Acórdão nº 289/12.2 BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 15 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelJORGE CORTÊS
Data da Resolução15 de Setembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

AcórdãoI- Relatório F…………………… deduziu impugnação judicial na sequência do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa da liquidação do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), que lhe foi efectuada, por referência ao ano de 2007, no montante de €40.842,80, em virtude da não aceitação da declaração pelo regime de tributação conjunta.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, por sentença proferida a fls. 193 e ss.

(numeração no processo em formato digital -sitaf), datada de 08 de Setembro de 2021, julgou a presente impugnação procedente e anulou a liquidação sindicada.

Desta sentença foi interposto o presente recurso em cujas alegações de fls.

210 e ss.

(numeração do processo em formato digital - sitaf), a recorrente, Fazenda Pública, alegou e formulou as seguintes conclusões:

  1. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou procedente a impugnação deduzida por F …………., com o NIF ……………, melhor identificado nos autos, contra o indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa do ato de liquidação de IRS de 2007, no montante de €40.842,80, efetuada na sequência da não aceitação da declaração conjunta apresentada com opção pela tributação segundo o regime de união de facto, e em consequência determinou a anulação da liquidação de IRS n.º ……………730, emitida em 28.02.2011 em relação ao ano de 2007 e condenando a Fazenda Pública na restituição do imposto pago em excesso, acrescido dos respetivos juros indemnizatórios.

  2. Em causa nos autos está o indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa da liquidação de IRS n.º …………730, respeitante ao exercício de 2007, no montante de €40.842,80.

  3. Alega o Impugnante que viveu em união de facto com S ………………. muitos anos, designadamente ao tempo da entrada da petição inicial no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, mais de 13 anos e, portanto, no ano em causa nos autos, o ano de 2007, encontrava-se em situação de união de facto, devendo a liquidação oficiosa que desconsiderou a união de facto, por falta de verificação dos respetivos pressupostos, ser anulada.

  4. O Tribunal a quo considerou provados os pressupostos constantes do art.º 14.º n.º 2 do CIRS, essencialmente com base em prova testemunhal.

  5. Ora, o nosso ordenamento consagra, em diversas vertentes, a proteção da união de facto, reflexo da proteção constitucionalmente consagrada do direito à constituição de família no art.º 36.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa.

  6. Assim, a este respeito, é desde logo de chamar à colação a Lei n.º 7/2001, de 11 de maio, aplicando-se nos presentes autos, a sua redação inicial, considerando que o facto tributário se reporta ao ano de 2007.

  7. O art.º 1.º, n.º 1, do mencionado diploma, define “união de facto” como “a situação jurídica de duas pessoas que, independentemente do sexo, vivam em condições análogas às dos cônjuges há mais de dois anos”.

  8. Nos termos do seu art.º 3.º, al. d) da Lei n.º 7/2001, de 11 de maio, as pessoas que vivam em união de facto têm direito à “[a]plicação do regime do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares nas mesmas condições aplicáveis aos sujeitos passivos casados e não separados de pessoas e bens”.

  9. Por seu turno, o art.º 14.º do Código do IRS (CIRS), na redação em vigor ao tempo, estabelecia o seguinte, “1. As pessoas que vivendo em união de facto preencham os pressupostos constantes da lei respetiva, podem optar pelo regime de tributação dos sujeitos passivos casados e não separados judicialmente de pessoas e bens.

    1. A aplicação do regime a que se refere o número anterior depende da identidade de domicílio fiscal dos sujeitos passivos durante o período exigido pela lei para verificação dos pressupostos da união de facto e durante o período de tributação, bem como da assinatura, por ambos, da respetiva declaração de rendimentos.

    2. No caso de exercício da opção prevista no n.º 1, é aplicável o disposto no n.º 2 do artigo 13.º, sendo ambos os unidos de facto responsáveis pelo cumprimento das obrigações tributárias”.

  10. É ainda pertinente chamar à colação o art.º 19.º da Lei Geral Tributária (LGT), também na redação então em vigor, nos termos do qual: “1 - O domicílio fiscal do sujeito passivo é, salvo disposição em contrário: a) Para as pessoas singulares, o local da residência habitual; (…) 2 - É obrigatória, nos termos da lei, a comunicação do domicílio do sujeito passivo à administração tributária.

