Acórdão nº 10463/21.5 T8LSB.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 06 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelTERESA SANDIÃES
Data da Resolução06 de Outubro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes da 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa FV, na qualidade de cabeça de casal da herança aberta por óbito de G, intentou a presente ação comum, contra a Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública - IGCP, E.P.E, tendo formulado os seguintes pedidos: “1)–Seja reconhecido sobre os certificados de aforro subscritos por G o direito ao seu resgate por parte da herança aberta por seu óbito.

2)–Seja a titularidade da conta de aforro, nomeadamente dos certificados de aforro aludidos na presente ação, transmitida para a herança aberta por óbito de G, dela passando a fazer parte integrante.

3)–E que seja a Ré condenada a pagar ao Autor, na qualidade de cabeça de casal da herança em causa, o valor correspondente ao resgate de todos os certificados de aforro titulados pelo de cujus, que atualmente se cifram no montante de €118.314,17 (cento e dezoito mil trezentos e catorze euros e dezassete cêntimos).

4)–Que seja também a Ré condenada a pagar ao Autor, na qualidade de cabeça de casal da herança em causa, o valor que se vier a apurar relativamente aos demais certificados de aforro titulados por este, cuja existência se venha a apurar no âmbito da presente ação, e cujo valor venha a ser liquidado em incidente de liquidação de sentença, ambos os valores acrescidos de juros remuneratórios e de mora até ao efetivo pagamento.

5)–Bem como ao pagamento de juros vincendos à taxa legal contados desde a citação até total e efetivo pagamento.” Alegou, em síntese, que no dia 29 de outubro de 2004, faleceu G, no estado civil de divorciado de R. Sucederam-lhe três filhos, FV, cabeça de casal e aqui autor, CV e AV, tendo sido habilitados como únicos herdeiros. Em meados do ano de 2019, enquanto arrumavam alguns pertences do pai, foram encontrados documentos referentes a três certificados de aforro da série B, emitidos nos anos de 1990, 1991 e 1992. O Autor, na qualidade de cabeça de casal, interpelou a Ré no sentido de obter o resgate no valor de € 118.314,17, o que não foi concedido por entenderem que os mesmos se encontram prescritos a favor do Fundo de Regularização da Dívida Pública desde 29/10/2014, ou seja, 10 anos após o óbito do titular.

A R. apresentou contestação por exceção e por impugnação. Arguiu a exceção de prescrição, dos certificados de aforro, uma vez que à data do pedido de resgate já tinha decorrido o prazo de 10 anos a partir do óbito do aforrista. Era do conhecimento dos herdeiros a existência de certificados de aforro, pelo menos, desde a movimentação de três certificados pela herdeira C, em 17/07/2007.

Conclui pela improcedência da ação ou, caso assim se não entenda, pela procedência da exceção perentória de prescrição e sua absolvição dos pedidos.

O A., notificado para responder à exceção, alegou que os únicos certificados de aforro conhecidos pelos herdeiros eram aqueles que foram resgatados em 2007 e em relação aos restantes apenas tomaram conhecimento da sua existência em 2019. Mais defendeu que a contagem do prazo de prescrição de 10 anos só se inicia quando os herdeiros têm conhecimento da existência de certificados de aforro no património do de cujus, o que apenas ocorreria em 2029.

Conclui pela improcedência da exceção.

Com dispensa de realização de audiência prévia foi proferido despacho saneador, delimitado o objeto do litígio, consignados os factos considerados assentes e formulado um tema de prova.

Após realização da audiência de julgamento foi proferida decisão com o seguinte dispositivo: “(…) julgo a presente ação procedente, por provada e, consequentemente, condeno a Ré AGÊNCIA DE GESTÃO DA TESOURARIA E DA DÍVIDA PÚBLICA - IGCP, E.P.E.

, a: 1)- Reconhecer sobre os certificados de aforro subscritos por G o direito ao seu resgate por parte da herança aberta por seu óbito; 2)- Transferir a titularidade da conta de aforro, nomeadamente dos certificados de aforro aludidos na presente ação, transmitida para a herança aberta por óbito de G, dela passando a fazer parte integrante; 3)- Pagar ao Autor, na qualidade de cabeça de casal da herança em causa, o valor correspondente ao resgate de todos os certificados de aforro titulados pelo de cujus, designadamente: - 0.......2, da Série B, adquirido no dia 30 de novembro de 1990, na quantidade de 2200 unidades, com o valor de aquisição de € 5.486,78 (cinco mil quatrocentos e oitenta e seis euros e setenta e oito cêntimos); - 0.......8, da Série B, adquirido no dia 15 de janeiro de 1991, na quantidade de 1300 unidades, com o valor de aquisição de € 3.242,19 (três mil duzentos e quarenta e dois euros e dezanove cêntimos) e - 0.......4, da Série B, adquirido no dia 28 de fevereiro de 1992, na quantidade de 1400 unidades, com o valor de aquisição de € 3.491,59 (três mil quatrocentos e noventa e um euros e cinquenta e nove cêntimos), acrescidos dos respetivos juros remuneratórios e de juros de mora vencidos, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.

