Acórdão nº 01315/17.4BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelADRIANO CUNHA
Data da Resolução03 de Novembro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – RELATÓRIO 1.

O “FUNDO DE GARANTIA SALARIAL (FGS)”, demandado na presente acção administrativa, interpôs o presente recurso de revista do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN), de 25/3/2022 (cfr. fls. 426 e segs. SITAF), que concedeu provimento ao recurso de apelação que o Autor, A…………………, interpusera da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (TAF/Porto), de 25.10.2021 (cfr. fls. 342 e segs. SITAF), e, revogando esta sentença, julgou a ação totalmente procedente.

  1. O Recorrente/Réu “FGS” concluiu do seguinte modo as suas alegações do presente recurso de revista (cfr. fls. 452 e segs. SITAF): «A. O requerimento do aqui Recorrido foi apresentado ao FGS em 18.01.2017, altura em que se encontrava em vigor o novo diploma legal regulador do FGS, DL 59/2015, de 21.04 que entrou em vigor no dia 04.05.2015.

    1. Assim, o referido requerimento foi apreciado à luz deste diploma legal.

    2. Este diploma prevê um prazo de um ano a contar da cessação do contrato de trabalho para que seja apresentado junto dos serviços da Segurança Social o requerimento para pagamento de créditos emergentes pela cessação do contrato de trabalho.

    3. Este prazo é um prazo de caducidade.

    4. Nesse sentido decidiu a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em 10/2021.

    5. O TCA NORTE, revogou esta sentença, por acórdão de 03/2022, considerando que seria de aplicar o prazo geral de prescrição de vinte anos, previsto no art.º 309 do Código Civil, porquanto seria de aplicar a solução legal do regulamento do FGS estabelecida na Lei n.º 35/2004, de 29/07 com a alteração da Lei n.º 9/2006, de 20/03.

    6. Porém, este diploma legal estava revogado, H. Não podendo, pois, ter aplicação ao requerimento do Recorrido.

      1. Assim, teremos de concluir que estamos perante um prazo de caducidade do direito de requerer os créditos e, J. Não perante um prazo de prescrição dos créditos.

    7. Pelo que, o prazo de um ano para requerer créditos emergentes ao FGS estava ultrapassado na data da apresentação do requerimento ao FGS pelo Recorrido, à luz do diploma DL 59/2015, de 21.04 que entrou em vigor no dia 04.05.2015, Termos em que, e com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, substituindo-a por outra que mantenha a sentença proferida pelo TAF do Porto em 25/10/2021».

  2. O Recorrido/Autor, A…………………..

    , apresentou contra-alegações, sem conclusões, pugnando pelo improvimento do presente recurso de revista e pela consequente manutenção do Ac.TCAN recorrido (cfr. fls. 465 e segs. SITAF).

    Defende ainda, nas mesmas, que será inconstitucional uma interpretação do regime legal que não preveja a interposição de ação laboral como causa de suspensão do prazo para requerimento dos créditos laborais ao “FGS”, referindo a este propósito: «(…) 34. Ora, o fundamento do Recorrente não passa pelo crivo da consagração do Estado de Direito, na medida em que torna aleatórios e arbitrariamente subversíveis os pressupostos do exercício de um direito social reconhecido a todos os trabalhadores.

  3. Também do ponto de vista de justiça constitucional, a sobredita aleatoriedade resulta, em, perante os mesmos pressupostos substantivos de facto e de direito, sem causa de discriminação alguma que não o acaso, se denegar, potencialmente, a uns trabalhadores e conferir a outros, uma prestação do Estado Social, ou seja, resulta numa ofensa do princípio e do direito Fundamental à igualdade de tratamento consagrado no art. 13º da CRP.

  4. Com tal interpretação estar-se-ia a admitir isso mesmo, pelo que deverá ser declarada a INCONSTITUCIONALIDADE da interpretação dada ao conjunto normativo do art. 2º nº 8 e nº 9 do DL 59/2015, de 21.04, conjugado com o art. 323º do CC e os arts. 2º, 13º e 59º nº 3 da CRP, redundando na violação do Estado de Direito, do direito dos trabalhadores e do princípio e direito fundamental à igualdade de tratamento.

