Acórdão nº 423/20.9T8BRR.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Outubro de 2022
Magistrado Responsável | DOMINGOS JOSÉ DE MORAIS |
Data da Resolução | 12 de Outubro de 2022 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 4.ª Secção Social Processo n.º 423/20.9T8BRR.L1.S1 Origem: Tribunal da Relação de Lisboa Recurso de revista excepcional Relator: Conselheiro Domingos Morais Adjuntos: Conselheiro Mário Belo Morgado Conselheiro Júlio Gomes Acordam os Juízes na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça I.
– Relatório 1.
- Lojas Primark Portugal – Exploração, Gestão e Administração de Espaços Comerciais, S.A.
intentou acção com processo comum contra AA, alegando, em síntese que contrariamente àquela que é a posição da CITE e aparentemente da Ré, a prestação de trabalho em regime de horário flexível prevista nos artigos 56.º e 57.º do CT apenas diz respeito aos limites diários, não abrangendo o descanso semanal.
Terminou, pedindo que seja “declarado que a Autora aceitou o pedido de trabalho em regime de flexibilidade de horário apresentado pela Ré e que, consequentemente, não tem esta direito a escolher os dias de descanso semanais devendo por isso trabalhar em qualquer dia da semana que a Autora indique”.
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- A Ré contestou, concluindo: “deve a presente acção ser julgada totalmente improcedente por não provada e, em consequência, ser elaborado pela autora, nos termos requeridos, o horário flexível à ré, de acordo com o previsto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 56° do Código do Trabalho, de modo a permitir o exercício do direito à conciliação da atividade profissional com a vida familiar consagrado na alínea b) do n.º 1 do artigo 59° da Constituição da República Portuguesa, e a promoção da conciliação da atividade profissional com a vida familiar e pessoal dos/as trabalhadores/as, nos termos previstos no n.“ 3 do artigo 127.° e da alínea b) do n.° 2 do artigo 212.º, ambos do Código do Trabalho.”.
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- Foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: “julga-se a presente acção procedente não tendo a Ré o direito a escolher os dias de descanso semanais devendo trabalhar em qualquer dia da semana que a Autora indique.”.
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- A Ré interpôs recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa decidido por acórdão de 30.06.2021: “negar provimento à apelação e confirmar a sentença apelada.”.
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- A Ré interpôs recurso de revista excecional, concluindo, em resumo: “entende a recorrente que, face à aplicação do regime de flexibilidade de horário e às circunstâncias de facto dadas como provadas, o descanso semanal estará incluído, nesse conceito normativo, até porque o pedido formulado pela recorrente, continua a deixar a determinação do concreto horário de trabalho a cumprir, na esfera da recorrida, permitindo, o específico horário requerido, observar os limites consagrados nos n.ºs 3 e 4 do artigo 56.º do Código do Trabalho e, assim, apesar do horário solicitado ter horas fixas de início e termo do período diário de trabalho e abranger os dias de folga, o mesmo não deixa de ser um horário de trabalho flexível de acordo com a definição legal, pois, trata-se de um horário que visa adequar os tempos laborais às exigências familiares da recorrente, em função dos seus filhos menores, um com onze anos e outra com um ano.”.
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- A Autora não contra-alegou.
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- Por Acórdão de 21.04.2022 na Formação prevista no artigo 672.º, n.º 3 do CPC, foi admitida a revista excepcional, por considerados verificados os requisitos do artigo 672.º, n.º 1, alíneas b) e c).
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- O Ministério Público emitiu parecer no sentido de ser concedida revista.
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- Cumprido o disposto no artigo 657.º, n.º 2, ex vi do artigo 679.º, ambos do CPC, cumpre apreciar e decidir.
II.
- Fundamentação 1. - De facto 1.1.