Valor da Ação: € 118.314,17 (cento e dezoito mil trezentos e catorze euros e dezassete cêntimos).

Custas da Ação: a cargo da Ré.” A R. interpôs recurso desta decisão, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem: “1.

– O presente recurso vem interposto da sentença proferida em 29.04.2022 (ref.ª 415334983), nos termos da qual se julgou a presente ação procedente, por provada, e, em consequência, se condenou a Ré, ora Recorrente, a: “1)- Reconhecer sobre os certificados de aforro subscritos por G o direito ao seu resgate por parte da herança aberta por seu óbito; 2)- Transferir a titularidade da conta de aforro, nomeadamente dos certificados de aforro aludidos na presente ação, transmitida para a herança aberta por óbito de G, dela passando a fazer parte integrante; 3)- Pagar ao Autor, na qualidade de cabeça de casal da herança em causa, o valor correspondente ao resgate de todos os certificados de aforro titulados pelo de cujus, designadamente: - 0.......2, da Série B, adquirido no dia 30 de novembro de 1990, na qualidade de 2200 unidades, com o valor de aquisição de €5.486,78 (cinco mil quatrocentos e oitenta e seis euros e setenta e oito cêntimos); - 0.......8, da Série B, adquirido no dia 15 de janeiro de 1991, na quantidade de 1300 unidades, com o valor de aquisição de €3.242,19 (três mil duzentos e quarenta e dois euros e dezanove cêntimos) e - 0.......4, da Série B, adquirido no dia 28 de fevereiro de 1992, na quantidade de 1400 unidades, com o valor de aquisição de €3.491,59 (três mil quatrocentos e noventa e um euros e cinquenta e nove cêntimos), acrescidos dos respetivos juros remuneratórios e de juros de mora vencidos, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.” 2.

–O Tribunal “a quo” configurou a questão essencial para a decisão da presente lide como sendo a da apreciação da “eventual prescrição do direito do Autor, na qualidade de cabeça de casal da herança de G, ao reembolso dos certificados de aforro titulados por seu pai, exceção perentória oportunamente invocada pela Ré”.

  1. –De modo sumário, a Sentença Recorrida considerou “que o Autor e os demais herdeiros apenas tiveram conhecimento da existência dos certificados de aforro em apreço em meados de 2019, apenas nessa data se terá por iniciado o prazo de prescrição acima referido.” e que “Não é exigível que se exerça um direito que não se conhece, por isso, a Autora exerceu o seu direito antes do decurso do prazo de dez anos, pelo que o mesmo não estava prescrito.” 4.

    –Não pode a Recorrente conformar-se com tal decisão porquanto não concorda com a interpretação jurídica e solução de direito adotadas pelo Tribunal a quo, a qual, ademais, não logrou efetuar uma interpretação crítica e concertada da prova produzida e das próprias alegações das partes nos respetivos articulados.

  2. –Com efeito, por um lado, é entendimento da ora Recorrente que a Sentença Recorrida incorreu numa errada interpretação e aplicação do regime jurídico da prescrição especialmente previsto para os certificados de aforro in casu [nomeadamente, do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 172-B/86 de 30 de junho, na última redação dada pelo Decreto-Lei n.º 47/2008, de 13 de março (o “Regime dos Certificados de Aforro Série B”), e dos artigos 9.º e 306.º, n.º 1 do Código Civil (o “CC”), regras jurídicas estas que se mostram violadas].

    Por outro, é entendimento da Recorrente que a Sentença recorrida não logrou efetuar uma interpretação crítica da alegação e da prova produzida, fazendo tábua rasa do teor confessório da alegação do Autor em sede de articulados.

  3. –E, assim, sem prejuízo da análise detalhada que adiante se fará, mal andou a Sentença Recorrida, a qual deve ser revogada e substituída por outra que, fazendo uma correta interpretação e valoração jurídicas do prazo de prescrição previsto no artigo 7.º do Regime dos Certificados de Aforro Série B, e do caso concreto, considere que o momento do início da contagem daquele prazo nunca poderá ser o que foi considerado na Sentença de fls.

    VEJAMOS, 7.

    –O pedido formulado pelo Autor, aqui Recorrido, alicerça-se numa interpretação errada (idêntica à que vem sufragada na Sentença Recorrida) do regime da prescrição previsto especialmente para os certificados de aforro, em concreto, no que toca ao termo inicial do prazo de prescrição consagrado nos artigos 7.º do Regime dos Certificados de Aforro Série B, segundo a qual tal prazo se inicia com o conhecimento pelo herdeiro (neste caso, pelo Recorrido) da existência de certificados de aforro titulados pelo de cujos.

  4. –Contrariamente ao que entendeu o Tribunal a quo, a única interpretação admissível do artigo 7.º, n.º 1 do Regime dos Certificados de Aforro Série B é, efetivamente, aquela segundo a qual o prazo de prescrição de 10 (dez) anos se conta a partir da data do óbito do aforrista, tendo este prazo de prescrição um carácter eminentemente objetivo, cuja contagem é espoletada por um evento objetivo (neste...

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