Acórdão nº 8273/22.1T8PRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 03 de Outubro de 2022

Data03 Outubro 2022
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação 8273/22.1T8PRT.P1 Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho do Porto Requerente: AA Requerida: M..., S.A.

_______ Nélson Fernandes (relator) Rita Romeira Teresa Sá Lopes Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto I - Relatório 1.

AA intentou procedimento cautelar comum contra M..., S.A., pedindo:

  1. A declaração da ilicitude da recusa da Requerida em atribuir à Requerente o horário de trabalho por esta solicitada, para poder apoiar e acompanhar a sua filha menor, em violação do regime da parentalidade artigos 56.º e 57.º do C.T.; b) A fixação, ainda que provisória, à Requerente do horário solicitado, sem qualquer penalização, assim permitindo a manutenção do vínculo contratual; c) A reposição dos valores retirados na retribuição de março e o novo desconto no mês de abril a ser processado em maio, bem como o pagamento do subsídio de alimentação por referência a todo o período dos meses de março e abril.

    Para tanto, alegou, em suma: que tem uma filha de 3 anos de idade e que solicitou à Requerida a atribuição de um horário flexível, que esta não lhe atribuiu, pese embora tenha sido emitido parecer da CITE à intenção da requerida na recusa de tal pedido; porque vem cumprindo o horário flexível que solicitou, a Requerida não aceita a prestação de trabalho em alguns dias em que esta se apresenta para trabalhar por entender que está de folga e considera como faltas injustificadas as suas ausências ao trabalho nos fins de semana, procedendo aos competentes descontos, auferindo a requerente salário de cerca de 2/3 do devido.

    Citada, a Requerida deduziu oposição, alegando, também em suma, que o horário pretendido não se enquadra no conceito de horário flexível, que não é viável a sua atribuição e, por outro lado, que a Requerente não invoca qualquer facto relevante sobre o qual se possa retirar a existência do periculum in mora e, quanto à reposição dos valores subtraídos à Requerente por força das suas ausências, que a mesma não consubstancia uma lesão grave e dificilmente reparável.

    Realizada a audiência, foi proferida decisão final, de cujo dispositivo consta: “Em face de todo o exposto, julgo parcialmente procedente a requerida providência cautelar e, em consequência: a) declaro a ilicitude da recusa da Requerida em atribuir à Requerente o horário de trabalho por este solicitada, para poder apoiar e acompanhar a sua filha menor, em violação do regime da parentalidade artigos 56.º e 57.º do C.T.; b) fixo provisoriamente à Requerente o horário por si solicitado que vem referido em C) dos factos provados, e c) no mais absolvo a requerido do pedido contra si formulado.

    Custas pela requerente (na proporção de 2/3) e pela requerida (na proporção de 1/3), estando esta isenta do seu pagamento – artigo 527.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.

    Notifique.” 2.

    Notificada apresentou a Requerida requerimento de interposição de recurso, finalizando as alegações com as conclusões seguintes: ……………………………… ……………………………… ……………………………… 2.1.

    Não constam dos autos contra-alegações 2.2.

    Fixado o valor do procedimento cautelar em €30.000,01, o recurso foi de seguida admitido em 1.ª Instância como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito devolutivo.

    1. Apresentados os autos à Exma. Desembargadora de turno, foi proferido despacho determinando, ao abrigo do nº 5 do art 617º do CPC, a baixa do processo ao tribunal recorrido para que fosse proferido o despacho previsto no nº1 do citado art 617º do CPC, vindo no seguimento, em 1.ª instância, a ser proferido despacho com o teor seguinte: “Afigura-se-nos não se verificar a nulidade prevista na alínea c) do artigo 615º do CPC, uma vez que o facto de não se verificar o requesito do periculum in mora relativamente ao pedido formulado na alínea c) do petitório, tal requesito está presente relativamente aos pedidos formulados em a) e b), pelo que o decretamento parcial da providência em nada contende com a argumentação expendida na sentença”.

      *Cumpre decidir: II- Questões a resolver Sendo, como é consabido, pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso (artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC – aplicável “ex vi” do artigo 87., n.º 1, do CPT –, integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões a decidir nesta sede: (1) invocada nulidade da decisão recorrida; (2) Dizendo de direito: saber se a decisão recorrida errou na aplicação do direito.

      *III- Fundamentação

      1. De facto O Tribunal a quo julgou indiciariamente provada a seguinte matéria: “A) A Requerente e a Requerida assinaram um contrato individual de trabalho em 16 de dezembro de 2016, por via do qual a 1ª se comprometeu-se a prestar as funções inerentes à actual categoria profissional de Operadora de 2.ª, na loja M1... na Rua ..., n.º ... – ... - ... - ... ... - Maia.

      2. No contrato de trabalho as partes estipularam que: - “O período de trabalho semanal é, em média de 40 horas, competindo ao Empregador a fixação e/ou alteração do horário de trabalho, bem como dos dias de descanso semanal”; - “O local de trabalho do colaborador será qualquer estabelecimento do Empregador no distrito de Porto, designadamente o estabelecimento sito em Rua ..., ..., ....

