Acórdão nº 1127/17.5T9VFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 26 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelPAULA GUERREIRO
Data da Resolução26 de Outubro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. 1127/17.5T9VFR.P1 1. Relatório Por Acórdão depositado nos presentes autos em 3/05/2022 foi decidido: «a) condenar o arguido AA, como autor material de um crime de abuso de confiança agravado (€ 154.325,70), p.p. no art. 205.º, n.º 1 e 4 al. b) do CP, na pena parcelar de 3 (três) anos e 6 (meses) de prisão; b) condenar o arguido AA, como coautor material de um crime de abuso de confiança agravado (€ 120.000,00), p.p. no art. 205.º, n.º 1 e 4 al. b) do CP, na pena parcelar de 3 (três) anos e 2 (dois) meses de prisão; c) condenar o arguido AA, em cúmulo jurídico, pela prática dos dois crimes de abuso de confiança agravados identificados nas als. a) e b) supra, na pena única de 4 (quatro) e 10 (dez) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período; d) condenar a arguida BB, como coautora material de um crime de abuso de confiança agravado (€ 120.000,00), p.p. no art. 205.º, n.º 1 e 4 al. b) do CP, na pena de 2 (dois) e 10 (dez) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período; e) subordinar a suspensão da execução das penas aplicadas aos arguidos à obrigação dos mesmos entregarem à herança aberta por óbito de CC, na pessoa do(a) respectivo(a) cabeça de casal, a quantia de € 79.844,85, em três tranches, as primeiras duas de € 30.000,00 cada, até ao termo de cada um dos primeiros dois anos do período de suspensão da execução da pena e a terceira, no valor remanescente de € 19.844,15 até ao termo do período de suspensão da execução da pena aplicada à arguida BB (cf. art. 51.º, n.º 1 al. a) e 2 do CP); f) declarar perdida a vantagem patrimonial ilícita de € 154.325,70, condenando o arguido AA no pagamento deste montante ao Estado; g) declarar perdida a vantagem patrimonial ilícita de € 120.000,00, condenando os arguidos AA e BB solidariamente no pagamento deste montante ao Estado; h) ordenar a recolha de amostras de ADN ao arguido AA e a ulterior introdução dos resultantes perfis de ADN e dos correspondentes dados pessoais na base de dados de perfis de ADN, nos termos dos artigos 8.º, n.º 2 da Lei n.º 5/2008, de 12-02; i) condenar os arguidos no pagamento das custas penais e demais encargos do processo a que sua actividade tenha dado lugar, fixando a taxa de justiça em 5 UC para cada um deles (cf. art. 513.º e 514.º do CPP).» Inconformados com a decisão dela vieram interpor recurso conjunto os arguidos AA e BB.

Recorreu também a assistente DD.

(…) São, em síntese, os argumentos que se extraem das conclusões do recurso da assistente: A CRP consagra o direito à propriedade privada.

Entende a recorrente que tendo a decisão recorrida reconhecido a propriedade das quantias apossadas pelos arguidos como propriedade da herança, no valor global de 274 325,70 euros, não pode lançar mão do confisco, quando sabe quem é o proprietário ou legitimo dono desses montantes, impondo-se assim o reconhecer e ordenar a sua restituição.

A decisão recorrida reconhece a propriedade dos montantes apropriados mas não ordenou a restituição à cabeça de casal da herança.

A perda desses montantes é inconstitucional por violar o art. 62 da CRP.

As situações de declaração de perda das vantagens não se harmonizam quando estão em causa contra patrimónios privados.

Os fins de prevenção geral e de não cometimento de crimes pelos agentes, associado à declaração de perda de vantagens, visa salvaguardar e afirmar a ideia de que o crime não compensa, o que se atém aos casos de lesão de interesses ou direitos do Estado ou apropriação de bens ou vantagens de bens de terceiros, quando desconhecidos.

Reconhecida a propriedade da herança jacente, dos montantes tornados próprios pelos arguidos por abuso de confiança, impunha-se reconhecer a propriedade (como foi feito) e bem assim ordenar a sua restituição à proprietária dessas quantias, atento o direito Constitucional à Propriedade Privada, o direito de propriedade (art.1305 e 1308 do Código Civil) e direito de sequela.

Não pode ser confiscado dinheiro privado, licito, quando não há qualquer desvantagem patrimonial, ou outra, do Estado, havendo primazia no ressarcimento do ofendido, face à eventual declaração de perda das vantagens, se as houver.

No caso não há lugar à declaração de perda a favor do Estado, pois este não foi lesado, logo não pode lançar-se mão do confisco, ou “perda clássica”, em prejuízo da legitima proprietária.

O art. 111 nº 2 do Código Penal tem sempre subjacente e prevalente, defender os legítimos interesses e direitos de quem é proprietário e ofendido, tendo-se por ofendido como tais os titulares dos interesses que a lei especialmente quis proteger com a incriminação.

O Estado não pode confiscar os bens do lesado/ofendido...

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