Acórdão nº 0792/18.0BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 08 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelANABELA RUSSO
Data da Resolução08 de Junho de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acórdão 1. RELATÓRIO 1.1. Banco Y….. S.A. recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a impugnação judicial por ela apresentada na sequência do indeferimento tácito da reclamação graciosa que deduziu contra a autoliquidação da Contribuição sobre o Sector Bancário (CSB) relativamente ao ano de 2017, no valor de €2.983,975,40.

1.2.

O recurso foi admitido, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou as alegações, com conclusões do seguinte teor: «I.

O presente recurso vem interposto da Douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo, a qual declarou totalmente improcedente a impugnação judicial; II.

Ora, conforme se avançou, a CSB padece de inconstitucionalidade indireta pela circunstância de a Portaria CSB, concretamente, o respetivo artigo 6.º, violar os artigos 3.º, 4.º e 5.º do Regime CSB, sendo o mesmo aprovado por uma lei de valor reforçado (o artigo 141.º da Lei do Orçamento do Estado para 2011), por violação do disposto no artigo 112.º, n.º 3, da Constituição; III.

Isto porque o artigo 6.º da Portaria CSB determina que a base de incidência da CSB seja calculada “por referência à media anual dos saldos finais de cada mês, que tenham correspondência nas contas aprovadas no próprio ano em que é devida a contribuição,” ao passo que o artigo 3.º do Regime CSB estabelece como base de incidência objetiva o passivo apurado pelo sujeito passivo, que só poderá ser o que respeita a todo o exercício económico, findo, no caso do Recorrente, a 31 de dezembro; IV.

Ou seja: estão em causa bases de incidência distintas; V.

Contudo, ainda que assim não fosse – o que apenas por cautela e a benefício de raciocínio se admite, sem conceder –, sempre haveria que concluir pela anulabilidade da autoliquidação da CSB em crise, com fundamento na respetiva inconstitucionalidade material; VI.

É que, face ao disposto nos artigos 2.º, 3.º e 4.º do Regime CSB, bem como nos artigos 4.º e 5.º da Portaria CSB, falha inapelavelmente o teste da bilateralidade potencial, o que, viola, desde logo, o princípio da equivalência, com assento no artigo 13.º da Constituição, porquanto não decorrem do respetivo pagamento, para o Recorrente, quaisquer benefícios, sequer eventuais ou difusos; VII.

Com efeito, no contexto atual em que existe já o Mecanismo Único de Resolução, qualquer medida de resolução que fosse aplicável ao Recorrente – o que, obviamente, não se antevê – nunca tal medida seria “suportada” através da coleta da CSB, quer a anterior, quer atual, quer futura; VIII.

Mais: também se for qualificada como um imposto, como defende o Tribunal de Contas, os artigos 2.º, 3.º e 4.º do Regime CSB, e 4.º e 5.º da Portaria CSB violam o princípio da capacidade contributiva como corolário do princípio da igualdade tributária, previsto no artigo 103.º da Constituição, na medida em que se encontra estruturada de um modo absolutamente alheio a tais critérios; IX.

Razão pela qual, também neste plano, a sua incidência sobre o Recorrente revela a manifesta inconstitucionalidade do disposto nos artigos 2.º, 3.º e 4.º do Regime CSB, e 4.º e 5.º da Portaria CSB, por violação do princípio da igualdade, decorrente do artigo 13.º da Constituição, nas vertentes da justiça, universalidade e uniformidade na repartição dos encargos públicos, ou da equivalência, funcionalizado pelo princípio da proporcionalidade, com assento no mesmo artigo 13.º da Constituição, inquinando irremediavelmente a autoliquidação da CSB, que também por este motivo haveria sempre de ser anulada; X.

Acresce que os artigos 2.º, 3.º e 4.º do Regime CSB, e 4.º e 5.º da Portaria CSB são, ainda, inconstitucionais por violação do princípio da capacidade contributiva, na medida em que para efeitos das normas de incidência da CSB, a efetiva capacidade de suportar o encargo com este imposto se mostra absolutamente irrelevante; XI.

Adicionalmente, a autoliquidação da CSB de 2017 é ilegal e, indiretamente, inconstitucional, na medida em que os artigos 2.º e 3.º do Regime CSB e os artigos 2.º e 3.º da Portaria CSB violam o princípio do primado da União Europeia positivado no artigo 8.º da Constituição, porque o Regime CSB e a Portaria CSB violam o Direito da União Europeia – em concreto, a Diretiva 2014/59/UE, porquanto não é avaliado ou ponderado, no apuramento do quantum da CSB a pagar, o grau de risco concreto de cada uma das entidades participantes no Fundo de Resolução; XII.

E violam ainda o Regulamento MUR, porque com a harmonização no plano comunitário das contribuições sobre o setor bancário deixou de ser possível aos Estados-Membros a manutenção da cobrança de contribuições de resolução domésticas, para além e em cumulação com as instituídas pelo Direito da União Europeia, sendo, aliás, expressa a preocupação do referido Regulamento MUR em prevenir duplos pagamentos, bem como a desconsideração pela possibilidade de existência de contribuições de resolução nacionais após 2 de julho de 2014; XIII.

