Acórdão nº 21/13.3 BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 29 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelVITAL LOPES
Data da Resolução29 de Setembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL 1 – RELATÓRIO Autoridade Nacional de Comunicações (abreviadamente ANACOM) recorre da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por O…., SA (actualmente denominada N…. – C…., S.A.

), contra a taxa anual devida pelo exercício da actividade de fornecedor de redes e serviços, relativa ao ano de 2012, no valor de € 3.311.141,55, com fundamento em vícios de forma por preterição de audiência prévia e ainda carência da fundamentação, errónea qualificação e quantificação da matéria tributável e violação de normas e princípios constitucionais e do direito europeu.

A recorrente, Autoridade Nacional de Comunicações (abreviadamente ANACOM), termina as alegações formulando as seguintes e doutas Conclusões: «1.ª Devem ser corrigidos os factos considerados provados sob as alíneas M) e Q) do probatório, nos termos aduzidos no número 30 das presentes alegações; 2.ª Devem ser aditados ao probatório os factos indicados sob os nºs 32 a 37 das presentes alegações, relativos ao (i) apuramento dos proveitos relevantes, à (ii) revisão da liquidação e à emissão de notas de crédito, aos (iii) custos de regulação e ao financiamento da ANACOM, (iv) ao tratamento das provisões como gasto/custo administrativo de regulação (v) aos proveitos relevantes e (vi) aos benefícios da regulação, factos que são relevantes para a decisão da causa; 3.ª A questão dos custos administrativos de regulação não se confina à temática das provisões que, no ano em causa, representaram cerca de 21,7% dos custos totais repercutidos sobre as empresas que oferecem redes e serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público (€ 6.337.808 / € 29.108.637); 4.ª Embora uma provisão seja, por definição, constituída para salvaguardar riscos futuros e assente num juízo de probabilidade quanto a um eventual exfluxo de recursos baseada numa estimativa fiável da quantia da obrigação (cf. Norma Contabilística e de Relato Financeiro [NCR21, §13]) não deixa de ser um gasto, com impacto nas demonstrações financeiras da entidade, sendo fiscalmente dedutível e afetando os resultados do exercício; 5.ª A ANACOM não só tem a necessidade de constituir provisões, como tem que assegurar ex ante os respetivos meios de financiamento, o que só pode fazer através da taxa de regulação impugnada nos presentes autos; 6.ª Num sistema de autofinanciamento (associado à independência financeira da entidade reguladora) e de partilha dos custos da regulação entre os regulados, não se vê que outra alternativa existiria ao financiamento da responsabilidade emergente de atos praticados no exercício da atividade de regulação que não fosse a taxa de regulação; 7.ª O Tribunal a quo confunde os critérios de reconhecimento e mensuração de provisões, que se colocam ex ante (em sede de interpretação e aplicação da NCRF 21) com o impacto do seu efetivo reconhecimento e registo contabilístico, que se coloca ex post, quer em sede de balanço (conta 29), como um elemento do passivo, quer em sede demonstração de resultados (conta 67), como um gasto do exercício; 8.ª O gasto (custo) das provisões para processos judiciais em curso é relevado contabilisticamente na conta “673-Processos judiciais em curso”; 9.ª Não podem existir dúvidas de que as provisões para processos judicias em curso são aceites como gastos para efeitos fiscais e como tal são deduzidas na matéria coletável em IRC; 10.ª As provisões têm um tratamento contabilístico autónomo e distinto dos demais gastos, pois todas as naturezas de gastos são discerníveis entre si, com regras contabilísticas diferentes; 11.ª No caso das provisões, o seu registo contabilístico obedece a regras próprias, devidamente explicitadas na Norma Contabilística de Relato Financeiro 21 – Provisões, passivos contingentes e ativos contingentes (“NCRF 21”); 12.ª O Tribunal a quo confundiu (i) a questão do reconhecimento contabilístico das provisões para processos judiciais relacionados com a atividade de regulação do sector das comunicações eletrónicas como gasto ou custo administrativo da ANACOM, com (ii) a questão da sua elegibilidade para efeitos de apuramento dos encargos administrativos que podem ser impostos às empresas que oferecem redes e serviços de comunicações eletrónicas; 13.ª O conceito de contabilístico ou fiscal de gasto (ou custo) não exige um exfluxo financeiro atual ou presente de fundos (pagamento); 14.ª De um ponto de visa contabilístico e fiscal, não são apenas gastos [custos] aqueles que envolvam um exfluxo financeiro atual ou presente, isto é, aqueles que correspondam a despesas efetivamente incorridas, por importarem a mobilização de recursos financeiros; 15.ª De um ponto de vista contabilístico e fiscal, as provisões são um custo efetivo, ainda que assentem em gastos estimados. E são um custo real, porque o seu reconhecimento tem impacto financeiro nas contas da entidade que as constitui, afetando os resultados do exercício; 16.