  5. Aliás, interpretação diversa levaria a que um trabalhador, ao invés de recorrer aos tribunais do trabalho para reconhecimento e cobrança dos seus créditos laborais, passasse a preferir requerer a insolvência da entidade patronal como forma privilegiada de ser pago, o que é a perversão completa do sistema.

  6. Considera o Recorrido que a única interpretação do art. 2º nº 8 do citado diploma compatível com a Diretiva é a de que o Fundo só assegura o pagamento dos créditos quando o pagamento lhe seja requerido até um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho salvo se tenha sido suspenso ou interrompido o prazo prescricional do crédito, com a propositura da ação de insolvência ou instauração da competente ação laboral.

    Nestes termos e nos demais de direito, que V.ªs Exas. doutamente suprirão, deverá o Recurso interposto pelo FGS ser julgada improcedente, por não provado, e, em consequência, ser confirmado o Acórdão recorrido, com todos os efeitos legais, assim se fazendo a acostumada JUSTIÇA!».

  7. O presente recurso de revista foi admitido pelo Acórdão de 14/7/2022 (cfr. fls. 488/489 SITAF) proferido pela formação de apreciação preliminar deste STA, prevista no nº 6 do art. 150º do CPTA, designadamente nos seguintes termos: «(…) O tribunal de 1ª instância - TAF do Porto - julgou improcedente a acção e absolveu o FGS do pedido. Na linha da decisão administrativa, entendeu que à luz do «DL n° 59/2015, de 21.04» - novo regime do FGS -, quando o requerimento para pagamento foi apresentado ao FGS - 18.01.2007 - já tinha caducado o direito do requerente o poder fazer. Assim, todo o discurso jurídico da sentença parte do «pressuposto» da aplicação ao caso de norma inovatória - artigo 2°, n° 9, do novo regime do FGS, aditado pela Lei 71/2018, de 31.12, na sequência de «acórdãos do Tribunal constitucional» - onde se prevêem causas suspensivas do prazo disposto no artigo 20, n° 8, do regime jurídico em referência.

    O tribunal de 2ª instância - TCAN - concedeu provimento à apelação do FGS, revogou o assim decidido, e «julgou totalmente procedente a acção». Fê-lo por entender que «o pressuposto» em que laborou a decisão do tribunal de 1ª instância está errado, porque - a seu ver - não existe qualquer conexão temporal entre a norma inovatória e o caso dos autos. E, continua, não sendo esta norma aplicável ao caso concreto, temos que numa primeira aproximação o deveria ser a norma do artigo 2°, n° 8 - na redacção original do DL n° 59/2015, de 21.04 - que, todavia, foi declarada inconstitucional - embora, ainda, «sem força obrigatória geral» - pelo Tribunal Constitucional - acórdão n° 328/2018, de 27.06, e recente acórdão n° 374/2022, de 29.06 -, o que leva - sempre a seu ver - por repristinação - artigo 282°, n°1, da CRP - a retomar a solução legal consagrada no Regulamento do Código do Trabalho – aprovado pela Lei 35/2004, de 29.07, com a alteração da Lei 9/2006, de 20.03 -, e a aplicar, ao caso, o prazo geral de prescrição de 20 anos - previsto no artigo 309° do CC -, que estava longe de terminar.

    Agora é o FGS que discorda, e, imputando erro de julgamento de direito ao acórdão do tribunal de apelação, dele pede «revista».

    Estas questões relativas ao regime do FGS vêm sendo objecto de grande controvérsia, e objecto de múltiplas decisões jurisdicionais, mesmo dos tribunais superiores.

    No presente caso, porém, não é inteiramente líquida a bondade da decisão recorrida, nem a mesma se enquadra dentro de parâmetros decisórios já antes adoptados. Além disso, constata-se que o «acórdão recorrido» procedeu a uma construção jurídica algo rebuscada, fazendo operar a repristinação do anterior regime jurídico «em termos que não se mostram suficientemente convincentes», e saltando do regime da caducidade para o da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT