Acórdão nº 137/17.7TXEVR-M.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25 de Outubro de 2022
Magistrado Responsável | ARTUR VARGUES |
Data da Resolução | 25 de Outubro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO 1. Nos presentes autos com o nº 137/17.7TXEVR-M, do Tribunal de Execução das Penas de … – Juízo de Execução das Penas de … – Juiz …, foi ao condenado AA, por decisão de 30/08/2022, revogado o regime de permanência na habitação aplicado e determinada a continuação do cumprimento da pena de prisão em que foi condenado no Proc. nº …, do Juízo Local Criminal de … -Tribunal da Comarca de …, de forma contínua e em meio prisional
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O condenado não se conformou com a decisão e dela interpôs recurso, tendo extraído da motivação as seguintes conclusões (transcrição): A) A douta decisão que revoga o regime de permanência na habitação e determina a continuação do cumprimento da pena de prisão em meio prisional é ilegal porquanto ordena que sejam emitidos mandados de prisão do condenado a cumprir de imediato, o que implicou que o condenado fosse detido antes de decorrido o prazo de trânsito em julgado, no dia de hoje 07-09-2022, no momento em que foi notificado da decisão de revogação pela GNR de …
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Ora o CEPMPL dispõe no seu artigo 186 nº 3 que o Recurso tem efeito suspensivo, motivo pelo qual o condenado nunca poderá ser detido para condução ao EP sem ter decorrido o prazo do trânsito em julgado da decisão, o qual é de 10 dias nos termos do artigo 151º do CEPMPL, iniciando-se a sua contagem com a notificação da decisão ao condenado, ou seja, no dia de hoje 07-09-2022 e terminando em 19-09-2022
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Deste modo a decisão que ordena a imediata detenção do arguido é ilegal por violação do artigo 186 nº 3 e 151º do CEPMPL, sendo ilegal a sua detenção para condução imediata ao EP efectuada no dia de hoje
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Motivo pelo qual deve o arguido ser imediatamente restituído à sua habitação e aí continuar a cumprir a sua pena até à decisão do presente Recurso
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A douta decisão proferida no âmbito do presente Apenso de incidente de incumprimento é ainda nula, assim como é nulo todo o processo e mesmo que assim não se considerasse, no entendimento do recorrente, o Tribunal a quo deveria ter proferido uma decisão diametralmente oposta, ou seja, no sentido de não ser aplicável o artigo 44 nº 2 al a) do Código Penal, não se revogando o regime de execução da pena em regime de permanência na habitação
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Inicia-se o Relatório da sentença de que se recorre afirmando que :“ Foi designada data para audição de condenado, a qual foi realizada conforme resulta do respectivo auto de audição. Por Despachos proferidos em 06-07-2022 e 21-07-2022 foi o condenado notificado para indicar os meios de prova a produzir nos presentes autos, não tendo indicado qualquer meio de prova” G) Sucede, porém, que tal não corresponde à realidade porquanto em 06-07-2022 nenhuma notificação foi dirigida ao arguido, apenas em 07-07-2022 foi dirigida ao arguido uma missiva com a ref. citius … de onde não consta qualquer notificação para indicação de meios de prova, somente constando a sua notificação para comparecer no Tribunal no dia 12-07-2022
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O condenado nunca foi notificado pessoalmente ao logo de todo o incidente de incumprimento para oferecer provas que entendesse convenientes, nos termos do artigo 185º nº 2 e 3 do CEPMPL que remetem para o os artigos 176 nº 2 do mesmo diploma
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Foi Exmo. Senhor Dr. BB que foi notificado a 06-07-2022 sob a ref. citius … para a audição do arguido e para os termos do artigo 185º nº 2 do CEPMPD, nomeadamente para oferecer as provas que julgasse convenientes sendo que nessa data o Exmo. Sr. Dr. BB já não representava o condenado, porquanto o aqui signatário já tinha junto aos autos Procuração Forense
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Ainda assim no dia no dia 12-07-2022, perante a ausência do Senhor Dr. BB que já não representava o condenado e perante a ausência do seu mandatário, aqui signatário, que não havia sido notificado para o efeito, o Tribunal a quo não se coibiu de ouvir o arguido, nomeando-lhe defensor
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Acresce que em 21-07-2022, o tribunal a quo proferiu o seguinte despacho de fls. e nessa sequência o mandatário aqui signatário sido notificado em 22-07-2022, por notificação com a ref. citius …, apenas da certidão da tramitação processual anterior, do auto de inquirição de recluso e da ata de inquirição de CC via webex, não tendo o condenado sido jamais notificado de tal despacho, conforme se constata da análise dos autos
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Ao contrário do que refere a sentença recorrida o condenado nunca foi notificado para apresentar qualquer meio de prova, mormente nas datas indicadas na sentença (06-07-2022 e 21-07-2022)
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Deste modo, todo o processo decorreu sem que o mandatário aqui signatário fosse notificado da abertura do incidente de incumprimento, da indicação dos factos em causa e da data e local designados para a audição e sem que o mandatário e o condenado fossem notificados para apresentar os seus meios de prova
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Tendo assim sido concomitantemente violado o direito ao contraditório do condenado
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Estamos assim perante uma nulidade insanável por violação do disposto no artigo 185º e nº 2 e 3 e 176 nº 2 do CEPMPD e 119º al.) do CPP, pois estamos perante actos a que a lei confere o estatuto de obrigatoriedade: P) Porquanto dispõe o artigo 185º do CEPMPD: “2 - O tribunal notifica a abertura do incidente ao Ministério Público, aos serviços de reinserção social e aos demais serviços ou entidades que intervenham na execução da liberdade condicional, ao condenado e seu defensor, com indicação dos factos em causa e da data e local designados para a audição, a qual ocorre num dos 10 dias posteriores
3 - À audição referida no número anterior aplicam-se, com as necessárias adaptações, as regras previstas para a audição de recluso no processo de concessão da liberdade condicional.” Q) Dispondo o artigo 176 º nº 2 aplicável ex vi 185 nº 2 CEPMPD: - O recluso pode oferecer as provas que julgar convenientes
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Pelo que consequentemente é nulo todo o incidente de incumprimento S) Ainda que assim não se considerasse, o que só por mera hipótese académica se admite, desde já se dirá que os factos dados como provados na sentença de que se recorre são insuficientes para que o Tribunal revogasse o regime de permanência na habitação aplicado ao condenado
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Fundamenta o tribunal a quo que “inexistem nos autos, nem o condenado o referiu no decurso da sua audição qualquer razão ou prova de que a versão apresentada pelos técnicos da DGRSP não corresponda à verdade”. Com o devido respeito que é muito não se compreende tal fundamentação do Tribunal à quo porquanto para além do condenado na sua audição ter assumido perante o tribunal que estava desagradado com os técnicos da DGRSP e que manifestou esse desagrado (não de forma insultuosa), referiu também os motivos desse desagrado, referindo que a DGRSP lhe telefona às duas e três da manhã para saberem onde ele esta, o que acha surreal (veja-se auto de audição de fls) U) O próprio técnico Reinserção Social inquirido Sr. CC, referiu que o condenado estava desagradado com a DGRSP, e que relatou factos que, segundo o próprio, o terão prejudicado, nomeadamente em termos de trabalho, e que imputa aos serviços de reinserção social nomeadamente relatou que o condenado diz que o Dr. DD é o responsável da perda do seu trabalho, que lhe terá ido dar certas informações. Não tendo o Tribunal a quo questionado este técnico sobre quais os factos concretos que lhe foram relatos pelo condenado e que o prejudicaram
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Salvo o devido respeito por opinião contrária, considerando o Tribunal que os factos que o arguido alega a seu favor careciam de prova, deveria o Tribunal à quo solicitar oficiosamente os registos telefónicos efetuados para casa do condenado pela DGRSP, os quais seriam de extrema importância para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa, tanto mais numa situação que in extremis poderia culminar com o condenado a cumprir prisão de forma contínua em meio prisional, como sucede
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Acresce que não tendo sido dada ao condenado a possibilidade de apresentar prova conforme supra já se explanou, o mesmo nunca poderia provar a sua versão dos factos
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Todavia desde já se dirá, com o devido respeito que, as medidas de vigilância a desenvolver pela DGRSP e previstas no Plano de reinserção social do condenado não podem contender com outros direitos fundamentais do mesmo, nomeadamente ao descanso, ao trabalho e à proteção dos seus dados pessoais. O facto de o plano prever: entrevistas e contactos telefónicos com o condenado, cuja frequência e regularidade serão estabelecidas em função das necessidades de apoio e vigilância reveladas ao longo da execução da pena e deslocações inopinadas ao local de trabalho ou outros que se mostrem necessários, contactos com familiares e/ou outros elementos significativos articulação com outras entidades onde eventualmente o arguido venha a deslocar-se articulação com entidades policiais, não dá direito à DGRSP de ligar reiteradamente para casa do arguido as 3 ou 4 horas da manhã, privando o mesmo do seu descanso, sem qualquer motivo que o justifique, porquanto nunca se demonstrou nos autos qualquer necessidade dessa vigilância a essa hora Y) Sendo que as deslocações inopinadas ao local de trabalho do arguido, são isso mesmo, deslocações e não contactos frequentes que expõe severamente o arguido e a sua vida privada e que conduzem no extremo ao seu despedimento, como sucedeu Z) O condenado não se opõe nem nunca se opôs (ao contrário do que refere a sentença recorrida), à vigilância nem aos contactos da DGRSP consigo ou com familiares, contudo os mesmos tem de respeitar o seu direito ao Descanso, à proteção de dados...
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