Acórdão nº 349/22.1BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 15 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelLUÍSA SOARES
Data da Resolução15 de Setembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I – RELATÓRIO Vem AT- Autoridade Tributária e Aduaneira interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou procedente a reclamação deduzida por A....-A..., Lda., ao abrigo do art. 276º do Código de Procedimento e de Processo Tributário contra a decisão proferida pelo órgão de execução fiscal no âmbito do processo de execução fiscal nº …..442, que indeferiu o pedido de redução da taxa de juros de mora a metade.

A Recorrente termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: “46. Visa o presente recurso reagir contra a Douta Sentença proferida nos autos à margem melhor identificados, que julgou procedente a presente reclamação apresentada por A …- A….. LDA, concluindo pela consequente anulação do ato reclamado.

  1. Neste âmbito, o thema decidendum, assenta em saber se a penhora sobre imóvel, pode ou não integrar no conceito de “garantia real” e se permite que a reclamante possa beneficiar da redução prevista no n.º 4 (anterior n.º 3) do artigo 3º do Decreto-Lei 73/99 de 16 de março, quanto aos juros de mora.

  2. Discorda a Fazenda Publica, com o devido respeito, do entendimento sufragado na Douta Sentença, e com a mesma não se conforma, porquanto padece de erro de direito ao valorar erradamente a prova de facto, por não ter feito uma correta interpretação e aplicação das normas estabelecidas mormente no n.º 4 (anterior n.º 3) do artigo 3º do Decreto-Lei 73/99 de 16 de março.

  3. Vejamos: 50. O processo executivo foi instaurado a 30/12/2009 para cobrança coerciva da nota de liquidação referente ao IRC do ano de 2003, com quantia exequenda no montante de € 158.760,81.

  4. A reclamante veio impugnar judicialmente a legalidade da divida [referência ao processo de impugnação nº 319/10.2BESNT], prestando garantia.

  5. Nessa sequência foram bens nomeados à penhora.

    a) Fração autónoma designada pela letra “N” que corresponde à loja com entrada pelo 58B, do prédio urbano sito na Av. ª Tomás Ribeiro, n.º …..e Travessa da Rocha, n.º….., em Carnaxide, inscrito na Matriz sob o Artigo …..º das Freguesias de Carnaxide e Queijas e b) Lote de terreno para construção urbana, sito na Rua Irene Lisboa, lote…., na Brandoa, Amadora, inscrito na Matriz sob o n.º ….. da Freguesia da Encosta do Sol.

  6. Houve decisão de improcedência no âmbito do processo de impugnação nº 319/10.2BESNT nessa sequência foi apresentado recurso jurisdicional onde foi negado provimento ao mesmo.

  7. Decorrido o trânsito em julgado do acórdão de improcedência em 23/09/2021, a reclamante foi notificada para proceder ao pagamento da importância em dívida no âmbito do processo executivo, sob pena da normal tramitação do mesmo, promovendo-se a venda dos prédios penhorados acima citados.

  8. Por requerimento e através do seu Mandatário veio a reclamante alegar redução do cálculo dos juros de mora, uma vez que no seu entender, deveria ser reduzido a metade por força do estatuído no nº 4 do art.º 3 do Dec. Lei nº 73/99 de 16 de março.

  9. O Serviço de Finanças Oeiras 2 informou o mandatário da reclamante e citamos “É entendimento da AT que, pese embora a penhora tenha uma função de garantia, dado que retira ao executado o poder de livre disposição do bem, em bom rigor, não se trata de uma garantia real mas sim de uma apreensão judicial do bem.

  10. A reclamante não concordando deu entrada no Serviço de Finanças Oeiras 2, de reclamação.

  11. A AT manteve a sua posição e remeteu os autos a tribunal.

  12. Pelo Douto Tribunal foi proferida Sentença julgando a reclamação de A …– A…. LDA procedente com a consequente anulação do ato reclamado.

  13. Sentença com que a AT não se conforma, 61. A penhora, não é uma garantia real, trata-se de uma apreensão judicial dos bens e/ou rendimentos do executado que em regra geral serve como garantia dos créditos no âmbito de um processo executivo.

  14. O preâmbulo o citado Decreto-Lei 73/99 de 16 de março vem determinar “Com carácter inovador, e tendo em conta a necessidade de garantir adequadamente os créditos do Estado e de outras entidades públicas em situações que afetem a continuidade da atividade económica do devedor, o diploma cria um incentivo à constituição de garantias reais por iniciativa ou com a colaboração dos devedores, ou de garantias bancárias, traduzido numa redução da taxa de juros de mora a metade.

    “, (sublinhado nosso).

  15. É certo que para efeitos de suspensão do processo executivo, a penhora constituída pela reclamante foi considerada como uma garantia idónea e suficiente para pagamento da divida executiva e acrescido, mas isso não quer dizer que deva ser considerada como “garantia real” no âmbito de aplicação do n.º 4 (anterior n.º 3) do artigo 3º do Decreto-Lei 73/99 de 16 de março.

  16. No capítulo VI do Código Civil encontram-se identificadas e definidas as garantias especiais das obrigações, dividindo-se estas em garantias de natureza pessoal, como seja a fiança, e as de natureza real como é o caso do penhor e da hipoteca.

  17. Porém, neste elenco não se encontra incluída a penhora, a qual vem tratada no capítulo seguinte do Código Civil, dedicado ao cumprimento e não cumprimento das obrigações e realização coativa da prestação.

  18. A penhora é um ato de apreensão de bens por autoridade pública, não consubstancia um direito real de garantia.

  19. A preferência da penhora sobre as garantias reais posteriormente constituídas decorre naturalmente dos seus efeitos previstos, designadamente, no artigo 822º do CC.

  20. Relativamente à doutrina, esta não é consensual no que diz respeito à classificação da penhora como garantia real, por a sua formação ocorrer no âmbito de um processo judicial, e não no decurso de um ato negocial.

  21. Até os que defendem que a penhora constitui uma garantia real, reconhecem que não se trata de uma garantia real plena.

  22. In casu, estamos perante um crédito reclamado pela AT que beneficia de uma penhora e, portanto, é tido como um crédito comum e não um crédito com garantia real.

  23. De resto, o n.º 4 (anterior n.º 3) do artigo 3º do DL 73/99, de 16 de março especifica as garantias suscetíveis de beneficiar desta redução de juros – as garantias reais e bancárias, donde se extrai que o referido normativo não pretende abranger a totalidade das garantias.

  24. Não o tendo sido, e não fazendo a penhora parte do elenco das garantias reais definidas no Código Civil, porque de uma verdadeira garantia real não se trata, o n.º 4 (anterior n.º 3) do artigo 3º do DL 73/99, de 16/03 deve ser interpretado no sentido de não abranger no seu âmbito de incidência a penhora, ainda que a mesma seja suscetível de constituir garantia idónea.

  25. A garantia real é sempre uma garantia idónea, mas uma garantia idónea pode (ou não) ser uma garantia real.

  26. Com o máximo respeito por opinião contrária, não pode a Fazenda Pública aceitar o que o Douto Tribunal vem defender e citamos “(…) “nosso ver, a característica da oponibilidade a terceiros da penhora devidamente registada faz dela um “autêntico” direito real que tem como consequência satisfazer o que se pretendeu acautelar na citada disposição legal. É que a penhora registada envolve a constituição de um direito real de garantia conferindo ao credor/exequente o direito de ser...

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