– As instâncias consideram provados e não provados os seguintes factos:
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Factos provados: Por acordo: 1. A Autora é uma sociedade comercial cujo objecto abrange a exploração, administração, gestão e desenvolvimento de espaços comerciais, bem como de todas as actividades com estes estabelecimentos relacionadas, nomeadamente o comércio, importação, distribuição e armazenagem de artigos não especificados, nomeadamente artigos para o lar, decoração, vestuário, calçado, artigos de uso e consumo pessoal e doméstico, produtos têxteis, electrodomésticos, equipamentos electrónicos, produtos alimentares, bebidas e tabaco, joalharia, ourivesaria, mobiliário, livros, papelaria, tabacaria, perfumes, produtos químicos e farmacêuticos, instrumentos musicais, bicicletas, veículos mecânicos de propulsão e actividades de restauração, hotelaria, decoração e cultura e lazer, transporte, exploração de teatros e cinemas, compra e venda, investimento e revenda de móveis e imóveis adquiridos para esse fim, consultoria para negócios e gestão, prestação de serviços, participação em outras sociedades com objecto análogo como forma do exercício de actividades económicas e tudo o mais que esteja relacionado ou seja conveniente para o desenvolvimento do objecto social aqui referido.
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Os estabelecimentos são caracterizados por terem uma área comercial ampla e situarem-se em centros comerciais, os quais estão em funcionamento durante os sete (7) dias de semana e com horário de abertura às 10:00 horas e encerramento entre as 23:00 e as 24:00 horas, todos os dias.
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Estando a Autora obrigada a manter as lojas abertas todos os dias e durante o horário de funcionamento dos respectivos centro comerciais, sob pena de lhe serem aplicadas penalizações comerciais em caso de incumprimento.
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Deste modo, a empresa realiza o seu objecto através da exploração de dez (10) lojas espalhadas por Portugal, a saber: A... (A...), ... (...), ... (...), ... (...), ... (...), ... (...), ... (...), ... (...), ... (...) e ... (...).
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A Autora e a Ré celebraram um contrato que apodaram de contrato de trabalho em 14 de junho de 2017, no qual a última se obrigou a prestar trabalho à primeira sob as suas ordens e direcção, contra o pagamento de uma retribuição mensal.
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No início do contrato a Ré foi contratada para exercer as funções de operadora de .... Funções que mantém actualmente.
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A descrição das funções desempenhadas pela Ré, consistem em fazer atendimento ao cliente, caixa e reposição.
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A Ré exerce actualmente funções na loja Primark sito no Centro Comercial ... com morada em Rua ..., A....
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No passado dia 11/11/2019 a Ré remeteu à Autora uma carta com o seguinte teor: “Eu, AA, portadora do cartão de cidadão n.º ..., colaboradora da empresa Primark situada no Centro Comercial ..., venho por este meio expor a minha situação actual a qual peço a vossa atenção. Acerca de 1 mês dirigi-me aos Recursos Humanos do meu local de trabalho a expor as minhas dificuldades e impossibilidades de conseguir conciliar a minha vida familiar com a profissional, fiz o pedido para puder ter as minhas folgas aos fins de semana, mas, foi recusado.
Tenho 2 filhos menores de 12 anos, o mais crescido com 10 anos e a mais nova com apenas 6 meses. O meu marido trabalha por turnos em semanas alternadas e fins de semana. A creche da minha filha funciona de 2.ª F a 6.ª F das 7horas às 18h30.
Por estes motivos que dou a conhecer venho solicitar a V. Exa a fixação das minhas folgas semanais rotativas para o sábado e domingo.
Agradeço a atenção dispensada para o me caso, …”.
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Com a missiva supra indicada, juntou ainda dois atestados da junta de freguesia ... e ..., uma declaração da Cresce e Jardim de Infância ... e uma declaração numerada como 22/2019 da Câmara Municipal ....
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A carta foi recepcionada no próprio dia.
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A Autora respondeu à Ré por carta entregue em mão em 18 de novembro de 2019.
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A resposta apresentava o seu seguinte teor: “Exma. Senhora, Em resposta à...
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