Acórdão nº 42/21.2T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 15 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelM
Data da Resolução15 de Setembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Sumário: (…) Acordam os Juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: No Juízo Central Cível de Santarém, C… e J… demandaram Caixa Geral de Depósitos, S.A.

, pedindo: a) ser declarada nula a hipoteca constituída 06.07.2009 sobre o imóvel pela B…, Lda. a favor da Ré; ou, se assim não se entender, b) ser declarada a ineficácia/inoponibilidade dessa hipoteca relativamente às AA.; c) em qualquer caso ser determinado o cancelamento/extinção do registo desta hipoteca.

Alegam que, por sentença transitada em julgado, foi declarada a nulidade do contrato de permuta celebrado com a sociedade B…, Lda. e incidente sobre o imóvel descrito nos autos. Uma vez que esta sociedade constituiu hipoteca sobre o referido imóvel, entendem que também essa hipoteca é nula, ou ineficaz perante as demandantes.

Contestou a Ré, alegando que não foi alegado qualquer facto que determine a nulidade do contrato de abertura de crédito/mútuo através do qual se constituiu a hipoteca; que na anterior acção a aqui Ré foi declarada parte ilegítima, pois nessa acção não estava pedida a nulidade da hipoteca; e que caducou o direito das AA., pois a acção destinada a obter a declaração de nulidade da hipoteca foi proposta mais de três anos após a celebração do respectivo contrato, nos termos do artigo 291.º, n.º 2, do Código Civil.

Na resposta, as AA. sustentam que a anterior acção foi proposta em menos de três anos após a celebração do negócio nulo, e apesar da aqui Ré ter sido absolvida da instância, tal não obsta a que se proponha outra acção sobre o mesmo objecto, nos termos do artigo 279.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.

A sentença recorrida entendeu que o prazo aludido no artigo 291.º, n.º 2, do Código Civil respeita apenas à acção de nulidade do primeiro negócio nulo, ou seja, o contrato de permuta. Declarado nulo esse contrato, com efeito retroactivo, apesar da Ré ter celebrado o mútuo e constituído a hipoteca com quem na altura tinha registo de aquisição a seu favor, face ao disposto no artigo 715.º do Código Civil a declaração de nulidade do contrato de permuta tem como consequência a nulidade da hipoteca.

Julgou, pois, a acção procedente, declarando nula a hipoteca e determinando o cancelamento do respectivo registo.

Interpõe a Ré recurso e conclui: A. A Recorrente impugna a douta sentença recorrida, que considerou a acção procedente, e que declarou nula a hipoteca constituída em 06-07-2009, determinando ainda o seu cancelamento, por violação, nomeadamente, das normas ínsitas nos artigos 279.º, 291.º, 298.º, n.º 2, 715.º, todos do Código Civil, 138.º, 279.º, n.ºs 1 e 2, 571.º, n.º 2, 619.º, n.º 1, 628.º, todos do CPC, cuja melhor interpretação e aplicação se alegará e concluirá.

  1. À luz do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 279.º do CPC, nenhum obstáculo existe a que o autor proponha nova acção contra o mesmo réu, com o mesmo pedido e mesma causa de pedir.

  2. E a causa de pedir é constituída pelo acto ou facto jurídico (simples ou complexo, mas sempre concreto) donde emerge o direito que o autor invoca e pretende fazer valer, a qual, nas acções anulatórias se reporta a nulidade específica (absoluta ou relativa), ou seja, o vício gerador da invalidação total ou parcial da declaração negocial de que se trate (erro, dolo, coacção, simulação absoluta ou relativa, negócio em fraude à lei ou contra-legem ou violador da ordem jurídica, etc. – cfr. os artigos 240.º a 257.º e 285.º a 294.º do CC).

  3. Ora, resulta da factualidade provada que as aqui Recorridas, a 03/05/2011 propuseram acção judicial contra a sociedade B…, Lda., que correu termos sob o n.º (…), no Tribunal Judicial (…), através da qual peticionaram pela nulidade do contrato de permuta (cfr. facto 3.1.10 dos factos provados) e nenhum pedido foi dirigido à pretendida nulidade da hipoteca, nem há factualidade alegada nesse sentido.

  4. Por outro lado, também como resulta da matéria de facto provada – vide facto provado 3.1.13 –, o contrato através do qual a hipoteca ora em crise nestes autos foi constituída foi o de abertura de crédito/mútuo (cfr. facto 3.1.4 dos factos provados).

  5. E nos presentes autos as Recorridas peticionam pela nulidade da identificada hipoteca com base na douta sentença que declarou nulo o contrato de permuta. Porém, G. Como igualmente resulta da factualidade provada, a nulidade do contrato de permuta circunscreveu-se apenas a esse negócio jurídico, que, como se disse, não foi com base nele que a hipoteca foi constituída.

  6. Donde, salvo melhor e douta opinião, não podemos acompanhar a tese do Tribunal a quo segundo a qual «e nem se diga que o objecto não é o mesmo, que que a nulidade ou inoponibilidade da hipoteca deriva da nulidade do contrato de permuta», pois que, na primeira acção estava em causa a anulação dos efeitos do negócio jurídico (permuta), ao passo que nesta está em causa a nulidade de uma hipoteca.

    I. Ainda que esta acção passasse no crivo do n.º 1 do artigo 279.º do CPC – que não passa –, determina o seu n.º 2 que «sem prejuízo do disposto na lei civil relativamente à prescrição e à caducidade dos direitos, os efeitos civis derivados da proposição da primeira causa e da citação do réu mantêm-se, quando seja possível, se a nova acção for intentada ou o réu for citado para ela dentro de 30 dias a contar do trânsito em julgado da sentença de absolvição da instância». Ora, J. Flui da matéria de facto provada que a anterior acção transitou em julgado a 19.11.2020 (vide 3.1.13 dos factos provados), e, contando os 30 dias, teriam as Recorridas que intentar a acção até 19.12.2020, que, sendo sábado, transfere-se para o primeiro dia útil, ou seja, 21.12.2020 (cfr. artigo 279.º, alíneas b), c) e e), do CC e, também, Ac. do STJ de 14-03-1990).

  7. Com efeito, tendo as Recorridas apresentado a acção a 06-01-2021 foi clara e notoriamente extemporânea, e, aparentemente, por as Recorridas terem pago multa, deverão sustentar que se trata de um prazo de natureza processual – vide artigo 138.º do CPC –, que não é, sendo antes um prazo de natureza substantiva, que não se suspende nas férias judiciais.

    L. Destarte, contrariamente ao que pretende fazer crer o Tribunal a quo, o prazo de 30 dias previsto no n.º 2 do artigo 279.º do CPC é de natureza substantiva, ao qual são aplicáveis as normas do Código Civil, mormente o modo de contagem dos prazos a que alude o artigo 279.º do CC. Logo, as Recorridas intentaram a presente acção além daquele prazo, devendo reconhecer-se, naturalmente, a caducidade do direito de acção.

  8. Ademais, o artigo 291.º do CC consagra um desvio do princípio geral sobre nulidade ou anulabilidade expresso no artigo 289.º do CC, quando esteja em causa a restituição de bens...

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