Acórdão nº 2851/19.3YRLSB-B.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Julho de 2022

Magistrado ResponsávelJORGE ARCANJO
Data da Resolução14 de Julho de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO 1.1.A Requerente - Conocophilips Gulf of Para BV ( CGP ), com sede comercial em New Babylon Gardens, Anna van Buerenplein 41, 2595, da Den Haag, Paises Baixos- instaurou acção de revisão de sentença arbitral estrangeira, com forma de processo especial, contra as Requeridas: Corporación Venezoelana del Petrólleo SA ( CVP), com sede na Avenida ..., E..., ..., Venezuela.

Petróleos de Venezuela S.A. (PDVSA), com sede na Avenida ..., E..., ..., Venezuela.

Pediu o reconhecimento da sentença arbitral estrangeira proferida em 29 de Julho de 2019, em Nova Iorque, Estados Unidos da América.

“Nestes termos e nos demais de Direito aplicável, deve a presente ação de reconhecimento de sentença estrangeira ser julgada procedente, por provada, com a consequente declaração de reconhecimento da sentença arbitral proferida em 29 de julho de 2019, em Nova Iorque, nos Estados Unidos da América.

Valor: € 49.607.277,50 (quarenta e nove milhões, seiscentos e sete mil, duzentos e setenta e sete euros e cinquenta cêntimos)”.

1.2. – As Requeridas e o Ministério público não deduziram oposição.

1.3. – A Relação de Lisboa, por decisão singular de 15/1/2021, decidiu “Pelo exposto, julga-se procedente a pretensão da requerente e, em consequência, reconhece-se o acórdão arbitral proferido a 29/07/2019, na cidade de Nova Iorque, Nova Iorque (EUA), no processo arbitral tramitado junto da Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional, sob o n.º 22527/ASM/JPA, em que as requeridas foram condenadas a: i/ restituírem à requerente a parcela do empréstimo concedido pela requerente à CVP, no montante de 33.700.000 USD; ii/ com juros desde 22/10/2002 até à data do pagamento total e final, à taxa LIBOR mais 1% por ano; e iii/ reembolsar à requerente 213.302,55 EUR, sem juros pré- ou pós-decisão.

Custas pela requerente.

Notifique a requerente e envie carta registada com a/r às requeridas, com cópia desta sentença e do despacho de 13/12/2020, depois de devidamente traduzidos para castelhano pela requerente.” 1.4.- Em 4/11/2021, foi elaborada conta, liquidando o valor de € 604.199,86 como o total a pagar, descontando já a taxa de justiças pagas ( € 1.632,00).

1.5. – A Requerente, em 4/1/2022, reclamou contra a elaboração da conta, e pediu subsidiariamente a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça (nos termos do artigo 6 nº7 do RCP).

Alegou, em síntese: Por aplicação do art.3º da Convenção de Nova Iorque as custas a cobrar no âmbito das sentenças arbitrais estrangeiras são tendencialmente idênticas. Não “sensivelmente mais elevadas “às cobradas para o reconhecimento e execução de sentenças arbitrais nacionais. Ora como estas não carecem de ser reconhecidas, o seu custo é inexistente”.

Considera que a taxa de justiça autoliquidada, no valor de € 1.632,00, é suficiente, corresponde ao limite das custas cobráveis.

Subsidiariamente entende que o valor liquidado na conta é desproporcional, justificando-se a dispensa do remanescente, ao abrigo do art.6 nº7 RCP.

1.6. – Por decisão singular da Relação, 15/01/2022, decidiu-se: “Pelo exposto, indefere-se a reclamação da conta, mas defere-se parcialmente o pedido subsidiário, dispensando-se o pagamento de 90% da taxa de justiça remanescente (ou seja, reduzindo-o para 10% do valor da taxa de justiça remanescente).

Custas da reclamação/pedido de dispensa pelo CPGP, fixando-se, já tendo em conta a parcial procedência, a taxa de justiça em 2 UC, a que há que descontar a ½ UC já paga como impulso necessário à reclamação.” 1.7.- A Requerente reclamou para a conferência.

1.8.- Por acórdão de 28/4/2022, decidiu-se: “Pelo exposto, mantém-se a decisão singular reclamada, julgando a reclamação improcedente.

Custas da reclamação pela CPGP, que se fixam em 3 UC de taxa de justiça (artigos 527, nºs 1 e 2 do CPC e 7.º, n.º 4, do RCP e tabela II, penúltima linha, anexo ao mesmo), dada a extensão da reclamação e o trabalho implicado e levando-se em conta a taxa já paga pela CPGP como impulso necessário da reclamação”.

