Acórdão nº 4703/21.8T8LRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelEM
Data da Resolução13 de Setembro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Processo n.º 4703/21.8T8LRA.C1 Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra AA e BB, residentes na Rua ..., ..., ..., recorreram ao processo especial de acordo de pagamento, a fim de estabelecerem negociações com os respectivos credores de modo a concluir com estes acordo de pagamento.

Para o efeito alegaram, em síntese, que se encontravam em dificuldades económicas para cumprir pontualmente as suas obrigações.

O requerimento foi recebido e nomeado administrador judicial provisório.

Findo o prazo das negociações, os devedores remeteram para o tribunal acordo de pagamento.

No decurso do prazo de votação do acordo, CC, credor constante da lista dos credores reconhecidos pelo administrador judicial, manifestou a sua oposição ao acordo de pagamento e solicitou a não homologação dele, por violação de regras procedimentais e, subsidiariamente, por violação do princípio da igualdade e, se necessário, com recurso ao instituo do abuso de direito ou ao instituto de fraude à lei.

Após a remessa ao tribunal do documento com o resultado da votação, a Meritíssima juíza do tribunal a quo recusou a homologação do acordo.

Os fundamentos da recusa foram em síntese os seguintes: Em primeiro lugar entendeu que o acordo não recolheu os votos favoráveis que exige o artigo 222.º-F, n.º 3, alíneas a) e b) do CIRE. Mais concretamente entendeu que o acordo recolheu apenas os votos favoráveis de credores que representavam 18,24% dos créditos reconhecidos. Esta conclusão assentou no entendimento de que não podiam ser considerados os votos favoráveis do Banco 1... e da Fazenda Nacional porque, nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 212.º, do CIRE, não conferiam direito de voto os créditos que não fossem modificados pela parte dispositiva do acordo e era de considerar, no caso, que tais créditos não foram modificados pelo acordo de pagamento.

Em segundo lugar entendeu que violava o princípio da igualdade dos credores, uma vez que tratava de forma manifestamente desproporcionada os créditos comuns em relação aos créditos garantidos, sem que houvesse para tal justificação suficiente e comprovada.

O recurso Os devedores não se conformaram com a decisão e interpuseram o presente recurso de apelação, pedindo se revogasse a decisão, se julgasse não verificada qualquer violação das regras procedimentais, nem violação do princípio da igualdade de credores, e se homologasse o plano de recuperação apresentado.

Os fundamentos do recurso mais desenvolvidos à frente consistiram, em síntese, na alegação de que a decisão violou a alínea a) do n.º 2 do artigo 212.º do CIRE ao considerar que os créditos da Autoridade Tributária e do Banco 1... não conferiam o direito de votar o plano e na alegação de que a decisão errou ao considerar que o acordo de pagamento violou o princípio da igualdade dos credores.

O administrador e os credores não responderam ao recurso.

* Síntese das questões suscitadas pelo recurso: · Saber se a decisão recorrida incorreu em erro ao decidir que os créditos da Autoridade Tributária e do Banco 1... não conferiam direito de voto; · Saber se a decisão recorrida incorreu em erro ao decidir que o acordo de pagamento violava o princípio da igualdade dos credores.

* Factos julgados provados: 1. O administrador judicial provisório reconheceu os seguintes créditos: · À A.T.A. - Direcção de Finanças de ..., um crédito comum no valor de € 16.711,00; · A CC, um crédito comum no valor de € 50.400,52; · Ao Banco 1...., um crédito garantido no valor de € 168.418,39; · A DD, um crédito comum no valor de € 59.727,91; · A G..., Lda., um crédito comum no valor de € 8.577,00.

· A N..., SA, um crédito comum no montante de € 293,46; · A S..., S.A., um crédito comum, no valor de € 32.024,50 e um crédito subordinado no valor de € 92,00.

· T..., S.A. S.A., um crédito garantido, no valor de € 28.000,00 e um crédito comum no valor de € 5 116,14.

  1. O acordo de pagamento continha, sob a epígrafe “Plano de reembolso dos créditos no âmbito do plano de pagamentos, as seguintes disposições: Regime legal aplicável aos créditos tributários: Pagamento em regime prestacional, nos termos do artigo 196.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), ou seja: a) as prestações são mensais, iguais e sucessivas, vencendo-se a primeira até ao final do mês seguinte à data da sentença homologatória do Plano.

