Acórdão nº 197/22.9 BELLE de Tribunal Central Administrativo Sul, 15 de Setembro de 2022
Magistrado Responsável | ISABEL FERNANDES |
Data da Resolução | 15 de Setembro de 2022 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam, em conferência, os juízes que compõem a 1ª Sub-Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul I – RELATÓRIO I…, melhor identificado nos autos, veio reclamar da decisão do órgão de execução fiscal proferida pelo Chefe do Serviço de Finanças de Vila do Bispo, que indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia por si apresentado, no âmbito do processo de execução fiscal (PEF) n.º 1147.2022/01002201, instaurado para cobrança coerciva de dívidas provenientes de Imposto sobre o Rendimento de Pessoa Singular (IRS), referente ao ano de 2007, no montante total de €11.437,36.
O Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, por decisão de 18 de maio de 2022, julgou improcedente a reclamação por não resultarem provados os pressupostos previstos no n.º 4 do artigo 52.º da LGT para a dispensa de prestação de garantia e, em consequência, absolveu a Fazenda Pública da instância.
Não concordando com a sentença, o Recorrente I…, veio interpor recurso da mesma, tendo nas suas alegações, formulado as seguintes conclusões: «I. Vem o presente Recurso apresentado contra a Sentença proferida no dia 18 de maio de 2022, nos termos da qual se julgou improcedente a Reclamação Judicial apresentada no dia 7 de março de 2022, junto do Serviço de Finanças de Vila do Bispo, uma Reclamação Judicial contra a mencionada decisão, através da qual requereu a anulação do Despacho proferido pelo Senhor Chefe do Serviço de Finanças de Vila do Bispo e, em consequência, solicitou a suspensão do processo de execução fiscal, com dispensa de prestação de garantia.
II. A Sentença ora impugnada sustenta a referido improcedência da Reclamação Judicial na seguinte argumentação "(…) o Reclamante nada alega, nem prova, quanto à (im)possibilidade de obtenção de uma garantia, seja sob a forma de garantia bancária, seguro-caução ou outra, pelo que não se encontra evidenciado que não possam arcar com as despesas (que nem quantificam) com a prestação da garantia necessária para a suspensão do processo de execução fiscal (que até podia estar associada a outras garantias a constituir, por exemplo, sobre o bem imóvel anteriormente referido) ou que a sua prestação, pela sua excessiva onerosidade, lhes causaria um esforço financeiro insuportável, considerando o valor dos seus encargos mensais fixos [cfr. alíneas c) a e) supra]".
III. Em face do que antecede, a douta Sentença determinou a manutenção da decisão da Autoridade Tributária e Aduaneira, ora Recorrida, na ordem jurídica e, bem assim, condenou o ora Recorrente ao pagamento das custas do processo; III. Em face do que antecede, a douta Sentença determinou a manutenção da decisão da Autoridade Tributária e Aduaneira, ora Recorrida, na ordem jurídica e, bem assim, condenou o ora Recorrente ao pagamento das custas do processo; IV. Acontece, porém, que a Sentença proferida nos presentes autos padece de ilegalidade por violação dos princípios do inquisitório, da proporcionalidade e da tutela jurisdicional efetiva, todos com previsão constitucional, conforme adiante melhor se circunstanciará, devendo, por conseguinte, ser anulada e, consequentemente, ser invertido o seu entendimento e substituída por uma decisão que dê cumprimento aos mencionados princípios; V. A execução fiscal visa a cobrança coerciva das dívidas elencadas no artigo 148.º do CPPT. É um processo de natureza judicial, como decorre expressamente do n.º 1 do artigo 103.º da LGT, sem prejuízo de ser instaurada e se desenvolver perante órgãos da Autoridade Tributária e Aduaneira, que nela praticam os atos de natureza não jurisdicional que couberem, tudo nos termos dos artigos 10.º, n.º 1, alínea f), 149.º, 150.º e 151.º do CPPT; VI. Entre tais atos incluem-se os concernentes à prestação de garantia, quando a ela houver lugar, e às respetivas vicissitudes: apreciação da suficiência, dispensa, reforço, redução, levantamento. É o que se extrai das disposições dos artigos 169.º, 170.º, 183.º, 195.º, 199.º n.ºs 8, 9 e 10 do CPPT. Em síntese, tudo quanto respeite à garantia prestada no âmbito da execução fiscal, quer tenha em vista a sua suspensão, quer o pagamento em prestações da dívida exequenda, é da competência do órgão da execução fiscal; VII. O pedido de dispensa de garantia deve, pois, ser apresentado ao órgão da execução fiscal, nos termos do n.º 1 do artigo 170.º do CPPT – que regulamenta o pedido de dispensa de prestação de garantia previsto no n.º 4 do artigo 52.º da LGT –, pois é a esse órgão que está legalmente atribuída a competência exclusiva para decidir sobre esse pedido; VIII. No caso, o Recorrente pediu a dispensa da prestação de garantia com fundamento na manifesta falta de meios económicos por não possuir bens suficientes para garantir a dívida exequenda e o acrescido, alegando, em síntese, a inexistência de bens que possa oferecer em garantia. Nesse pedido o ora Recorrente carreou para os autos toda a prova documental suscetível de comprovar a sua situação económica; IX. Isto, sem prejuízo de o tribunal tributário competente poder ser chamado, mediante solicitação de qualquer interessado, a sindicar a legalidade da atuação da Administração no âmbito desse pedido (cfr. arts. 151.º, n.º 1, e 286.º do CPPT).
