Acórdão nº 621/21.8T8FNC.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 21 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelLUÍS FILIPE PIRES DE SOUSA
Data da Resolução21 de Junho de 2022
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO GG e mulher HH e MM intentam ação declarativa comum contra Município do NN, formulando os seguintes pedidos: « A)–Serem os AA. reconhecidos como comproprietários do prédio misto descrito sob o n.º (...), inscrito na respetiva matriz urbana sob o artigo (...) e rústica sob o artigo 78/2 da secção AO, localizado ao Poço do Gil, Freguesia de NN; B)–Reconhecer-se que o leito do acesso que atravessa o referido prédio, identificado no artigo 11.° desta petição inicial, faz parte integrante desse prédio; C)–Declarar a natureza privada dessa faixa de terreno que o atravessa.» Fundamentando tais pedidos, alegam que são comproprietários do prédio misto em causa (por escritura de divisão de coisa comum de 19.11.2007), tendo iniciado, em 2020, obras de conservação e melhoramento da edificação existente no prédio bem como o logradouro, tendo executado um muro de vedação. O Município de NN entende que existe uma vereda pública (acesso público pedonal), cujo leito atravessa o prédio em causa. Os autores não aceitam a existência dessa vereda pública, sendo que o acesso em questão nunca foi público.

O Município do NN contestou por exceção e deduziu pedido reconvencional. Deduziu a exceção dilatória da incompetência material do tribunal, impugnou e deduziu pedido reconvencional nestes termos: «declarando-se o Município de NN como proprietário e legítimo possuído da Vereda (...) em toda a sua longitude, mesmo a parcela no sentido noroeste-sudeste, nos termos do nº2 da alínea a) do artigo 266º do Código de Processo Civil, conjugado com os artigos 1287º e 1296º do CC.

» Em 30.8.2021, foi proferida a seguinte decisão: «Findos os articulados, cumpre proferir os seguintes despachos.

* Fixo o valor da ação em € 5.000,01 (cinco mil euros com um cêntimo) - cfr. artigos 306.º, n.º 2 e 297.º, n.º 1 ambos do Código de Processo Civil.

* Da Dispensa da Audiência Prévia (artigo 593º, nº 1 do CPC) Atendendo a que a audiência prévia, a realizar, teria por fim, apenas, o indicado na alínea d), do n.º1 do artigo 591.º, do CPC, tendo sido cumprido o contraditório, dispenso a realização da mesma.

* Despacho a que alude o n.

º 1, do art. 595.

º, do CPC O tribunal é competente em razão da nacionalidade.

Da (in)competência material: GG e HH, intentaram a presente ação com processo comum contra “Município de NN”.

Analisando o requerimento inicial, a contestação e documentos juntos, verificamos que, tal como configurada pela A., a presente ação assenta numa divergência entre AA. e R. quanto à dominialidade de uma parcela de terreno, configurada pelo Município como “domínio público”, configuração não aceite pelos AA. pretendendo incorporar tal “caminho” em prédio de sua propriedade.

Foi apresentada contestação a qual, no mais, deduziu a exceção da incompetência material, entendendo que o Tribunal Administrativo e fiscal (...) é o competente para o efeito.

Cumprido o contraditório vieram os AA. pugnar pela improcedência da referida exceção, devendo os autos prosseguir os seus termos.

O Réu é um órgão do poder local.

Com a última reforma da jurisdição administrativa de 2002, entrada em vigor em 01.01.2004, a jurisdição administrativa viu substancialmente alargado o seu âmbito, passando os tribunais administrativos a ser referidos como os tribunais comuns desta jurisdição, o que significa que todos os litígios que versem sobre uma relação jurídica administrativa, que não estejam expressamente atribuídos por lei a outra jurisdição, caem no seu âmbito.

Em causa nos presentes autos, relembra-se, está uma faixa de terreno, configurada pelo Município réu como de domínio público (caminho/vereda pública), com número de polícia, que se situa na área da sua circunscrição territorial tendo, portanto, a aparência de bem do domínio público local, que se encontra, como tal, submetido a um estatuto especial de direito público, caracterizado pela inalienabilidade, imprescritibilidade e impenhorabilidade e que, nessa medida, goza de um regime de Direito Administrativo que outorga especiais poderes e deveres à Administração, no caso à administração local, dirigidos à prossecução da função pública servida por esse bem.

Ora, resulta do disposto no artigo 212.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa (CRP) bem como do artigo 1.º, n.º1 do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) que compete à jurisdição administrativa julgar os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas.

Uma relação jurídica administrativa será aquela que confere poderes de autoridade ou impõe restrições de interesse público à administração perante particulares, ou aquela que atribui direitos ou impõe deveres públicos aos particulares perante a administração, sendo que, a manutenção/conservação da relação contratual emergente dos autos assume natureza de interesse público.

Assim, a ação de preferência baseada numa relação jurídica administrativa, consubstancia-se numa ação cujo conhecimento é da competência dos tribunais administrativos e fiscais.

Perante o quadro jurídico que regula o regime substantivo do contrato em apreço, temos de concluir que nos termos do disposto nos artigos 1.º e 4.º, al o) do ETAF, é dos Tribunais Administrativos a...

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