ª Uma vez identificado o risco de exfluxo de recursos, as normas contabilísticas obrigam à constituição de provisões, pelo que não é correta a asserção constante da p. 35 da sentença recorrida, segundo a qual as provisões seriam um mero ato e gestão prudente e, aparentemente, de mera constituição facultativa; 17.ª A elegibilidade das provisões para efeitos de apuramento dos encargos administrativos que podem ser impostos às empresas que oferecem redes e serviços de comunicações eletrónicas decorre, desde logo e em primeira linha, do referencial contabilístico aplicável à ANACOM e da utilização da respetiva contabilidade para efeitos de apuramento dos gastos [custos] administrativos de regulação do sector das comunicações eletrónicas; 18.ª O elenco de custos constante do artigo 12.º, n.º 1, alínea a) da Diretiva Autorização e do n.º 4 do artigo 105.º da LCE é meramente exemplificativo; 19.ª O TJUE já se pronunciou por duas vezes sobre a interpretação do artigo 12.º da Diretiva Autorização e, embora afirme a natureza limitada dos custos administrativos suscetíveis de cobertura pelas taxas de regulação (cf. considerandos 22, 23 e 27 do acórdão Telefónica proferido em 21 de julho de 2011 no processo C-284/10 e considerandos 36 e 38 a 42 do acórdão Vodafone Omnitel de 18 de julho de 2013, proferido nos processos apensos nºs C-228/12 a C-232/12 e C-254/12 a C-258/12) nunca se pronunciou explicitamente sobre a questão de saber se os custos com provisões se enquadram no conceito de custos administrativos relacionados com a adoção, gestão, controlo e aplicação do regime de autorizações gerais; 20.ª O TJUE afirmou claramente que os custos elegíveis para efeitos de financiamento através dos encargos administrativos a que se refere aquele artigo 12.º compreendem a totalidade dos custos resultantes das atividades mencionadas na alínea a) do n.º 1 daquela disposição de direito da União Europeia e não apenas uma parte (cf. considerandos 38, 41, 42 e 43 do acórdão de 18 de julho de 2013); 21.ª Se todas as atividades de regulação são suscetíveis de controlo jurisdicional (cf. artigo 4.º da Diretiva-Quadro e artigo 13.º da LCE) seria manifestamente absurdo considerar tais atividades elegíveis para efeitos de partilha dos custos administrativos da regulação entre operadores quando as mesmas se desenvolvem de modo normal, e já não as considerar elegíveis para efeitos de partilha dos custos administrativos da regulação entre operadores quando se desenvolvem de modo patológico, maxime se e quando a ANACOM fosse condenada a pagar indemnizações a terceiros por atos de regulação ilegais, sustentando que, nesses casos, deve ser a generalidade dos contribuintes a suportar tais custos; 22.ª Caso a ANACOM não possa repercutir nas taxas de regulação das comunicações eletrónicas, os custos com a constituição de provisões ligadas à regulação do sector, o efeito financeiro daí adveniente projetar-se-ia nos resultados que podem ser transferidos para o Estado; 23.ª Os resultados da ANACOM são uma consequência dos excedentes gerados pelas taxas de utilização do espectro radioelétrico (que são uma receita do Estado devida pela utilização do domínio público radioelétrico, que se encontra consignada à ANACOM e cujo excedente é entregue ao Estado); 24.ª A utilização dos excedentes gerados pelas taxas de utilização do espectro radioelétrico para financiar a constituição de provisões ligadas à atividade de regulação, equivaleria a transferir para outras fontes de financiamento custos que devem ser internalizados no âmbito da atividade de regulação (artigo 12.º da Diretiva Autorização e artigo 105.º, n.º 4 da LCE), implicando o regresso ao sistema anterior à Portaria n.º 1473-B/2008, em que a regulação era financiada pelo produto das taxas de utilização do espectro radioelétrico; 25.ª A exclusão das provisões da base dos gastos administrativos de regulação – como foi decidido pelo Tribunal a quo – não assegura uma correspondência integral entre os custos de regulação e a receita da taxa, pondo em causa o princípio da orientação para os custos, uma vez que todos os custos decorrentes de situações patológicas não seriam internalizados pelo sector, ficando a cargo do Estado, isto é, da generalidade dos contribuintes, quer através da mobilização das receitas da taxa de utilização do espectro radioelétrico, quer através de dotações orçamentais específicas; 26.ª A exclusão das provisões da base dos gastos administrativos de regulação não proporcionaria uma recuperação integral de todos os custos suportados com a regulação do sector, incluindo os custos decorrentes da impugnação de decisões da ARN ligadas à gestão, controlo e aplicação do regime de autorização geral.

27.ª A inclusão das provisões na base dos gastos administrativos de regulação é inerente aos objetivos e à teleologia dos encargos a que se refere o artigo 12.º da Diretiva Autorização, sob pena de não existir uma correspondência integral entre...

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