Acórdão nº 1523/21.3T8CTB-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução09 de Novembro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Processo n.º 1523.21.3T8CTB-A (Juízo Local Cível de Castelo Branco - Juiz 3) Acordam os Juízes da 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra: 1.

Relatório Os co-executados AA e BB deduziram o presente incidente de oposição à execução, tendo apresentado em separado os respectivos embargos (v. ref.ª 2741217 de 16.12.2021 dos presentes autos e ref.ª 2743857 de 20.12.2021 apenso B).

Para o efeito alegaram, de forma unânime e no geral, em suma, que, admitindo a outorga dos contratos de mútuo com fiança e hipoteca nos termos que descrevem, sendo os aqui Embargantes fiadores em tais contratos, foi outorgado, em momento posterior, entre o executado CC e o banco Embargado um contrato de dação em cumprimento e renúncia de hipoteca, tendo o executado ficado convencido que os aqui Embargantes iriam sair do contrato como fiadores, desconhecendo o executado que foi efectuada a dação em cumprimento com renúncia de hipoteca; e bem ainda como foi atribuído ao imóvel o valor que indica; sendo que o executado CC tem vindo a fazer o pagamento das prestações ao embargado no valor de 100,00€, não se verificando qualquer incumprimento por parte deste; alegando ainda, em síntese, que por força da renúncia das hipotecas por parte do Embargado, impediu os embargantes de virem a ficar sub-rogados nesse direito, concluindo pela desoneração dos fiadores da obrigação que contraíram e respectiva extinção de responsabilidade.

Mais alega o co-executado / Embargante AA que ele e a sua esposa não intervieram na referida dação em cumprimento, nem dela tiveram conhecimento nem tão pouco foram ouvidos ou lhes foi comunicado o valor que foi pelos ali contratantes, fixado ao imóvel objeto do negócio; e ainda que quando assinaram o contrato de mútuo bancário com hipoteca e fiança nada lhes foi informado, nem explicado, nomeadamente o que era a renúncia expressa ao benefício da excussão prévia.

Por sua vez, alega ainda a co-executada / Embargante BB que o executado CC com a assinatura da procuração emitida a favor do banco Embargado terá ficado convencido que a dívida ao banco se encontrava paga, transmitindo à executada que já não era sua fiadora; sendo que tomou agora esta conhecimento, por força da citação nos presentes autos, da escritura de dação em cumprimento e renúncia de hipoteca; mais alega que a procuração em causa exorbita e contraria o teor do mandato que lhe foi concedido, estando as procuradoras apenas autorizadas a declarar que o mandante dá o imóvel para pagamento da dívida, devendo a mesma ser considerada saldada e consequentemente extintas as obrigações contraídas nos mútuos outorgados; sendo que a entender-se que o alcance do mandato que lhes foi conferido, era o de permitir um cumprimento apenas parcial da dívida, sempre o mesmo seria anulável, pois configuraria um mandato para celebração de negócio consigo mesmo, em que existiria um claro conflito dos interesses do representante e do representado; alega ainda que o valor do imóvel, à data, tinha um valor bem superior ao valor remanescente em dívida, tendo o mutuário efetuado o pagamento da totalidade da quantia em divida em virtude de ter dado em pagamento o imóvel hipotecado. Notificado, veio o exequente Novo Banco, S.A., contestar (v. ref.ª 2798570 de 16.02.2022), impugnando, no geral, o alegado pelos Embargantes; mais esclarecendo que em 11.05.2019 o contrato sub judice encontrava-se em incumprimento, tendo o mesmo passado para a gestão do Departamento de Recuperação de Crédito, e a partir de 08.05.2020, como o mutuário não liquidou mais prestações, constituiu-se em mora, verificando-se um incumprimento definitivo do contrato; os eventuais pagamentos esporádicos efetuados pelo mutuário ocorridos após o incumprimento definitivo do contrato nunca foram no valor suficiente para liquidação do montante de capital em dívida, acrescido dos juros, incluindo os de mora, já vencidos; no mais, alega ainda que o executado mutuário CC apresentou, em 19.08.2014, proposta de dação em cumprimento ao banco Embargado, tendo sido efectuada uma avaliação ao imóvel no sentido de apuramento do seu valor de venda imediata, cujo valor se cifrou em 62.250,00€, e por esse motivo foi remetida comunicação àquele o valor apurado e que o mesmo não seria suficiente para liquidar integralmente ambos os contratos, detalhando para tal qual o montante remanescente e como deveria o mesmo ser liquidado e nesta sequência veio o executado mutuário CC aceitar o exposto pelo banco Embargado, tendo o mesmo pleno conhecimento, aquando da celebração da escritura de dação, quer do montante em dívida referente a ambos os contratos celebrados, quer do valor do imóvel dado em dação por conta da avaliação efetuada, e bem assim de que permaneceria em dívida um valor remanescente por este ainda a liquidar; quanto à procuração em causa, alega que a mesma não padece de invalidade, defendendo ainda que não ocorre, no caso em apreço, liberação dos fiadores por impossibilidade de sub-rogação nos termos que explicita.

Termina concluindo pela improcedência dos embargos deduzidos.