O Direito da União Europeia estabelece diversos critérios, amplamente descritos no artigo 103.º da Diretiva 2014/59/UE e melhor concretizados pelo Regulamento Delegado, que se aplicam quer às contribuições ex ante, quer às contribuições ex post, por força do disposto no artigo 104.º da Diretiva 2014/59/EU; XIV.

Sendo que, após o decurso do prazo para transposição da primeira – o que, em concreto, acabou por suceder através do Decreto-Lei n.º 23-A/2015, de 25 de março – o legislador nacional não pode manter no ordenamento jurídico interno uma contribuição como a CSB, que não releve tais critérios; XV.

Disposição a que acresce o disposto no considerando 29 do Regulamento MUR, que prevê que, “Para o bom funcionamento do mercado interno, é indispensável que as mesmas regras sejam aplicáveis a todas as medidas de resolução, independentemente de serem tomadas pelas autoridades de resolução ao abrigo da Diretiva 2014/59/UE ou no quadro do MUR. A Comissão deverá analisar essas medidas ao abrigo do artigo 107.º do TFUE.”; XVI.

O mesmo sucede, aliás, com a demonstrada falta de dedução dos passivos intragrupo, para efeitos de cálculo da CSB, tal como resulta do disposto no artigo 5.º, n.º 1, al. a), do Regulamento Delegado, que não tem qualquer correspondência com o Regime CSB (nem com o respetivo artigo 3.º, nem outro); XVII.

São estas, pois, as normas que permitem demonstrar a violação do Direito da União Europeia, por um lado, e a violação do princípio do primado, ínsito no artigo 8.º da Constituição da República Portuguesa, e que determinam, para além do mais, a inconstitucionalidade do disposto nos artigos 2.º e 3.º do Regime CSB e do artigo 2.º e 3.º da Portaria CSB; XVIII.

Em paralelo, a autoliquidação da CSB de 2017 revela-se ainda desconforme com o artigo 1.º do Primeiro Protocolo à CEDH, por articulação com o artigo 14.º da CEDH, e indiretamente com o artigo 8.º, n.º 2, da Constituição, por manifesta inexistência de quaisquer prestações públicas presumíveis ou potenciais cuja provocação ou aproveitamento sejam seguros numa ótica de grupo para o Recorrente, o que determina a inconstitucionalidade indireta dos artigos 2.º, 3.º e 4.º do Regime CSB, aprovado pelo artigo 141.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, bem como dos artigos 4.º e 5.º da Portaria CSB, na redação em vigor em 2017; XIX.

Sendo, em qualquer caso, de concluir ainda pela anulação da autoliquidação da CSB de 2017, dada a sua ilegalidade, por violação do disposto no artigo 31.º, n.º 2, da LOE Anterior, e no artigo 106.º, n.º 1, da Constituição, por estar em causa um cavaleiro orçamental cujo caráter de permanência põe em causa a reiterada prorrogação do respetivo regime em sucessivas Leis do Orçamento do Estado; XX.

Pelo que, e em suma, deve a anulabilidade da autoliquidação da CSB de 2017 ser declarada, sendo o valor pago restituído ao Recorrente, acrescido de juros indemnizatórios, ao abrigo do disposto no artigo 43.º da LGT».

1.3.

Não foram apresentadas contra alegações.

1.4.

Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo foi, pelo Excelentíssimo Procurador-Geral-Adjunto emitido parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, destacando-se da sua fundamentação o seguinte: «- Salvo o devido respeito por diversa posição, afigura-se-nos não caber aqui razão ao Recorrente.

Vejamos O artigo 141.º da Lei 55-A/2010, de 31/12 (LOE 2011), em vigor em 01/01/2011, aprovou o regime que cria a CSB O artigo 182.º da Lei 64-B/2011, de 30/12 (LOE 2012) prorrogou o regime em causa e alterou o normativo do artigo 3.º/a), sendo que o artigo 252.º da Lei 66-B/2012 (LOE 2013), de 31/12, prorrogou o regime para o ano de 2013.

Na sequência das alterações operadas pelo artigo 182.º da Lei 64-B/2011, a Portaria 77/2012, de 26/03 alterou os artigos 3.º/a) e 4.º/ c) da Portaria 121/2011 (que veio regulamentar e estabelecer as condições de aplicação da CSB).

No artigo 1.º do referido artigo 141.º é definido o objeto de tal regime, no artigo 2.º é definida a incidência subjetiva, no artigo 3.º é definida a incidência objetiva, no artigo 4.º é definida a taxa entre um limite mínimo e um limite máximo, no artigo 5.º é regulada a liquidação, no artigo 6.º o pagamento da contribuição e o artigo 7.º define o direito subsidiário aplicável.

O DL 31-A/2012, de 10/02 aditou ao RGICSF os artigos 153.º/a) a 153.º-U, por via dos quais foi criado o Fundo de Resolução.

O Fundo de Resolução tem por objeto prestar apoio financeiro à aplicação de medidas de resolução adotadas pelo Banco de...

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