X. Estamos, pois, perante um procedimento administrativo tributário enxertado no processo de execução fiscal, sendo a respetiva decisão um verdadeiro ato administrativo (Cfr. neste sentido DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, Encontro da Escrita, 4.ª edição, anotação 11 ao art. 52.º, págs. 428/429.).
XI. Esse procedimento da iniciativa do executado (cfr. artigo n.º 4 do artigo 52.º da LGT, que diz “a requerimento do executado” e o art. 170.º do CPPT, que diz “deve o executado requerer”) é um procedimento formal, que deve obedecer às regras legais; designadamente, deve seguir a forma escrita (cfr. n.º 3 do artigo 54.º da LGT), deve indicar o órgão a que se dirige, identificar o requerente, com indicação do nome e domicílio [cf. art. 102.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Código do Procedimento Administrativo (CPA)], expor os fundamentos de facto e de direito em que se baseia o pedido e instruir o requerimento com a prova documental pertinente (cfr. n.º 3 do artigo 170.º do CPPT).
XII. No caso em apreço, o Recorrente pediu a dispensa da prestação de garantia com fundamento na manifesta falta de meios económicos por não possuir bens suficientes para garantir a dívida exequenda e o acrescido. Para tanto o ora Recorrente carreou para os autos toda a prova documental suscetível de comprovar a sua situação económica. De resto, a própria Autoridade Tributária tem acesso a toda a informação suscetível de fundamentar a insuficiência económica.
XIII. Com efeito, e conforme resulta da Sentença ora recorrida, o ora Recorrente "(...) é proprietário de um prédio urbano inscrito na matriz da freguesia de Vila do Bispo e Raposeira, concelho de Vila do Bispo, sob o n.º 1…, com valor patrimonial tributário de € 43.929,20 e de três veículos automóveis, a saber veículo com a matrícula 0…-…-8…, da marca Volkswagen (€ 6.753,38), matrícula 4…-…-A…, da marca Renault (€ 500,00) e matrícula P…-…-6…, da marca Nissan (€ 500,00)".
XIV. Ora, conforme o Recorrente tem dito ao longo do processo, para além de terem um valor diminuto, o imóvel acima identificado constitui a sua habitação própria permanente.
XV. Ora uma decisão judicial que desconsidere este aspeto é manifestamente ilegal, uma vez que viola os princípios da igualdade e da proporcionalidade previstos nos artigos 13.° e 18.° da Constituição, porquanto não se pode conceber que as medidas respeitantes à "casa de morada de família" que respeitam à "política de família com carácter global e integrado" que ao Estado incumbe executar para protecção da família [alínea g) do n.° 2 do artigo 67.° da CRP] não sejam consideradas.
XVI. Esta desconsideração ganha mais premência numa situação de pandemia que vivemos, uma vez que fazer impender um ónus sobre a sua o imóvel do Recorrente é uma limitação desproporcional que o impede, inclusivamente, de se desfazer do imóvel por razões económicas.
XVII. Ora, a este ponto convém relembrar que a dívida em discussão é € 11.437,36 e que tanto a Autoridade Tributária como os Tribunais estão vinculados aos princípios da legalidade e da proporcionalidade.
XVIII. Esta situação ganha mais premência se se tiver em consideração que a situação subjacente à dívida, cuja legalidade está a ser contestada, se deve a uma insistência da Autoridade Tributária em não usar os seus mecanismos de troca de informações e contactar as autoridades fiscais competentes do Reino Unido.
XIX. É que, conforme o Recorrente tem solicitado ao longo do processo todo, a Autoridade Tributária recusa-se a contactar as autoridades fiscais do Reino Unido para obter um certificado de residência fiscal, atendendo à dificuldade que o Recorrente tem demonstrado em obtê-lo.
XX. Porque razão a Autoridade Tributária é mais lesta a penhorar um imóvel do que a procurar a descoberta da verdade material? XXI. É que exigir ao Recorrente contribuinte o pagamento de uma dívida ou a sua garantia para...
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