O Juízo Local Cível de Castelo Branco - Juiz 3, julga os embargos improcedentes, e, consequentemente, decide: “Pelo exposto, julgo as oposições à execução mediante embargos deduzidas por AA e BB totalmente improcedentes, por não provadas, e, consequentemente determino o prosseguimento da execução a que este incidente está apenso.

Valor da causa: o já anteriormente fixado.

Registe e notifique.

Dê conhecimento ao Sr. Agente de Execução nos autos de execução”.

AA, embargante nos autos em epígrafe, não se conformando com a decisão interpõem o seu recurso, assim concluindo: 1. O Tribunal a quo deu como provado no ponto 28. dos factos provados, que o recorrente não interveio na escritura pública de dação em cumprimento e renúncia de hipoteca, realizada entre o Banco Embargado e o executado CC, nem dela teve conhecimento.

  1. O Efetivamente, em consequência da dação em cumprimento parcial da fração autónoma dada de hipoteca ao Banco Embargado, este liquidou parte da dívida, no montante de 62.250,00€.

  2. O executado CC, ficou, pois, quanto ao remanescente, a dever ao Banco Embargado a quantia de 30.334,50 €.

  3. O Banco Embargado, por força da dação em cumprimento que celebrou com o executado CC, autorizou o cancelamento das inscrições hipotecárias que garantiam o seu crédito, renunciando voluntariamente a tal garantia.

  4. Na verdade, o Recorrente constituiu-se fiador e principal pagador no âmbito de dois contratos de mútuo com hipoteca a favor do seu filho, CC.

  5. A questão está em saber se, com a dação em cumprimento parcial e renúncia à hipoteca, o Recorrente Fiador ficou, ou não, desonerado das suas obrigações como fiador perante o Banco Embargado.

  6. Ora, dispõe o artº 653º do Cód. Civil que “Os fiadores, ainda que solidários, ficam desonerados da obrigação que contraíram, na medida em que, por facto positivo ou negativo do credor, não puderem ficar sub-rogados nos direitos que a este competem”.

  7. Por sua vez, preceitua o artº 644º do mesmo Código que “O fiador que cumprir a obrigação fica sub-rogado nos direitos do credor, na medida em que estes foram por ele satisfeitos”.

  8. Não obstante não haver uma referência expressa à sub-rogação na hipoteca do credor, tal garantia, sendo acessória do crédito, está naturalmente abrangida na referência genérica aos “direitos que a este competem” – cfr. neste sentido Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, 4º ed., Vol. I, p. 671.

  9. Por outras palavras, renunciando o credor à garantia da hipoteca impede o fiador de ficar sub-rogado no direito à mesma.

  10. E não se diga que está em causa apenas uma situação de fiança com benefício da excussão prévia, na medida em que o próprio texto do artigo diz expressamente que o mesmo se aplica ainda que em caso de “solidariedade”.

  11. Acrescenta o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 22-06-2017, Proc. 4267/17.7T8LSB-A.L1-8, o qual julgou improcedente a apelação intentada pelo aqui Banco Embargado contra o filho do ora Recorrente DD, também ele tendo sido aqui fiador, que: “Noutra ordem de considerações, dir-se-á que, contrariamente ao invocado pelo requerido, o fiador pode, de facto, falar da “garantia da hipoteca que perdeu”, na medida em que tal garantia, sendo do Banco/credor, pode “reverter” a favor do fiador através da sub-rogação nos direitos do credor, na medida em que por si for satisfeita a obrigação. E foi precisamente dessa possibilidade, ou seja, de se valer da garantia da hipoteca perante o mutuário, na medida do que por si fosse satisfeito, que o requerido impediu o requerente.” 13. Continuando o dito Acórdão: “Nesta conformidade, independentemente de se considerar que as partes (mutuante e mutuário) não quiseram extinguir a obrigação anterior na totalidade, criando uma nova em seu lugar, a verdade é que se mostra verificada a desoneração do fiador nos termos do disposto no citado normativo.”.

  12. E, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24.04.2012, Proc.º nº 18/07.2TBTBC.P1.S1, decidiu no seguinte modo: “O artº 653º do CC quando prescreve que “os fiadores, ainda que solidários, ficam desonerados da obrigação que contraíram, na medida em que, por facto positivo ou negativo do credor, não puderem ficar sub-rogados nos direitos que a este competem”, consagra a designada excepção ou benefício cedendarumactionem. Assim sendo, ficam desonerados da obrigação que contraíram os fiadores de um mútuo com garantia hipotecária se a instituição de crédito renunciou à hipoteca, emitindo documento de cancelamento em conformidade com o disposto nos arts 730º, alª d), 731º, n.º 1, do CC e 56º do CRgP|4|”.

  13. Também o acórdão da Relação de Lisboa de 14.04.2016, Proc.º nº 10971/15.7T8LSB.L1-6, decidiu o seguinte: “Num contrato de mútuo, cancelada, com o consentimento do credor, a hipoteca que garantia a obrigação do mutuário, os fiadores deixaram de se poder sub-rogar nos direitos do credor, para os efeitos da desoneração prevista no artigo 653º do CC, já...

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