Acórdão nº 440/22 de Tribunal Constitucional (Port, 09 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelCons. Lino Rodrigues Ribeiro
Data da Resolução09 de Junho de 2022
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 440/2022

Processo n.º 425/22

3.ª Secção

Relator: Lino Rodrigues Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Guimarães, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, o primeiro veio interpor recurso de constitucionalidade, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC).

Depois de várias vicissitudes processuais, o ora recorrente foi condenado na 1.ª instância numa pena de multa 150 (cento e cinquenta) dias à razão diária de € 6 (seis), perfazendo um total de € 900 (novecentos), pela prática de um crime de burla, p. e p. pelo disposto no artigo 217.º, n.º 1, do Código Penal, bem como no pagamento de uma indemnização civil no valor de € 1.902 (mil novecentos e dois).

Interpôs recurso para o Tribunal da Relação, que, por acórdão datado de 10 de janeiro de 2022, declarou extinto o procedimento criminal e confirmou a sentença recorrida na parte relativa à indemnização civil.

Requereu então a reforma e a aclaração desse acórdão, requerimento que foi julgado totalmente improcedente pelo mesmo Tribunal da Relação, por acórdão datado de 21 de março de 2022.

2. O recorrente vem então interpor recurso de constitucionalidade, nos seguintes termos:

«A., melhor identificado nos termos do processo em título em que é Recorrente,

vem, pelo presente e perante V. Exa., aduzir do Acórdão promanado de 10/1/2022 aclarado pelo Acórdão de 21/3/2022),

RECURSO PARA O TRIBUNAL CONSTITUCIONAL

A decisão recorrida é agora irrecorrível em termos ordinários;

Donde, não mais resta do que ao aqui Recorrente interpor da mesma RECURSO para o Tribunal Constitucional ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei Constitucional e com fundamento na inconstitucionalidade da:

a) interpretação do artigo 412.º, n.ºs 2, 3 e 4 do CPP, no sentido de ser considerado incumprimento do ónus de impugnação especificada em razão de nas conclusões o Recorrente apenas remeter para os suportes técnicos e para a totalidade das declarações prestadas, sem os concretos e precisos locais da gravação apesar destes estarem indicados no corpo das alegações e transcritos, por violação dos princípios da proporcionalidade, defesa e equidade;

b) interpretação do artigo 412.º do CPP por violação dos princípios da proporcionalidade, defesa e equidade, no sentido de não cumprir o ónus de impugnação especificada o Recorrente que, nas suas alegações, transcreve os trechos dos depoimentos gravados por referência aos tempos dos mesmos, apesar de não os indicar nas Conclusões;

c) interpretação normativa do artigo 412.º do CPP, que importa a decisão de incumprimento dos ónus que nele se preveem, sem que ao Recorrente seja facultada oportunidade processual de suprir o vício detetado, por violação dos princípios da proporcionalidade, defesa e equidade;

d) interpretação normativa do artigo 412.º do CPP no sentido que não se tem cumprido o ónus de impugnação especificada em razão de nas conclusões, o Recorrente apenas remeter para os suportes técnicos e para a totalidade das declarações prestadas, sem os concretos e precisos locais da gravação apesar destes estarem indicados no corpo das alegações e sem que seja proferido despacho de aperfeiçoamento, por violação os princípios da proporcionalidade, defesa e equidade;

Estas interpretações são, aliás, confessadas pela decisão aclaradora de 21/3/2022;

Em não se considerando estas interpretações inconstitucionais, fere-se o núcleo essencial do direito ao recurso enquanto garantia de defesa e equidade em processo criminal, consagrado nos artigos 32.º n.º 1 e 20.º, n.º 4 da Constituição conjugado com o artigo 18.º, n.º 2 desta lei fundamental, porquanto se nega ao Recorrente a plena apreciação dos fundamentos que o mesmo legitimamente carreou para a instância de recurso, numa interpretação desproporcionada.

Na verdade, para além de não ter havido qualquer convite ao aperfeiçoamento, o Recorrente indicou os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida e as provas que devem ser renovadas, mais tendo indicado nas conclusões os depoimentos por referência aos registos gravados e, ao longo do corpo das alegações, as concretas passagens da prova gravada em audiência de julgamento em que funda a sua impugnação e acrescentou, adicionalmente, a sua transcrição.

Inconstitucionalidade invocada na peça processual de Esclarecimento/Reclamação.»

3. Através da Decisão Sumária n.º 339/2022, foi decidido não conhecer o objeto desse recurso, com base na ausência de suscitação prévia das questões de constitucionalidade e, de todo o modo, com base no princípio da instrumentalidade dos recursos de fiscalização concreta, por se ter entendido que um eventual juízo de inconstitucionalidade não se poderia projetar sobre a solução a dar ao caso, uma vez que a decisão recorrida assentou numa suficiente fundamentação alternativa que sempre ditaria o mesmo sentido decisório.

Foi a seguinte a fundamentação apresentada:

«4. No requerimento de interposição de recurso, indica-se que o mesmo vem interposto «do Acórdão promanado de 10/1/2022 aclarado pelo Acórdão de 21/3/2022». Admitindo que a decisão recorrida seria o primeiro de tais acórdãos, prontamente se concluiria pela impossibilidade de conhecer o objeto do presente recurso, desde logo porque as questões de constitucionalidade dele constantes não foram suscitadas previamente à prolação desse acórdão, mas apenas – como de resto se nota no próprio requerimento de interposição de recurso – «na peça processual de Esclarecimento/Reclamação». Isso significa, em face o disposto no artigo 72.º, n.º 1, alínea b), e n.º 2, da LTC, que o recorrente careceria de legitimidade para interpor recurso dessa decisão para este Tribunal Constitucional.

5. De facto, as questões de constitucionalidade aqui em causa apenas foram colocadas ao tribunal recorrido no requerimento que está na origem da prolação do acórdão de 21 de março e apenas neste acórdão foram consideradas.

Apesar disso, o objeto do recurso não pode ser conhecido. Esse objeto – recorde-se – é integrado pelas seguintes questões:

«a) interpretação do artigo 412.º, n.ºs 2, 3 e 4 do CPP, no sentido de ser considerado incumprimento do ónus de impugnação especificada em razão de nas conclusões o Recorrente apenas remeter para os suportes técnicos e para a totalidade das declarações prestadas, sem os concretos e precisos locais da gravação apesar destes estarem indicados no corpo das alegações e transcritos, por violação dos princípios da proporcionalidade, defesa e equidade;

b) interpretação do artigo 412.º do CPP por violação dos princípios da proporcionalidade, defesa e equidade, no sentido de não cumprir o ónus de impugnação especificada o Recorrente que, nas suas alegações, transcreve os trechos dos depoimentos gravados por referência aos tempos dos mesmos, apesar de não os indicar nas Conclusões;

c) interpretação normativa do artigo 412.º do CPP, que importa a decisão de incumprimento dos ónus que nele se preveem, sem que ao Recorrente seja facultada oportunidade processual de suprir o vício detetado, por violação dos princípios da proporcionalidade, defesa e equidade;

d) interpretação normativa do artigo 412.º do CPP no sentido que não se tem cumprido o ónus de impugnação especificada em...

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