Acórdão nº 3842/16.1T9VNG.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelM. CARMO SILVA DIAS
Data da Resolução08 de Setembro de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

3842/16.1T9VNG.S1 Recurso Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça I. Relatório 1.

No processo comum (tribunal coletivo) n.º 3842/16.1T9VNG.S1 do ..., Juiz ..., por acórdão de 17.03.2022, o arguido AA foi condenado, em cúmulo jurídico superveniente, nos termos dos arts. 77.º e 78.º, do Código Penal, entre as penas individuais aplicadas nesse processo (n.º 3842/16.1T9VNG) e as impostas no processo n.º 24/15.3JAPRT, da ..., Juiz ..., na pena única de 11 (onze) anos de prisão.

  1. Inconformado com essa decisão, o arguido AA, interpôs recurso formulando as seguintes conclusões: A. A pena de prisão efectiva de 11 anos de prisão não tem conta a necessidade de descontar o tempo de prisão já cumprido.

    1. O que deverá ser feito.

    2. A Douta Sentença recorrida violou o estatuído nos artº 40º, 43º, 50º, 70º e 71º do Código Penal e 18º, nº2, da Constituição da República Portuguesa.

    3. Fazendo uma aplicação muito gravosa da moldura penal, indo até contra a jurisprudência desse Venerando Tribunal, que já reduziu a pena unitária de 10 para 8 anos de prisão no Processo n.º 24/15.3JAPRT.

    4. Pelo que, a Douta Sentença deve ser revogada e substituída por outra que mantenha a pena de prisão efectiva de 9 anos de prisão.

    Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, sendo a Sentença recorrida alterada para uma pena de prisão efectiva de 9 anos, com a consequente redução do tempo já cumprido à ordem do Processo n.º 24/15.3JAPRT.

  2. O Ministério Público na 1ª instância respondeu ao recurso defendendo a confirmação do acórdão impugnado.

  3. Subiram os autos a este Tribunal e, o Sr. PGA emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso, considerando que o desconto deve operar no momento da liquidação da pena e ser ajustada e adequada a pena única aplicada pela 1ª instância.

  4. No exame preliminar a Relatora ordenou que fossem colhidos os vistos legais, tendo-se realizado depois a conferência e, dos respetivos trabalhos, resultou o presente acórdão.

    1. Fundamentação 6. Consta do acórdão sob recurso, na parte relativa à decisão sobre a matéria de facto: FACTOS PROVADOS Dos elementos carreados para os autos resulta que, com relevância para o presente cúmulo jurídico, o arguido foi julgado e condenado nos processos, pelos factos, nas circunstâncias e penas a seguir descriminadas: A) No P.

    nº 24/15.3JAPRT, Comarca do Porto, BB - ... - ... Secção Criminal - J..., por acórdão datado de 05/07/2016, transitado em julgado em 10/11/2017, foi o arguido condenado pela prática, em 2014/05; 2014/08/14; 2014/11 e 2014/08, como autor material, na forma consumada, em relação à ofendida CC, de um crime de abuso sexual de crianças p. e p. pelo art.º 171.º n.º 1, do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão (factos ocorridos entre maio de 2014 a novembro de 2014, factos relatados de 9.º a 11.º dos factos provados); relação à ofendida CC, de um crime de violação, p. e p. pelo art.º 164.º n.º 1 a), com a agravação do art.º 177.º n.º 6, (atualmente n.º 7), ambos do Código Penal, na pena de 6 (seis) anos de prisão (factos relatados em 17.º dos factos provados); em relação à ofendida CC, de um crime de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência, p. e p. pelo art.º 165.º n.º 1 e 2, do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 2 (dois) meses de prisão (factos relatados em 20 a 23 dos factos provados); em relação à ofendida CC, de um crime de violação, p. e p. pelo art.º 164.º n.º 1 a), com a agravação do art.º 177.º n.º 6, (atualmente n.º 7), ambos do Código Penal, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses, de prisão (factos relatados em 24 a 28 dos factos provados); e, em relação à ofendida DD, de um crime de violação, p. e p. pelos arts. 22.º, 23.º, 73.º, 164.º n.º 1 a), com a agravação do art.º 177.º, n.º 5 (e atualmente n.º 6), todos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão. Em cúmulo jurídico das penas de prisão parcelares impostas nos ao arguido, foi este condenado na pena única de 8 (oito) anos de prisão, após recurso para o S.T.J. – certidão junta aos autos.

    Em súmula, apurou-se que: 1.º O arguido é pai de EE, companheiro de FF, desde pelo menos o ano de 2004, sendo esta mãe da menor CC, nascida em .../.../2001.

    1. Por força dessa relação existente entre a mãe da menor e o seu companheiro, a CC, desde os 11/12 anos, começou a conviver frequentemente com o arguido.

    2. O arguido, devido a esse convívio, presenteava a menor com material escolar, tabaco e carregava-lhe o telemóvel.

    3. À data dos factos que infra se descrerão o arguido exercia as funções de tesoureiro na Junta de Freguesia ..., situada na Rua ..., em ..., estando-lhe atribuído o veículo com matrícula ..-FC-.., de marca Toyota Hiace, de cor branca.

    4. Pelo menos desde o verão de 2013, o arguido transportou a menor CC, diversas vezes, no referido veículo automóvel, assegurando as deslocações da menor entre a casa da avó materna, situada no ..., onde residia, e a casa da mãe da menor, localizada na ..., ..., em ....