        O colaborador aceita a alteração do local de trabalho, por conveniência do serviço do Empregador, dentro dos concelhos limítrofes do distrito supra referido, manifestando desde já a sua concordância com a renovação automática e sucessiva por períodos de dois anos da presente disposição”.

      3. Em 4/11/2021 enviou a Requerente aos recursos humanos da Requerida um requerimento solicitando a atribuição de um horário com “início nunca antes das 06h00” e com termo “nunca depois das 17h30 de segunda a sexta-feira com isenção de prestação de trabalho aos sábados, domingos e feriados”.

      4. A Requerente tem uma filha, com idade 3 anos, que vive consigo.

      5. O companheiro da autora trabalha em regime de turnos rotativos.

      6. O pedido rececionado pela Requerida a 08/11/2021 obteve, em 29/11/2021, a resposta da Requerente comunicando a intenção de recusa na atribuição do horário de trabalho apresentado pela Requerente.

      7. A Requerente em 02/12/2021, apresentou a sua resposta à intenção de recusa por parte da Requerida na atribuição do horário supramencionado.

      8. Em 21/12/2021 a CITE remeteu à Requerente o Parecer aprovado, ao qual foi atribuído o n.º 698/CITE/2021, comunicando que o mesmo foi desfavorável a intenção de recusa da Requerida no que toca ao pedido de horário de trabalho solicitado pela Requerente.

      9. A Requerida também comunicou à Requerente o Parecer emitido pela CITE, através de ofício datado de 23/12/2021.

      10. A Requerente encontrava-se a cumprir o horário de trabalho solicitado, salvo no que respeita ao regime de folgas e feriados, desde 21/02/2022.

      11. A Requerida alocou a Requerente para trabalhar nos seguintes dias Fins-de semana e Feriados, o que a Requerente não fez: Março 2022 05/06 de março de 2022 – Fim de semana 12/13 de março de 2022 – Fim de semana 19 de março de 2022 – Fim de semana Abril 2022 02/03 de abril de 2022 – Fim de semana 09/10 de abril de 2022 – Fim de semana (Domingo/Feriado) 15/16 de abril de 2022 – Sexta-feira Santa Feriado/Sábado 25 de abril de 2022 – Feriado 30 de abril de 2022 – Sábado Maio 2022 01 de maio de 2022 - Domingo L) A requerente apresentou-se ao trabalho em todos os dias não cobertos pela flexibilidade por si requerida, tendo sido a Requerida a obstar à prestação efetiva de trabalho.

      12. A Requerente apresentou-se ao trabalho no dia 02/03/2022 (Quarta-feira), embora constasse no mapa de horários como dia de folga, não tendo a Requerida obstado a sua entrada ao serviço da Requerente, tendo esta trabalhado o dia completo.

      13. No mês de março, a Requerida no seu recibo, viu descontado o subsídio de alimentação e no mês de abril a requerida nada recebeu de subsídio de alimentação.

      14. No mês de abril, e por respeito ao mês de março, a requerida descontou à Requerente 48 horas, o correspondente a 6 dias de faltas - 5 dias de faltas injustificadas e 1 dia/8horas de assistência à família - no montante bruto de 207,70€.

      15. Nesse mesmo mês a Requerente, não fora o subsídio de férias, teria recebido líquido, a quantia de € 482,65 (€ 542,30 – 11% = € 59,64).

      16. A Requerente não tem meios nem a quem recorrer para deixar a filha menor.

      17. A afluência nos dias de feriado nas lojas da requerida é mais elevada do que nos dias de semana.

      18. A loja da requerida da ... tem cinco trabalhadores com horários de trabalho fixos, em virtude de pedidos de alteração do horário de trabalho.

      19. Os dias 20.03.2022 (domingo), 26.03.2022 (sábado), 27.03.2022 (domingo), 17.04.2022 (domingo), 23.04.2022 (sábado) e 24.04.2022 (domingo), foram dias de descanso semanal da Requerente.” Por sua vez, fez-se constar que “Não resultou, ainda que indiciariamente, provado: 1) A Requerida alocou a Requerente para trabalhar no dia 20/03.

        2) No dia 01 de março de 2022, dia de Carnaval (Terça-feira), foi atribuído à Requerente o horário das 07H00 às 17H00.

        3) Os dias concretos que a requerente se apresentou a trabalhar referidos em L).

        4) A loja da Requerida da ... tem 43 trabalhadores, 23 dos quais com filhos.

        *B) Discussão 1. Invocada nulidade da decisão Invoca a Recorrente, o que transpôs para as suas conclusões, a ocorrência da nulidade a que se alude na alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, pois que, diz, “o raciocínio do Tribunal apontou num sentido, no entanto a decisão, foi em sentido contrário”, para o que argumenta o seguinte: - O Tribunal considerou verificada a existência de periculum in mora quanto aos pedidos a) e b) do requerimento inicial, invocando os factos K), O), P) e Q, indiciariamente provados, mas, no entanto, entendeu que “[j]á quanto ao pedido formulado na al. c), atento o valor em causa, não se me afigura verificar-se o invocado periculum in mora, não se antevendo um qualquer prejuízo grave e dificilmente reparável que...

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