Acórdão nº 00169/22.3BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução30 de Setembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: A Associação AA...

, veio interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, de 01.06.2022, pela qual foi julgada totalmente improcedente a providência cautelar deduzida contra o Fundo Ambiental e em que foram indicadas como Contra-Interessadas a Associação BB ... Industriais do Calçado, Componentes, Artigos de Pele e Sucedâneos, Laboratório CC ... Gestão Integrada da Floresta e do Fogo e Centro DD ... das Indústrias Têxtil e do Vestuário de Portugal, para a suspensão do acto administrativo praticado pelo Fundo Ambiental que aprovou a selecção final das candidaturas de consórcios submetidas no âmbito do Investimento TC-C12-i01 – Bio-economia Sustentável - N.º 01/C.../2021, e subsequente admissão provisória da Requerente no processo de concurso competitivo, com as devidas e legais consequências.

Invocou para tanto, em síntese, que a decisão recorrida padece de nulidade derivada de nulidade processual, por violação do disposto nos artigos 3.º, n.º 3 e 195.º, ambos do Código do Processo Civil, aplicável ex vi artigo 1.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, e incorreu em erro de julgamento de Direito, por errónea interpretação e aplicação do disposto nos artigos 118.º e 132.º, n.º 4, ambos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

O Fundo Ambiental e as Contra-Interessadas Associação BB ... Laboratório CC ...

apresentaram contra-alegações autónomas, todas a sustentarem a improcedência do recurso.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.

* Cumpre decidir já que nada a tal obsta.

* São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: A. O presente recurso tem por objecto o despacho saneador-sentença, proferido em 01.06.2022, o Tribunal a quo, dispensando a realização de qualquer diligência de produção de prova, julgou improcedente o processo cautelar e, em consequência, absolveu o Recorrido e os Contrainteressados dos pedidos formulados.

  1. Contudo, não pode a Recorrente concordar com o sentido, nem com os fundamentos, da referida decisão, porquanto, no seu entender, a mesma enferma: I. De nulidade processual por violação do disposto nos artigos 3.º, n.º 3 e 195.º, ambos do Código do Processo Civil, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA; II. Erro de julgamento de Direito, por errónea interpretação e aplicação do disposto nos artigos 118.º e 132.º, n.º 4, ambos do CPTA.

    Vejamos então quais são as razões da discordância e que dão mote ao presente recurso.

  2. O Tribunal recorrido, sem prévia notificação das partes, e no próprio relatório do despacho saneador-sentença, dispensou a realização da produção da prova testemunhal, por considerar que “não se considera útil ordenar quaisquer diligências de prova, por desnecessária para o apuramento da verdade e conhecimento do mérito. Assim, indefere-se a produção da prova testemunhal requerida pelas partes (cf. artigo 118º, nº 5 do CPTA, ex vi artigo 132º, nº 1 do mesmo diploma legal)”.

  3. Ora, mesmo no âmbito da lide cautelar, antes de decidir pela (des)necessidade da produção de prova testemunhal, deveria o Tribunal a quo ter notificado as partes para se pronunciar sobre os concretos factos, por referências aos artigos dos respectivos articulados, pretendiam fazer prova através da inquirição das testemunhas arroladas.

  4. Só nessa hipótese se evitaria uma “verdadeira decisão surpresa”, que compromete, irremediavelmente, o princípio do contraditório, consagrado no n.º 3 do artigo 3.º do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA. Com efeito, só após tal pronúncia das partes, é que o Tribunal recorrido poderia decidir – se fosse esse o caso, o que desde já não se concede - pela rejeição do referido meio probatório.

  5. O que, in casu, não sucedeu, configurando uma decisão-surpresa e, por conseguinte, violadora do artigo 195.º do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA e do princípio do contraditório, previsto no artigo 3.º, n. º 3 daquele diploma legal, e conducente à nulidade da sentença.

  6. In casu, a audiência das testemunhas arroladas em sede de requerimento inicial afigurava-se fulcral para a boa sorte dos autos, nomeadamente na demonstração dos interesses (públicos e privados) que deveriam ter sido atendidos pelo Tribunal a quo.