    5. A partir dessa altura o arguido, aproveitando a confiança que a menor CC depositava em si, começou a manter com ela conversa sobre sexo, perguntando-lhe inclusivamente se já tinha experimentado.

    6. A partir de maio de 2014 a menor CC foi residir com a mãe e os contactos com o arguido passaram a ser ainda mais frequentes, pois este transportava-a muitas vezes de ida e volta à escola.

    7. O arguido resolveu então aproveitar-se da relação de proximidade que mantinha com a menor para manter com ela atos de cariz sexual, sempre que a ocasião o permitisse.

    8. Em datas não concretamente apuradas, mas situadas no período compreendido entre maio de 2014 até finais de novembro de 2014, por várias vezes, o arguido conduziu a menor CC até à Junta de Freguesia acima referida, em alturas em que tal local já se encontrava fechado, e enquanto a menor aguardava no carro, o arguido entrava nas instalações e desligava a câmara de vigilância, após o que levava a menor para o interior.

    9. Ali, em várias ocasiões, por vezes no gabinete que lhe estava atribuído e outras no corredor do ... andar, o arguido apalpou a menor nas nádegas e nos seios, por cima e por baixo da roupa, deu-lhe beijos na boca e lambeu-lhe o pescoço, ao mesmo tempo que mantinha uma das mãos no seu pénis e efetuava movimentos de masturbação.

    10. Por vezes, a menor CC chorava e o arguido advertia-a para que não contasse nada à mãe pois caso contrário quem sofreria as consequências seria a sua progenitora.

    11. Numa dessas ocasiões, no referido período temporal, nas instalações da Junta, o arguido baixou as calças e as cuecas à menor CC e encostou o seu pénis ereto ao ânus da menor, altura em que ejaculou.

    12. No dia 12.8.2014 o arguido, depois de ter deixado a mãe e o irmão da CC nas urgências do Hospital ..., à noite, levou a CC na carrinha da Junta de Freguesia até à Rua ..., uma rua sem movimento e, dentro de tal veículo, deitou a menor num dos bancos, pôs-se em cima dela efetuando movimentos, assim esfregando a sua zona genital na menor; após, o arguido levantou-lhe a camisola e o soutien, colocou o pénis nos seios daquela e ejaculou, enquanto a menor chorava.

    13. Não obstante o incómodo sempre manifestado pela menor CC na continuação desses comportamentos por parte do arguido, este persistiu nos seus intentos, repetindo tal atuação inúmeras vezes, até finais de novembro de 2014, convencendo a menor a sujeitar-se a tais atos.

    14. Em todas as referidas ocasiões o arguido logrou manter com a menor CC os supra descritos atos de natureza sexual, aproveitando-se da relação de proximidade que sobre a menor tinha, da sua imaturidade e da sua menor capacidade para compreender o significado e a gravidade de um envolvimento de cariz sexual, fruto da sua tenra idade.

    15. Conhecedor da idade da menor CC, quis e conseguiu o arguido manter, de forma repetida, com ela, os descritos atos de natureza sexual, assim violando o direito desta à sua autodeterminação sexual e prejudicando o livre e harmonioso desenvolvimento da respetiva personalidade, para satisfação dos seus próprios desejos sexuais.

    16. No verão de 2014, entre os dias 14 e 17 de agosto, numa altura em que decorriam as festas do ..., em honra de ..., ao final da tarde, o arguido, determinado a manter com a menor CC, contra a vontade desta, relações sexuais de cópula, levou a menor para o gabinete da Junta, baixou as calças e as cuecas e ordenou à menor que baixasse as dela; perante a recusa da CC, o arguido agarrou-a pelos cabelos, empurrou-a contra uma parede, baixou-lhe os calções e as cuecas e introduziu parte do pénis ereto na vagina da menor, causando-lhe dor, tudo ao mesmo tempo que a menor chorava, tentava fechar as pernas e se debatia para que o arguido parasse com a sua conduta. Após, o arguido retirou o pénis da vagina da menor e ejaculou para dentro de um caixote de lixo que ali se encontrava.

    17. Ao atuar da forma descrita quis e conseguiu o arguido, por meio de violência e força física, constranger a menor, cuja idade conhecia, que estava impossibilitada de resistir, a sofrer cópula, bem sabendo que o fazia contra a vontade da mesma, assim violando o direito daquela à sua liberdade e autodeterminação sexual, para satisfação dos seus instintos libidinosos.

    18. Fê-lo ainda aproveitando-se da relação de proximidade, assim facilitando o cometimento destes factos.

    19. No verão de 2014, entre os dias 14 e 17 de agosto, numa altura em que decorriam as festas do ..., em honra de ..., no mesmo dia em que ocorreram os factos referidos em 17, o arguido levou a menor para passar a noite na sua casa, situada na Rua ..., em ....

    20. Já à noite, no sofá da sala, enquanto a menor estava a dormir, o arguido baixou-lhe as calças e introduziu parcialmente o seu pénis ereto no ânus daquela, causando-lhe dor, altura em que a menor acordou.

    21. Nessa altura o arguido disse-lhe “cala-te ou levas no focinho”.

    22. O arguido agiu com o propósito concretizado de sujeitar a menor a coito anal, aproveitando-se do facto de esta se encontrar a dormir e...

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