    3 - É ineficaz a mudança de domicílio enquanto não for comunicada à administração tributária.

    (…) 6 - A administração tributária poderá retificar oficiosamente o domicílio fiscal dos sujeitos passivos se tal decorrer dos elementos ao seu dispor”.

  11. In casu, a primeira questão que se coloca prende-se com a possibilidade de ser apresentada declaração modelo 3 de IRS com exercício da opção pela tributação segundo o regime dos sujeitos passivos casados, não obstante a 31.12.2007, assim como nos dois anos anteriores, tivessem domicílios fiscais diferentes.

  12. Ora, ainda que se possa admitir que a obrigação de identidade do domicílio fiscal, configurada do ponto de vista da obrigatoriedade de comunicação e registo junto da AT do mesmo domicílio fiscal, não é condição única ou imposta para efeitos de aplicação do regime constante do art.º 14.º do CIRS, certo é que o Impugnante não fez prova, por outro meio, da verificação dos pressupostos para a união de facto no ano em causa, de 2007.

  13. O regime jurídico em causa pretendeu instituir a faculdade de quem viva em união de facto optar pelo regime de tributação aplicável aos contribuintes casados e não separados de pessoas e bens.

  14. A exigência de domicílio comum é inerente ao próprio conceito de união de facto.

  15. A situação de união de facto configura uma vivência em condições análogas às dos cônjuges, estabelecendo o art.º1673.º n.º1 do Código Civil, com a epígrafe “Residência da família” que ”os cônjuges devem escolher de comum acordo a residência da família, atendendo, nomeadamente, às exigências da sua vida profissional e aos interesses dos filhos e procurando salvaguardar a unidade da vida familiar”.

  16. Por seu turno, na LGT, o domicílio fiscal, no caso das pessoas singulares, é definido como o local da residência habitual.

  17. Ora, para efeitos de aplicação do regime previsto no art.º14.º do CIRS, o que é fundamental é que o domicílio fiscal, enquanto residência habitual, seja o mesmo.

  18. Esta é a conclusão que se retira da conjugação da disciplina legal prevista no CIRS e na Lei n.º 7/2001, de 11 de maio, sendo que o n.º 1 do art.º 14.º do CIRS remete para a designada Lei n.º 7/2001, de 11 de maio, lei de proteção das uniões de facto.

  19. Se é certo que a verificação deste pressuposto não se confunde, por um lado, com a falta de comunicação à AT do domicílio fiscal, embora esteja legalmente previsto esse dever de comunicação, sem, no entanto, tal falta ter impacto em termos de tributação, é igualmente certo que não tendo havido a comunicação à AT do domicílio fiscal dos membros da união de facto, a prova da união de facto terá de ser feita por outro meio.

  20. Ou seja, uma vez que a comunicação à AT do domicílio fiscal dos membros da união de facto não se trata de uma formalidade ad substanciam, de uma presunção inilidível, tal prova pode ser feita por outro meio, cabendo aos sujeitos passivos o ónus da prova de tal vivência, atento o disposto no art.º 74.º da LGT.

  21. Pelo que, a exigência vertida no artigo 14º, n.º 2 do CIRS, a indicação de uma morada comum, apenas pode ser vista como requisito formal que facilita a prova perante a AT da referida união de facto e, caso os interessados não cumpram tais exigências, como sucedeu no caso concreto, incumbe-lhes fazer a prova, por qualquer meio, de que podem efetivamente beneficiar do regime próprio das uniões de facto.

  22. Recaem, portanto, sobre os interessados em beneficiar da situação da união de facto, as penalidades e ónus legalmente previstos pela não atualização, junto da AT, da sua situação pessoal e familiar.

  23. Cumpre aferir se o Impugnante, ora Recorrido cumpriu o seu ónus probatório.

  24. O Tribunal a quo considerou provados os requisitos materiais da aplicação do regime de tributação da união de facto, previsto no art.º 14.º do CIRS e art.º 1.º da Lei n.º 7/2001, de 11/05, exclusivamente com base em prova testemunhal Y) Acontece, no entanto, que o Impugnante, ora Recorrido, não comprovou a condição imposto pelo art.º 14.º, n.º 2 do CIRS, na redação ao tempo, a identidade de domicílio fiscal dos sujeitos passivos durante o período...

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