  7. Não existem assim dúvidas de que a sentença recorrida configura uma decisão surpresa, em franca violação do princípio do contraditório prescrito no n.º 3 do artigo 3.º do Código de Processo Civil aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA, porquanto não tiveram as partes oportunidade de conhecer e de se pronunciar acerca da prova a produzir nos presentes autos cautelares e que o Tribunal a quo decidiu, sozinho, a sua desnecessidade e que determinou a sorte da acção cautelar.

    I. Pelo exposto, deverá a sentença ser declarada nula, por via do artigo 195.º do Código de Processo Civil ex vi artigo 1.º do CPTA e da violação do princípio do contraditório (artigo 3º, nº 3 do mesmo diploma legal), e em virtude disso, ser revogada pelo Tribunal ad quem, ordenando-se a baixa dos autos para aí ser proferido novo despacho que determine a notificação das partes para se pronunciarem acerca eventual desnecessidade de produção de prova testemunhal.

    Sem prescindir, J. Em sede de requerimento inicial, no que importa aos prejuízos que poderão resultar para a Recorrente do não decretamento da providência cautelar, a mesma alegou, além do mais, o desenvolvimento nos últimos 5 (cinco) anos de diversos esforços e acções relevantes para a sustentabilidade e resiliência do sector da resina e do Pinheiro Bravo em Portugal. Em concreto, a existência de inúmeras capacidades no campo da silvicultura e da transformação da resina, bem como na articulação de outros setores, que são de extrema importância para a valorização da resina e evolução da actividade económica de exploração desta matéria nacional. Mais alegou que, nos últimos onze anos, tem desenvolvido vários projectos em áreas estratégicas sobre as quais versa o investimento TC-C12-i01 – Bioeconomia Sustentável n.º 01/C .../2021, nomeadamente um projecto com vista à criação de pinheiros mais resistentes à seca.

  8. Para corroborar tais factos, a Recorrente arrolou 4 (quatro) testemunhas que tinham (e têm) conhecimento direto e inequívoco sobre os referidos factos e, ainda, da implicação – no que importa à existência de eventuais prejuízos e danos - que a não selecção da sua candidatura no procedimento concursal em crise poderá provocar face aos investimentos realizados, bem como os lucros que deixará de auferir e que, irremediavelmente, comprometem o crescimento e potencial económico de todas as entidades do consórcio denominado “Consórcio E1”.

    L. Ora, pelos argumentos expendidos, facilmente se demonstra que o Tribunal a quo rejeitou um meio de prova que seria indispensável para a boa decisão da causa, porquanto a prova de tais factos não se encontra, em toda a sua plenitude, assente em qualquer documento junto aos presentes autos.

  9. Além disso, o despacho objecto do presente recurso não se mostra devidamente fundamentado, sendo meramente genérico e conclusivo, apenas referindo que os autos possuem todos os elementos necessários para decidir do objeto em litígio.

  10. Pelo exposto, o despacho recorrido enferma de erro de julgamento, por violação do disposto no artigo 118.º, n.º 5 do CPTA, devendo, em virtude disso, ser revogado pelo Tribunal ad quem, ordenando-se a baixa dos autos para aí ser proferido novo despacho que admita a prova testemunhal requerida ou, caso assim não se entenda, o que de alguma forma se concede, a indefira fundamentadamente.

    Sopesa ainda que, O. É convicção da Recorrente que o Tribunal a quo, na ponderação levada a cabo nos termos do disposto no artigo 132.º, n.º 4 do CPTA, não atendeu, ainda que de forma perfunctória e sumária, aos vícios assacados ao acto suspendendo e que, irremediavelmente, comprometem a sua validade, P. Ou seja, na ponderação de interesses a que se reporta o n.º 4 do artigo 132.º do CPTA, o Tribunal não atendeu ao inegociável princípio da legalidade, Q. Bem como à alegação da Recorrente que demonstra os prejuízos e danos (públicos e privados) que poderão advir pelo não decretamento das providências ora requeridas.

  11. Com efeito, caso venha a soçobrar o invocado erro de julgamento do disposto no artigo 118.º, n.º 5 do CPTA, sempre se refira que, como alegado nos artigos 178.º a 183.º do requerimento inicial e o documento n.º 2 junto com o referido articulado, a Recorrente alega factos suscetíveis de configurar prejuízos e danos da não concessão da...

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