1.9. Inconformada, a Requerente recorreu de revista, com as seguintes conclusões:

  1. Ao aderir à Convenção de Nova Iorque, a República Portuguesa assumiu a obrigação de não cobrar custas “sensivelmente” mais elevadas do que as cobradas para o reconhecimento e execução de sentenças arbitrais nacionais.

  2. O facto de não existir um processo de reconhecimento de sentenças arbitrais nacionais determina, por um lado, que a República Portuguesa se obrigou a nada cobrar ou a cobrar pouco mais que nada para proceder ao reconhecimento de sentenças arbitrais estrangeiras.

  3. e, por outro, não afasta nem esvazia tal obrigação. Nada na Convenção de Nova Iorque ou nos seus trabalhos preparatórios indicia ou permite sustentar que tal tratado pressupõe que existiria um processo de reconhecimento de sentenças arbitrais nacionais.

  4. Contra o que antecede não se diga ainda que a ausência desse processo de reconhecimento determinaria que o referencial de comparação relevante seria o processo de anulação de sentenças arbitrais nacionais, uma vez que se trata de um processo - com finalidade e tramitação distintos-que nem sequer é regulado pela Convenção de Nova Iorque.

  5. Assim, a Convenção de Nova Iorque, que se aplica nos presentes autos, regula os termos da tributação da Recorrente, determinando como seu limite nada ou sensivelmente mais do que nada.

  6. Essa solução é, aliás, aceite no ordenamento jurídico interno nacional, visto que o RCP contém várias disposições que preveem isenções de tributação. g) O que antecede não fica maculado pelo facto de a Recorrente, para iniciar os presentes autos (à semelhança do que sucede quanto ao presente recurso) ter procedido à autoliquidação da taxa de justiça, uma vez que tal autoliquidação é imposta pelo Portal CITIUS para que se possa proceder a este tipo de impulso processual.

  7. Ao proceder desse modo, como é evidente, a Recorrente não renunciou ao que decorre do artigo 3.2 da Convenção de Nova Iorque.

  8. Conclui-se, por isso, que, quer a Conta, quer a o Acórdão recorrido, violam a Convenção de Nova Iorque, motivo pelo qual se impõe - sob pena de violação, pela República Portuguesa, de tratado internacional e de insanável inconstitucionalidade por violação do princípio do primado do direito internacional -a sua revogação, o que se requer.

    Quanto ao indeferimento parcial do pedido de dispensa: j) O Requerimento Inicial de reconhecimento foi instruído com cinco documentos, todos devidamente identificados e acompanhados das respetivas traduções, que se encontravam certificadas por advogado e pelo tradutor.

  9. A junção dos documentos através de correio eletrónico foi feita depois de a aplicação CITIUS ter evidenciado um problema técnico, que a Recorrente provou nos autos ter existido. A receção de vários correios eletrónicos justifica-se, igualmente, pelo facto de o servidor do Tribunal não ter acusado o respetivo recebimento.

    l). Em todo o caso, dado que os cinco documentos juntos aos autos se encontravam devidamente organizados e identificados, nenhuma dificuldade de monta se colocou, a esse respeito, ao Tribunal a quo ou à sua secretaria.

  10. A dimensão dos cinco documentos juntos aos autos-como aliás resulta do Requerimento Inicial - não atesta da complexidade dos presentes autos, mas, quando muito, da complexidade do processo arbitral tramitado e concluído sob a égide do mais experimentado e reputado centro de arbitragem internacional, por alguns dos mais distintos árbitros e que foi alvo de escrutínio desse centro prévio à sua prolação.

  11. A complexidade da causa não pode ser aferida pela dimensão dos cinco documentos juntos aos autos. A complexidade, entende a Recorrente, afirmar-se-á sempre que, atento o tipo de processo e as matérias aí tipicamente trazidas à colação, o concreto processo se tenha afigurado mais complexo do que outros processos da mesma tipologia.

  12. Manifestamente não é esse o caso dos presentes autos: não houve contraditório, a proveniência da sentença arbitral oferece garantias substanciais da sua regularidade e a regra vigente no ordenamento jurídico nacional é a do reconhecimento, salvo em casos excecionais.

  13. O controlo da conformidade do resultado da sentença arbitral reconhecida com a ordem pública internacional do Estado Português é uma questão comum a todos os...

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