Acórdão nº 1965/18.1T8VIS.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Novembro de 2022

Data09 Novembro 2022
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

PROC 1965/18.1T8VIS.C1.S1 6ª SECÇÃO ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I AA e BB, intentaram com processo comum contra BANCO BIC PORTUGUÊS, S A, pedindo a sua condenação no capital e juros vencidos e garantidos que, na data, perfaziam a quantia de € 57.000,00, bem como juros vincendos desde a citação e até integral pagamento ou, assim não se entendendo, seja declarado nulo qualquer eventual contrato de adesão que o Réu invoque para ter aplicado os € 50.000,00 que os Autores entregaram, em obrigações subordinadas SLN 2006, sendo declarada ineficaz em relação a si a aplicação que o Réu tenha feito desse montante, condenando-se o Réu a restituir-lhes a quantia de € 57.000,00, que ainda não receberam, dos montantes que lhe entregaram e de juros vencidos à taxa contratada, acrescidos de juros legais vincendos, desde a data da citação até integral cumprimento, condenando-se ainda o Réu a satisfazer-lhes a quantia de € 3.000,00, a título de dano não patrimonial.

Alegaram para o efeito: - eram clientes do Réu (BPN), na sua agência de ..., com conta bancária à ordem, sendo que em 8 de Maio de 2006 o gerente daquela agência disse ao Autor marido que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, com capital garantido pelo BPN e com rentabilidade assegurada; - esse funcionário do banco Réu sabia que o Autor marido não possuía qualificação ou formação técnica que lhe permitisse, à data, conhecer os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente, com perfil conservador pois que até essa data, sempre o aplicou em depósitos a prazo; - foi assim que € 50.000,00 da sua titularidade foram colocados em obrigações SLN 2006, sem que os Autores soubessem em concreto o que era, desconhecendo inclusivamente que a SLN era uma empresa; - o que motivou a sua autorização foi o facto de lhes ter sido dito pelo gerente que o capital era garantido pelo banco éu., com juros semestrais e que poderiam levantar o capital e respetivos juros quando assim o entendessem, bastando avisar a agência com a antecedência de três dias; - apenas o fizeram por o Autor marido estar convicto de colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as caraterísticas de um depósito a prazo, por isso, num produto com risco exclusivamente do banco, já que, se tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações SLN 2006, produto de risco, e que o capital não era garantido pelo BPN, não o autorizaria, nunca tendo sido sua intenção investir em produtos de risco, como era do conhecimento do gerente e funcionários do R., e sempre estiveram convencidos que o R. lhes restituiria o capital e os juros, quando os solicitassem; - o Réu sempre assegurou que a aplicação em causa tinha a mesma garantia de um depósito a prazo, sendo que os juros foram pagos até novembro de 2015; - o Autor marido assinou um documento (ordem de subscrição) sem perceber em concreto que ordem estava a dar, documento esse que nenhuma explicação transmite do produto financeiro em causa e nunca qualquer contrato lhes foi lido nem explicado, nem entregue cópia que contivesse cláusulas sobre obrigações subordinadas SLN, nem que contivesse prazos de resolução unilateral pelos Autores, sendo nulo o negócio; - por efeito do incumprimento do Réu, ficaram impedidos de usar o seu dinheiro, o que os levou a um permanente estado de preocupação e ansiedade, tristeza e dificuldades financeiras.

O Réu contestou, excepcionando, a prescrição do crédito dos Autores e, no mais, impugnou a factualidade invocada por estes, concluindo pela improcedência da acção.

Os AAutores, no exercício do contraditório, vieram pugnar pela improcedência da matéria de excepção.

Proferido despacho saneador, foi relegado para final o conhecimento da excepcção de prescrição.

Foi produzida sentença a julgar parcialmente procedente a acção com a condenação do Réu a pagar aos Autores a quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), acrescida dos respectivos juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, contados desde o dia 8 de Maio de 2016 até efectivo e integral pagamento.

Inconformado, recorreu o Réu de Apelação, a qual veio a ser julgada improcedente, com a manutenção da sentença recorrida.

Irresignado, veio o Réu recorrer de Revista excepcional, a qual foi admitida pela Formação, apresentando o seguinte acervo conclusivo: «[1.] O douto acórdão da Relação de Coimbra violou e fez errada aplicação e interpretação do disposto nos arts. 7º, 290º nº 1 alínea a), 304º-A e 312º a 314º-D e 323º a 323º-D e 327º do CdVM e 4º, 12º, 17º e 19º do D.L. 69/2004 de 25/02 e da Directiva 2004/39/CE e 364º, 483º e ss., 563º, 628º e 798º e ss. do C.C.

