C.P.P, os requerimentos de prova são indeferidos se for notório que as provas requeridas já podiam ter sido juntas com a acusação ou a contestação, exceto se o Tribunal entender que são indispensáveis para a descoberta da verdade e boa decisão da causa.

No caso concreto, atendendo ao objeto deste processo e considerando a prova produzida em audiência de julgamento, temos como claro que a visualização do vídeo não é indispensável para a descoberta da verdade e boa decisão da causa mesmo que a sua valoração tivesse suporte legal tal como oportunamente se fundamentará em sede de sentença.

Pelo exposto, indefiro o requerimento em análise.» Inconformado, o arguido R. A. interpôs recurso deste despacho intercalar, apresentando a competente motivação que remata com as seguintes conclusões: «I. Vem o presente Recurso interposto do Douto Despacho de fls. (de~21/02/2022), o qual indeferiu o requerimento de prova do Arguido, consubstanciado na junção de um vídeo (já constante dos autos) e na sua reprodução/visualização em Audiência de Julgamento.

  1. Vídeo/Gravação indispensável à demonstração das contradições os factos ocorridos e a versão trazida aos autos pelo assistente/Arguido S. C. e pelas testemunhas I. P. e J. G..

  2. A CRP consagra no seu art. 32º as “Garantias do processo criminal”: «o processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso»; «todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa»; «o processo criminal tem estrutura acusatória, estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório».

  3. «Em “todas as garantias de defesa” engloba-se indubitavelmente todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acusação. Dada a radical desigualdade material de partida entre a acusação (normalmente apoiada no poder institucional do Estado) e a defesa, só a compensação desta, mediante específicas garantias, pode atenuar essa desigualdade de armas». – Cf. Gomes Canotilho e Vital Moreira, in “Constituição da República Portuguesa Anotada”, Coimbra Editora, Vol. I, página 516.

  4. O art. 340º do CPP prescreve que «o Tribunal ordena, oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa», que «(…) os requerimentos de prova são indeferidos por despacho quando a prova ou o respectivo meio forem legalmente inadmissíveis» e que «os requerimentos de prova são ainda indeferidos se for notório que: a) as provas requeridas são irrelevantes ou supérfluas; b) o meio de prova é inadequado, de obtenção impossível ou muito duvidosa; ou c) o requerimento tem finalidade meramente dilatória».

  5. No douto Despacho recorrido o Tribunal indeferiu o requerimento de prova do Arguido com o fundamento de que «considerando a prova produzida em audiência de julgamento, temos como claro que a visualização do vídeo não é indispensável para a descoberta da verdade e boa decisão da causa mesmo que a sua valoração tivesse suporte legal».

  6. Com o devido respeito por diferente entendimento, o art. 340º circunscreve a possibilidade de indeferimento do requerimento de prova à verificação de alguma das circunstâncias aí previstas: inadmissibilidade legal, irrelevância da prova, inadequação do meio de prova, finalidade dilatória do requerimento.

  7. «(…) O Tribunal ordena a produção da prova tida por: necessária, legalmente admissível, adequada, de obtenção possível ou, pelo menos, não muito duvidosa e consentânea com o normal devir do processo». [Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 11/07/2011, no qual foi Relator o Sr. Juiz Desembargador Dr. Paulo Fernandes da Silva.] IX. A gravação cuja visualização se requereu é a reprodução mais fiel do que realmente ocorreu nesse dia 08 de fevereiro de 2018.

  8. De acordo com a Jurisprudência mais recente, citada no requerimento ditado para a acta, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, essa gravação não configura meio proibido de prova.

  9. Essa gravação (bem como a sua reprodução em Audiência de Julgamento) é imprescindível à descoberta da verdade e à boa decisão da causa, é legalmente admissível, obtenível e não protelaria o normal andamento dos autos.

  10. Ao indeferir a junção da gravação (em abono da verdade, já constante a fls. dos autos), bem como a sua visualização em sede de audiência de julgamento, impediu o Tribunal a defesa de produzir prova (legal, obtenível, essencial), a qual permitiria abalar a credibilidade do Assistente S. C. e das Testemunhas por ele arroladas.

  11. Tal indeferimento não encontra, com o devido respeito, sustentação no art. 340º do CPP.

  12. É certo que o Julgador, decorridas já várias sessões da Audiência de Julgamento, poderá já ter formado a sua convicção. Todavia, é igualmente certo que essa convicção pode vir a ser abalada e alterada (como a defesa entende que será) com a junção das certidões requeridas.

  13. O Arguido presume-se inocente, sendo à Acusação que compete carrear para os autos os elementos de prova que demonstrem a sua culpabilidade. Porém, o Arguido pode e deve colaborar com o Tribunal na descoberta da verdade, auxiliando-o.

  14. O Douto Despacho de que se recorre, ao indeferir um requerimento de produção de prova apresentado pelo Arguido, cerceia as suas garantias de defesa e ofende a CRP.

  15. Violou o Douto Despacho recorrido as normas dos art. 127º, 164º, 165º e 340º, todos do Código de Processo Penal, e ainda do art. 32º da Constituição da República Portuguesa.» O recurso foi admitido, com efeito meramente devolutivo e subida diferida, com o recurso da decisão que puser termo à causa.

    A Digna Magistrada do Ministério Público junto do tribunal recorrido respondeu, pugnando pela procedência deste recurso, com fundamento no disposto no artigo 340º do Código e Processo Penal.

    *B.

    Na mesma sessão da audiência de julgamento realizada em 21 de fevereiro de 2022, foi indeferido o requerimento apresentado pelo arguido R. A. no sentido de ser designada data para que pudesse prestar declarações, por despacho com o seguinte teor: «No que respeita a esta matéria, prevê o nº. 3 do art.º 334º do C.P.P que, nos casos previstos no nº. 1 e nº. 2, desse mesmo artigo, se o tribunal vier a considerar absolutamente indispensável a presença do arguido, ordena-a, interrompendo ou adiando a audiência, se isso for necessário.

    No caso concreto, a audiência de julgamento vem-se realizando em várias sessões na ausência do arguido que, nos termos do disposto pelo nº. 2 da referida norma legal solicitou ou consentiu que a audiência tivesse lugar na sua ausência, sem que para tal tenha requerido ser ouvido ou estar presente, nem se tenha apresentado em nenhuma das sessões em que se desdobrou a audiência de discussão e julgamento. No presente momento em que está encerrada a produção da prova, tal como o tribunal se pronunciou no que respeita ao anterior requerimento, entende-se que a presença desse arguido, em face da prova produzida, não se nos afigura absolutamente indispensável para o esclarecimento dos factos e para a boa decisão da causa, sendo certo que, igualmente, nada foi alegado, relativamente a esse pressuposto legal pelo seu ilustre defensor oficioso. Assim sendo, decide-se indeferir esse requerimento com a fundamentação já expendida.» Inconformado, o arguido R. A. interpôs também recurso este despacho intercalar, apresentando a competente motivação que remata com as seguintes conclusões: «I. Vem o presente Recurso interposto do Douto Despacho de fls. (de 21/02/2022), o qual indeferiu a tomada de declarações ao Arguido.

  16. A CRP consagra no seu art. 32º as “Garantias do processo criminal”: «o processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso»; «todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT