Acórdão nº 2593/18.7T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 27 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelALBERTINA PEDROSO
Data da Resolução27 de Outubro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 2593/18.7T8PTM.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Faro[1] *****Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]: I – RELATÓRIO 1. AA e mulher, BB, instauram a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra a sociedade comercial Lida, Ld.ª, CC, e marido, DD, pedindo que os réus fossem solidariamente condenados: «a) A demolir a construção/arrecadação que edificaram no lugar de estacionamento n.º 42 da sub-cave do prédio urbano identificado no artigo 1º desta petição, repondo-o no exacto estado em que se encontrava anteriormente; b) A realizar essa obra no prazo máximo de 15 dias, devendo ser condenados a pagar a quantia de € 100,00 por cada dia de atraso na execução dos trabalhos, quantia essa que deverá ser fixada a título de sanção pecuniária compulsória, nos termos do disposto no artº 829º-A do C.C.; c) A pagar aos AA. a título de indemnização pelos prejuízos não patrimoniais, a quantia de € 3 000,00, acrescido de juros legais a partir da citação; d) A pagar aos AA. todas as despesas em que estes incorrerem por virtude da conduta dos RR., designadamente a título de custas judiciais e honorários de advogado, quantias a liquidar em execução de sentença.

Subsidiariamente, para o caso de improceder o pedido formulado em a), a demolir a parede que edificaram entre os lugares de estacionamento nºs 42 e 43 da sub-cave do prédio urbano identificado no artigo 1º desta petição», e a serem condenados nos demais pedidos formulados.

Em fundamento das deduzidas pretensões, alegaram, em síntese, que são donos e legítimos possuidores da fração autónoma designada pela letra “L”, correspondente ao apartamento C, do 1.º andar do prédio urbano que identificaram, sendo a ré sociedade, por sua vez, dona e legítima possuidora da fração autónoma designada pelas letras “AE”, correspondente ao apartamento “E” do 4.º andar do mesmo prédio, correspondendo à sua fração o uso exclusivo do lugar de estacionamento com o n.º 43 e à fração da 1.ª ré o uso dos lugares nºs 40, 41 e 42, todos situados no piso -2 (subcave), sendo os lugares n.ºs 43 e 42 contíguos e achando-se delimitados por uma linha traçada no piso.

Sucede que, entre dezembro de 2016 e fevereiro de 2017, a 1.ª Ré transformou o lugar de estacionamento n.º 42 num espaço fechado, que é utilizado como arrumos, tendo para o efeito edificado duas paredes em alvenaria, uma das quais em cima da linha divisória que separa os lugares n.ºs 43 e 42, entre dois pilares existentes nas suas extremidades.

Mais invocaram que a referida edificação foi feita sem a aprovação dos condóminos e prejudica a utilização do estacionamento dos autores, o qual tem apenas 2,38 m de largura entre os espaços que os delimitam, pelo que, apenas a circunstância de tais espaços de estacionamento configurarem espaços abertos permite a abertura das portas do veículo estacionado, com a necessária ultrapassagem das linhas divisórias. Contudo, isso deixou de ser possível do lado em que o lugar n.º 43.º confina com o lugar n.º 42.

Alegaram ainda que tal construção impossibilita o condutor caso estacione de frente de entrar e sair e obriga todos os ocupantes a sair pelo lado direito do automóvel, e/ou pelo lado esquerdo, se o veículo for estacionado de marcha atrás e se estiver parqueado no n.º 44 um outro veículo que esteja um pouco mais junto à linha divisória, caso em que os ocupantes da viatura que seja estacionada no lugar n.º 43, terão de sair e entrar pelo porta-bagagens.

Finalmente, aduziram que desde o ano de 2017 a forma como podem utilizar o estacionamento está condicionada, e caso estacionem de marcha atrás têm que fazer manobras acrescidas para direcionar o veículo, sentindo-se vexados perante os vizinhos que assistem às inúmeras manobras que fazem para estacionar o veículo.

  1. Regularmente citados, os réus contestaram, por exceção, invocando a ilegitimidade do réu, por não ser entre dezembro de 2016 e fevereiro de 2017 representante da ré sociedade, e também dos autores, uma vez que, por estar em causa partes comuns, deveria o condomínio ter-se coligado com estes; e, por impugnação motivada, aduzindo essencialmente que os AA., à custa de causarem transtorno aos RR., pretendem livrar-se do incómodo da exiguidade dos espaços de estacionamento, que não lhes causa mais transtorno e incómodo que a qualquer outro condómino, independentemente de haver ou não paredes construídas.

  2. Os Autores exerceram o contraditório, pugnando pela improcedência das exceções deduzidas, e requerendo que, se assim não se entendesse, fossem convidados em sede de despacho pré-saneador a providenciarem pelo seu suprimento.

  3. Em 22.10.2019 foi proferido despacho pré-saneador que fixou à causa o valor de 30.000,01€, e concluindo pela ilegitimidade processual (ativa ou passiva) em face da ausência da demanda do condomínio, convidou os autores a provocar a sua intervenção, sob pena de absolvição dos demandados da instância, convite esse ao qual aqueles acederam, requerendo a intervenção do Condomínio.

  4. Por despacho datado de 04.02.2020, foi admitida a intervenção do Condomínio do referido prédio, o qual, após ter sido citado, declarou fazer seus os articulados dos autores, tendo no despacho saneador proferido em 14.07.2020, sido admitido “a assumir a qualidade de autor, com exclusão dos pedidos c) e g)”, ou seja, quanto às pretensões indemnizatórias referentes ao ressarcimento de danos morais que a julgadora considerou serem restritos aos autores iniciais.

  5. Com a concordância das partes, foi dispensada a realização de audiência prévia, tendo no referido despacho saneador sido fixado o objeto do litígio, e dispensada a indicação dos temas da prova, que na sentença vieram a ser elencados nos seguintes termos: “a) se a ré realizou obra ilegal por, não ter sido autorizada pelos condóminos e que viola o direito dos demandados de usar o local de estacionamento que se encontra afeto à sua fração e se deve ser condenada a demolir tal obra que edificou; b) se existe fundamento legal que autorize a fixação da a sanção pecuniária compulsória; c) se os autores sofreram danos indemnizáveis e se a sociedade demandada deve ser condenada a ressarci-los.”.

  6. Realizada a audiência final, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo: “1) declaro os réus CC e marido DD, parte ilegítima e, em consequência, absolvo-os da instância. (artigos 578.º, 576.º, nº 2 e 278.º, alínea d), todos do CPC); 2) julgo a ação parcialmente procedente, e, em face disso condeno a ré “Lida, limitada” a demolir integralmente, no prazo de 30 (trinta) dias, a garagem/ construção que edificou no lugar de estacionamento n.º 42, absolvendo a referida demandada do que demais foi peticionado pelos autores.

    Condeno os autores e a ré sociedade no pagamento das custas do processo na proporção do respetivo decaimento (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil), fixando o decaimento dos primeiros em 15% e da sociedade ré em 85%.”.

  7. Inconformada, a Ré apelou, formulando as seguintes conclusões: «A) O lugar de estacionamento dos AA. é exíguo desde sempre; B) A área do lugar de estacionamento dos AA. é exactamente a mesma que era, antes e depois da parede erigida pela R; C) A “oneração” do lugar de estacionamento dos AA. ocorre pela própria construção do edifício, pelo que estes deveriam ter bem reflectido quando o adquiriram; D) Bem sabendo que lá nunca conseguiriam estacionar um veículo de dimensão acima da média, por ex., tipo “SUV”; E) O que deveria ter sido dado como provado, era que os AA. tentaram aproveitar a construção da parede pela R. para adquirirem mais espaço de estacionamento para si; F) Para conseguirem estacionar com mais conforto; G) E para disfarçarem a sua imperícia; H) Não se importando de, para adquirirem essas vantagens, que fossem obtidas à custa do espaço de estacionamento da R.; I) O que causa embaraço aos AA., não é o espaço de estacionamento da R. ser fechado, mas sim de o ser junto à linha divisória; J) Fora a parede erigida mais para o interior do estacionamento da R., e já os AA. não se importariam porque o seu lugar fora aumentado à custa do lugar do vizinho… K) Face à prova produzida, sobretudo a prova por inspecção judicial, procedendo-se à sua análise crítica e ponderação segundo as regras da experiência comum, devendo acrescentar-se ou modificar-se que a questão a dirimir é se é a parede erigida pela R. que restringe o uso pelos AA. do seu lugar de garagem ou se, outrossim, as dificuldades, a existirem, advêm da configuração do L) espaço mormente pela existência do pilar à entrada do seu lugar de estacionamento e da própria configuração da garagem que obrigará a mais manobras para estacionar, independentemente de haver ou não parede erigida; M) Sendo, pois, nula a douta sentença recorrida, por não se pronunciar quanto à existência das dificuldades de manobra com ou sem parede, sendo esse facto essencial para a boa decisão da causa, do qual, por isso se impunha o respectivo conhecimento; N) Por mero dever de patrocínio, em caso de improcedência do presente recurso, deverão os AA. suportar as custas, visto terem todos os seus pedidos julgados improcedentes, à excepção do pedido de demolição da parede.

    Nestes termos e nos demais de Direito, deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando a douta sentença que condenou a R. a demolir a parede construída e, em consequência, ser produzido acórdão, absolvendo a R. do pedido».

  8. Os Autores apresentaram contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso.

  9. Observados os vistos, cumpre decidir.

    *****II. O objeto do recurso.

    Com base nas disposições conjugadas dos artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º, e 663.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil[3], é pacífico que o objeto do recurso se limita pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos produzidos nas conclusões do recurso, mas apenas as...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT