Acórdão nº 2000/22.0T8VCT-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 03 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA EUG
Data da Resolução03 de Novembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes da 1ª Secção do Tribunal da Relação de Guimarães: I. Relatório A. M., sócio gerente da sociedade comercial Quinta de X, Ld.ª instaurou a presente acção com processo especial de destituição de titulares de órgãos sociais, pedindo que os réus H. M., sócio gerente, e M. A., gerente, sejam destituídos da gerência da referida sociedade, requerendo ainda, ao abrigo do nº 2 do art. 1055º do CPCivil, a suspensão cautelar preliminar dos mesmos do cargo, *Inquiridas duas testemunhas indicadas pelo A. e tomadas declarações ao mesmo, foi proferida decisão do pedido cautelar de suspensão dos RR. do cargo, com o seguinte Dispositivo: “Em conformidade com o exposto, julga o Tribunal procedente, por indiciariamente provada, a presente medida cautelar e, consequentemente, determina a suspensão dos Requeridos H. M. e M. A. do cargo de gerentes da sociedade comercial Quinta de X, Ld.ª.--- Custas pelo R [art.º 539.º, n.ºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil].--- Registe e notifique.”*Os RR. inconformados com esta decisão cautelar, interpuseram o presente recurso, terminado as suas alegações, com as seguintes CONCLUSÕES (transcrição) 2.3.1 Ilegitimidade processual passiva 1. Pela presente acção o Autor, sócio da sociedade comercial Quinta de X, Ld.ª, pretende a destituição dos outros dois gerentes dessa sociedade mediante invocação de justa causa, sendo que um desses gerente é o seu único sócio e o outro gerente é pessoa que não é sócia da referida sociedade.

  1. Existindo justa causa, pode qualquer sócio requerer a suspensão e a destituição do gerente, em acção intentada contra a sociedade (artº 257º, nº 4 do CSC).

  2. Sendo a sociedade, por determinação legal, a titular desse interesse, carecem os Recorrentes de legitimidade processual passiva (artº 30º, nº 3 do CPC).

  3. A sentença recorrida violou, por erro manifesto de interpretação e de (não) aplicação, o disposto no artigo 257º, nº 4 do Código das Sociedades Comerciais, bem como o disposto no artigo 30º, nº 3 do CPC.

  4. Deve tal sentença ser revogada e substituída por outra que, face ao disposto em tais normas, declare a ilegitimidade processual passiva dos Réus e os absolva da instância (artº 278º, al. d) do CPC).

    2.3.2 Sem prescindir: ainda a ilegitimidade processual passiva 6. A relação jurídica de gerência não se estabelece entre os sócios nem entre um sócio e o gerente, mas sim entre o gerente e a sociedade, sendo este os titulares passivo e activo de tal relação.

  5. Ainda que se entenda que no caso de uma sociedade constituída apenas por dois sócios, o sócio destituindo tenha também interesse em contradizer e que seja isso o que resulta da melhor interpretação do nº 5 do artigo 257º do CSC, o facto é que isso não afasta a norma do nº 4 do mesmo preceito que, de forma clara, determina que a sociedade é titular do interesse processual em contradizer.

  6. A sentença recorrida, no que à demanda contra o Réu H. M. concerne, único sócio do Autor e gerente destituendo violou, por erro manifesto de interpretação e de (não) aplicação, o disposto no artigo 257º, nº 4 do Código das Sociedades Comerciais, bem como o disposto nos artigos 33º, nº 1 e 30º, nº 3 do CPC.

  7. Deve tal sentença ser revogada e substituída por outra que, face ao disposto em tais normas, declare a ilegitimidade processual passiva dos Réus por preterição de litisconsórcio e os absolva da instância (artº 278º, al. d) do CPC).

    2.3.3 Independentemente disso: a ilegitimidade processual passiva da segunda Ré.

  8. A Recorrente M. A. não é sócia da sociedade.

  9. Na acção movida por um sócio para destituição de gerente de quem não é sócio, a única pessoa jurídica com interesse em contradizer é a própria sociedade, contra a qual imperativamente a acção tem que ser proposta, por força do disposto no artigo 257º, nº 4 do CSC.

  10. Não tendo o Autor proposto a acção contra a sociedade mas contra tal gerente não sócia, a decisão recorrida violou por erro manifesto de interpretação e de (não) aplicação, o disposto no artigo 257º, nº 4 do Código das Sociedades Comerciais, bem como o disposto no artigo 30º, nº 3 do CPC.

  11. Deve tal sentença ser revogada e substituída por outra que, face ao disposto em tais normas, declare a ilegitimidade processual passiva dos Réus e os absolva da instância (artº 278º, al. d) do CPC).

    *O A. contra-alegou defendendo a manutenção do decidido, sustentando que os RR. são parte legítima e não há litisconsórcio necessário, tanto mais que conduziria a posições inconciliáveis.

    *O recurso foi admitido como apelação com subida imediata e efeito meramente devolutivo, o que foi confirmado neste Tribunal.

    *Foram colhidos os vistos legais.

    Nada obstando ao conhecimento do recurso, cumpre decidir.

    *II. Delimitação do objecto do recurso O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. arts 608º, nº2, 635º, nº4 e 639º, nº1 e 2 do CPC.

    Assim, face às conclusões dos recorrentes a única questão a decidir consiste em aferir a legitimidade passiva dos mesmos.

    1. Fundamentação de facto A 1ª instância considerou indiciariamente provados os seguintes factos que não foram impugnados: 1. A Quinta de X, Ld.ª é uma sociedade comercial por quotas, cujo objecto social é a indústria hoteleira ou similar, com especial vertente para o turismo rural de habitação e agroturismo, desenvolvimento de actividades de lazer e entretenimento, que tem a sua sede na Rua …, nº …, freguesia de …, concelho de Viana do Castelo, com o capital social de cinco mil euros, e o NIPC ……….--- 2. A gerência da predita sociedade é exercida pelos sócios A. M. (Requerente) e H. M. (1º Requerido) e por M. A. (2ª Requerida).--- 3. Para obrigar a sociedade são necessárias as assinaturas dos três gerentes.--- 4. A actividade de turismo rural a que se dedica a sociedade desenvolve-se no prédio urbano propriedade de Requerente e 1.º Requerido, sita na Rua …, nº .., inscrita na matriz predial respectiva sob o art. ..º e descrita na Conservatória do Registo Predial sob o nº ….-- 5. Os Requeridos gerem exclusivamente a actividade de turismo rural sem dar qualquer conhecimento ao Requerente, quer quanto às despesas geradas com a referida actividade quer quanto aos seus rendimentos, nem solicitar o seu parecer ou discutir com aquele alguma decisão que seja necessário tomar, deixando-o completamente à margem da gestão da empresa.--- 6. A actividade de turismo rural é publicitada em sites/plataformas de reservas como a Edreams, a Booking, a Trpadvisor, a Airbnb, a Escapada Rural, e outras.-- 7. Os Requeridos alteraram as palavras passe de acesso às referidas plataformas da sociedade, de modo a impedir o Requerente de verificar e controlar reservas, entradas e saídas da referida Quinta.--- 8. Os Requeridos contratam prestadores de serviços quer de jardinagem, quer de manutenção da referida Quinta sem dar saber ao Requerente...

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