Acórdão nº 041/22.7BCLSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelSUZANA TAVARES DA SILVA.
Data da Resolução03 de Novembro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1 – Z………..

(Z……..), X………… (X……….) e Sporting Clube de Portugal - Futebol SAD (Sporting SAD), todos com os sinais dos autos, apresentaram no Tribunal Arbitral do Desporto (TAD), contra a Federação Portuguesa de Futebol (FPF), igualmente com os sinais dos autos, recurso do acórdão, proferido em plenário, do Conselho de Disciplina (Secção Profissional) da Federação Portuguesa de Futebol de 6.7.2021, no âmbito do processo disciplinar n.º 28-20/21.

2 – Por acórdão de 24 de Dezembro de 2021, do TAD, o processo arbitral foi julgado procedente e, consequentemente, revogada a decisão condenatória.

3 – Inconformada, a FPF recorreu daquela decisão para o TCA Sul, que, por acórdão de 19 de Maio de 2022, concedeu parcial provimento ao recurso, julgou improcedente o pedido de ampliação do objecto do recurso deduzido por Z………., revogou o acórdão arbitral recorrido no segmento relativo a Z……… e, em consequência, julgou totalmente improcedente o recurso interposto pelo mesmo perante o TAD.

4 – Inconformada com esta decisão, a FPF apresentou recurso de revista para este Supremo Tribunal Administrativo, o qual foi admitido por acórdão de 8 de Setembro de 2022.

5 - A Recorrente apresentou alegações que rematou com as seguintes conclusões: «[…] 1. A Recorrente vem apresentar recurso da decisão proferida pelo TCA SUL no âmbito do recurso interposto da decisão arbitral alcançada na ação arbitral necessária n.º 37/2021, que declarou parcialmente procedente o recurso, determinando, contudo, que o Recorrido X………… e a Recorrida Sporting Clube de Portugal – Futebol SAD não podiam ser sancionados pelas declarações proferidas pelo primeiro Recorrido.

  1. Naturalmente, não se recorre do segmento decisório que, revogando o Acórdão do TAD, confirma a sanção aplicada ao Recorrido Z……….., por se considerar decisão ajustada e certeira.

  2. Os Recorridos haviam sido punidos pela prática de infrações disciplinares relacionadas com ofensas perpetradas a órgãos ou agentes desportivos, em concreto, foram aplicadas pela Secção Profissional do Conselho de Disciplina: (i) A X………….. sanção de suspensão de 22 dias e sanção de multa de € 3.830; (ii) À Sporting Clube de Portugal – Futebol SAD sanção de multa de € 20.910,00.

  3. Andou mal o Tribunal a quo ao decidir que, no caso, existe uma causa de exclusão da ilicitude – o direito fundamental à liberdade de expressão – e, por essa razão, decidiu, quanto ao Recorrido X………….. e à Recorrida Sporting Clube de Portugal – Futebol SAD, revogar a decisão do Conselho de Disciplina.

  4. O valor protegido pelos ilícitos disciplinares em causa nos autos, à semelhança do que é previsto nos artigos 180.º e 181.º, do Código Penal, é o direito “ao bom nome e reputação”, cuja tutela é assegurada, desde logo, pelo artigo 26.º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa; mas tais artigos do RD da LPFP visam, ao mesmo tempo, a proteção das competições desportivas, da ética e do fair play.

  5. A nível disciplinar os valores protegidos com estas normas são, em primeira linha, os princípios da ética, da defesa do espírito desportivo, da verdade desportiva, da lealdade e da probidade e, de forma mediata, o direito ao bom nome e reputação dos visados, mas sempre na perspetiva da defesa da competição desportiva em que se inserem.

  6. Em concreto, as normas em causa visam prevenir e sancionar a prática de condutas desrespeitosas entre agentes desportivos, visando tutelar a ética desportiva, a urbanidade, a probidade e a lealdade, enquanto princípios e valores que norteiam a prática de desporto em contexto de competição, sob um eixo de ética desportiva, associada, naturalmente, à necessária tutela da reputação, bom nome, consideração, credibilidade e profissionalismo dos diversos agentes desportivos e outros intervenientes, que, sob qualquer veste e independentemente do tipo de intervenção concreta, participam nas competições, em particular dos elementos que integram a equipa de arbitragem.

  7. Com efeito, as normas em crise, impõem aos dirigentes de clubes, o escrupuloso cumprimento de deveres de correção e de urbanidade nas suas relações desportivas, nomeadamente quando tecem considerações e juízos e/ou formulam e dirigem imputações aos elementos da equipa de arbitragem que são suscetíveis de abalar e ofender a reputação, o bom nome e a credibilidade dos visados, bem como quanto a juízos e/ou imputações dirigidos contra órgãos sociais da FPF, nomeadamente o Conselho de Arbitragem.

  8. Evidentemente, se é verdade que o direito à crítica constitui uma afirmação concreta do valor da liberdade de pensamento e expressão que assiste ao indivíduo (artigo 37.º, n.º 1, da CRP), esse direito não é ilimitado. Ao invés, deve respeitar outros direitos ou valores igualmente dignos de proteção.

  9. Em particular, veja-se o art. 26.º da Constituição da República Portuguesa (doravante, CRP) que, sob a epígrafe “outros direitos pessoais”, consagra os chamados direitos de personalidade, entre os quais se encontra o direito ao bom nome e à reputação (nº 1 do art. 26.º da CRP).

  10. A relevância constitucional atribuída à tutela do bom nome e reputação legitimou, entre outros, a criminalização de comportamentos como a injúria e a difamação e, no âmbito do direito disciplinar desportivo, a tipificação de infrações disciplinares que consubstanciem ofensas à honra e reputação, designadamente, de agentes desportivos e dos órgãos da Federação Portuguesa de Futebol.

  11. Aqui chegados, será que as expressões e declarações supra mencionadas estão justificadas pelo exercício legítimo da liberdade de expressão, como entendeu o Tribunal a quo? Salvo o devido respeito, não.

  12. O que se verificou foi que, sem qualquer base factual concreta e real, os ora Recorridos formularam juízos de valor lesivos da honra dos agentes de arbitragem em questão, colocando em causa o interesse público e privado da preservação das competições de futebol.

  13. Com efeito, como Diretor de Comunicação de uma das maiores instituições desportivas nacionais, o Recorrido X………….. sabe que as declarações que profere são aptas as influenciar a comunidade e a imagem que a mesma tem das competições e dos agentes desportivos nelas envolvidos. Pelo que, impende sobre si, um dever de zelo para prevenir fenómenos de violência e intolerância no desporto.

  14. Tomando a opção de proferir declarações que proferiu, olvidando propositada e voluntariamente os deveres...

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