2. Entende ainda a Recorrente que a Relação de Coimbra deveria ter analisado a impugnação da matéria de facto à luz da rectif‌icação requerida através do requerimento apresentado pela Recorrente em 18.10.2019 com a referência ciJus ...31.

3. Ao não o fazer incorreu o Tribunal recorrido na nulidade prevista no artigo 615º, nº 1, alínea d) do Código de Processo Civil.

4. A putativa desconformidade entre o comportamento exigido ao Réu e o seu comportamento verif‌icado tem que ver com o facto do Tribunal considerar que, a circunstância do funcionário do Banco Réu ter assegurado ao Autor (conforme ele próprio estava convencido) que a aplicação f‌inanceira era um produto sem risco e com capital garantido, similar a um depósito a prazo, não transmitindo a característica da subordinação ou a possibilidade de insolvência da emitente, conf‌igura a prestação de uma informação falsa.

5. Porém, tal realidade não conf‌igura qualquer violação do dever de informação por prestação de informação falsa.

6. Não adianta aliás o douto Acórdão qual o risco que associa às Obrigações SLN e que entende deveria ter sido informado ao A., sendo que não podemos deixar de entender que se refere ao verif‌icado incumprimento do reembolso… 7. O único risco que percebemos existir na emissão obrigacionista em causa é exactamente o relativo ao cumprimento da obrigação de reembolso.

8. Este risco corresponde ao incumprimento da prestação principal da entidade emitente! Ou seja, corresponde ao chamado RISCO GERAL DE INCUMPRIMENTO! 9. A possibilidade deste incumprimento não corresponde a qualquer especial risco inerente ao modo de funcionamento endógeno do instrumento f‌inanceiro... antes corresponde ao normal e universal risco comum a todos, repete-se... a todos, os contratos! 10. Do incumprimento da obrigação de reembolso da entidade emitente, em 2014, não podemos, sem mais, retirar que esse o risco dessa eventualidade fosse relevante – sequer concebível, à excepção de ser uma mera hipótese académica -, em 2004, dez anos antes! 11. A SLN era titular de 100% do capital social do Banco-R., exercendo, por isso o domínio total sobre este.

12. O risco associado ao reembolso das Obrigações correspondia, então ao risco de solvabilidade da SLN.

13. E sendo esta totalmente dominante do Banco-R., então este risco de solvência, corresponderia, grosso modo, ao risco de solvabilidade do próprio Banco! 14. A segurança da subscrição de Obrigações emitidas pela SLN seria correspondente à segurança de um Depósito a Prazo no BPN.

15. O risco BPN ou risco SLN, da perspectiva da insolvência era também equivalente! 16. A única diferença consistiu no facto do Banco ter sido resgatado através da sua nacionalização, numa decisão puramente política e alicerçada num regime aprovado propositadamente para atender a essa situação e não em qualquer quadro legal previamente estabelecido.

17. A menção do dito risco praticamente inexistente, como de resto do capital garantido, não pode senão ser entendida no contexto da atribuição de uma segurança acima da média ao produto, de conf‌iança no normal cumprimento de todas as obrigações da emitente, sustentada em factos e juízo objecJvamente razoáveis e previsíveis.

18. A menção à expressão capital garantido não tem por si só a virtualidade de atribuir qualquer desaparecimento de todo o risco de qualquer tipo de aplicação… 19. A expressão capital garantido mais não é do que a descrição de uma característica técnica do produto – corresponde à garantia de que o valor de reembolso, no vencimento, é feito pelo valor nominal do titulo e correspondente ao respectivo valor de subscrição! Ou seja, o valor do capital investido é garantido! 20. A este propósito o Plano de Formação Financeira em site do Conselho de Supervisores Portugueses – ...! descreve as características de produtos f‌inanceiros, entre os quais as Obrigações, e explica a garantia de capital, exactamente nos termos que vimos de expor.

21. Ainda que se entenda que esta expressão mereceria uma densif‌icação ou explicação aos clientes, a f‌im de evitar qualquer confusão, o certo é que, transmitindo uma característica técnica, não se poderá af‌irmar que o banco, ou os seus colaboradores agiram com culpa, e muito menos grave! 22. O Banco limitou-se a informar esta característica do produto, não sendo seu obrigações assegurar-se de que o cliente compreendeu a af‌irmação.

23. A interpretação das menções “sem risco” ou de “capital garantido” não é susceptível de ser feita apenas com recurso à impressão do destinatário, nos termos do previsto no artº 236º do CCiv. uma vez que esta disposição aplica-se, apenas e só, às declarações negociais.

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