Acórdão nº 055/22.7BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Julho de 2022
Magistrado Responsável | CLÁUDIO RAMOS MONTEIRO |
Data da Resolução | 14 de Julho de 2022 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
ACORDAM NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO 1.
O MUNICÍPIO DA TROFA - identificado nos autos – requereu a este Supremo Tribunal Administrativo uma providência cautelar de suspensão da eficácia de regulamento administrativo contra a PRESIDÊNCIA DO CONSELHO DE MINISTROS, em que pede que seja «decretada a suspensão de eficácia da norma regulamentar administrativa do nº 2 do artigo 76º do Decreto-Lei nº 21/2019, de 30 de janeiro, na sua versão do Decreto-Lei n.º 56/2020 de 12 de agosto, que determina a transferência de competências para os órgãos municipais do requerente Município da Trofa na área da educação, com início em 1 de Abril de 2022», pedindo igualmente que a mesma norma seja suspensa «provisoriamente, e no prazo de 48 horas».
O seu Requerimento Inicial foi apresentado em substituição do original, nos termos do n.º 3 do artigo 116.º do CPTA, dado que aquele que havia inicialmente apresentado contra o Ministério da Educação foi liminarmente indeferido.
Nesse Requerimento alega, em síntese, que o processo de transferência de competências do Estado para as autarquias locais no domínio da educação não foi acompanhado das verbas necessárias à sua concretização, o que provocará um défice de aproximadamente um milhão de euros nas contas do Município da Trofa.
Mais alega que, não tendo o referido município fundos próprios para o amortizar, esse défice «implicará a curto prazo a sua asfixia financeira, patrimonial e de funcionamento, com reflexos muito negativos nos serviços que presta a toda a população em diferentes domínios».
Por outro lado, considera que «o Decreto-Lei n.º 21/2019, na versão do Decreto-Lei n.º 56/2020, é ilegal por conter normas regulamentares ilegais, por não concretizarem em conformidade com o regime quadro as garantias, princípios e direitos acima referidos constantes na Lei 50/2018, de 16 de Agosto».
2.
A Requerida opôs-se ao decretamento das providências requeridas, invocando a exceção da «incompetência absoluta da jurisdição administrativa» por, nos termos do alínea a) do n.º 3 do artigo 4.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), estar excluída do âmbito da jurisdição administrativa a apreciação dos litígios respeitantes a atos praticados no exercício da função legislativa, e impugnou a verificação, no caso, dos requisitos de procedência dos processos cautelares, concluindo pela rejeição das providências ou, a assim se não entender, pela sua improcedência.
3.
O Requerente respondeu à invocada exceção, defendendo que o Decreto-Lei n.º 21/2019, de 30 de janeiro, contém normas regulamentares aprovadas no âmbito da função administrativa, pelo que «é contenciosamente impugnável, sendo a jurisdição administrativa competente para o efeito».
4.
Sem vistos, dada a natureza urgente do processo, nos termos da alínea f) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 36.º do CPTA.
I - Saneamento do Processo 5.
Findos os articulados, e observado o princípio do contraditório quanto à matéria de exceção, impõe-se proceder ao saneamento do processo, para o que se dispensa a realização de quaisquer diligências instrutórias ou de produção de prova – artigos 118.º do CPTA, 367.º e 410.º e seguintes do CPC2013.
6.
A exceção invocada pela Requerida prende-se com a natureza jurídica do ato suspendendo, uma vez que o mesmo se contém formalmente num decreto-lei, que a Constituição da República Portuguesa qualifica expressamente como legislativo, nos termos do n.º 1 do seu artigo 112.º.
Diz aquela entidade que «não existem, no ordenamento jurídico português, regulamentos praticados sob a forma de lei, precisamente porque a lei se carateriza pelo órgão que a emite, pela forma e pelo procedimento (sem necessidade de distinguir aqui os diversos critérios avançados pela doutrina para o conceito de lei)».
Pelo que, estando a impugnação de atos da função legislativa expressamente excluídos do âmbito da jurisprudência administrativa e fiscal, nos termos da alínea a) do n.º 3 do artigo 4.º do ETAF, conclui pela incompetência absoluta deste Tribunal.
O Requerente contrapõe que o n.º 2 do artigo 76.º do Decreto-Lei n.º 21/2019, cuja suspensão requer, limita-se a «concretizar» uma transferência de competências já previamente definida pelos artigos 13º, 14.º, 31.º, 32.º, e 33.º da Lei-Quadro...
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