  1. Número máximo de prestações: i. Até ao máximo de 36 prestações, não podendo nenhuma delas ser inferior a 1 unidade de conta (atualmente € 102); ii. Até 150 prestações mensais, não podendo nenhuma delas ser inferior a 10 unidades de conta (atualmente €1020); · A redução dos créditos fiscais só se dará, por juros de mora vencidos e vincendos, nos termos do Decreto-Lei n.º 73/99 de 16 de Março, aceitando-se as taxas praticadas para os créditos da Segurança Social, face à renúncia dos demais credores e às garantias constituídas; · Não haver lugar à redução de coimas e custas; · Não haver lugar a qualquer moratória.

    Créditos Garantidos A regularização da dívida aos Credores Garantidos deverá ocorrer da forma que de seguida se discrimina: · Pagamento de 100% dos valores em dívida (capital e juros vincendos), em 340 prestações mensais, iguais e sucessivas, que incluirão capital e juros vincendos, calculados usando por referência a taxa Euribor 6M, acrescida de um spread de 1%, vencendo-se a primeira no 30º dia posterior ao do transito em julgado da decisão que homologar o presente plano e as restantes em igual dia dos meses subsequentes.

    · Manutenção das garantias prestadas até integral pagamento.

    Créditos comuns A regularização da dívida aos Credores Comuns deverá ocorrer da forma que de seguida se discrimina: · Perdão integral de juros vencidos e vincendos; · Perdão de 80% do valor do capital reclamado; · Estabelecimento de um período de carência de 12 meses após o transito em julgado da decisão que homologar o plano, que possibilite a reorganização da vida pessoal e a reestabilização de rotinas interrompidas desde o início das dificuldades que levaram ao presente processo · Pagamento de 20 % do capital reclamado em 36 prestações trimensais, iguais, sucessivas e postecipadas, vencendo-se a primeira em 31 de Janeiro do ano seguinte ao do término da carência estipulada acima e as seguintes em igual dia dos trimestres subsequentes, a ratear pelos credores comuns na proporção relativa e direta dos seus créditos.

    Créditos subordinados Os Créditos Subordinados serão integralmente perdoados.

    Votaram favoravelmente o acordo A.T-A – Direcção de Finanças de ..., Banco 1... e DD cujos créditos totalizam 2 44 857,30.

    Votaram contra o acordo CC e S..., S.A.

    * Descritos os factos, passemos à resolução das questões suscitadas pelo recurso.

    Direito de voto da Autoridade Tributária e do Banco 1...

    A decisão recorrida considerou que os créditos reconhecidos à Autoridade Tributária e ao Banco 1... não conferiam o direito de votar o acordo de pagamento. Invocou, para o efeito, a alínea a) do n.º 2 do artigo 212.º do CIRE e o facto de – segundo ela – o acordo de pagamento não ter modificado os créditos reconhecidos a tais credores.

    Os recorrentes contestam a decisão com a seguinte alegação: · A modificação a que alude a alínea a) do n.º 2 do artigo 212.º do CIRE não compreende apenas o montante do crédito; a modificação tida em vista reporta-se à situação do crédito, dando-se a modificação quando tal situação for regulada no plano em termos distintos daqueles que derivariam das regras comuns e das da insolvência, seja quanto ao montante, condições de pagamento, garantias e outros aspectos; · Para a AT e para o credor garantido Banco 1... cremos que a previsão do pagamento em prestações e a alteração dos prazos de pagamento e das taxas de juro para o 2.º configura a referida modificação que a lei impõe para a possibilidade de votar. Aumentar o prazo de pagamento, como no caso, e a taxa de juro é ainda uma modificação significativa da forma inicial de pagamento, trazendo anualmente menos valor ao credor; · Resulta ainda dos autos que os créditos em causa (Banco 1... e da AT) já se encontravam vencidos, conforme resulta da lista de credores, e nessa medida os créditos tornaram-se total e imediatamente exigíveis. Pelo que o plano de pagamento em prestações altera sim os créditos desses credores, - ao torná-los não imediatamente exigíveis - dado que os mesmos poderiam imediatamente accionar o devedor visto que...

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