Acórdão nº 426/22 de Tribunal Constitucional (Port, 07 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelCons. Teles Pereira
Data da Resolução07 de Junho de 2022
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 426/2022

Processo n.º 329/2022

1.ª Secção

Relator: Conselheiro José António Teles Pereira

Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – A Causa

1. A. (o ora reclamante) foi condenado, em primeira instância (processo número 39/21.2GBCCH, do Juízo de Competência Genérica de Coruche), na pena de 6 meses de prisão efetiva, pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal.

1.1. Desta decisão recorreu o arguido para o Tribunal da Relação de Évora, que, por acórdão de 09/11/2021, negou provimento ao recurso.

1.1.1. Notificado desse acórdão, o arguido dele apresentou “reclamação”, invocando a respetiva nulidade por falta de fundamentação e “inconstitucionalidade por violação do princípio da presunção de inocência”. Quanto a este desvalor, alegou o seguinte:

“[…]

Da inconstitucionalidade por violação do princípio da presunção de inocência

9. Alegou ainda o Recorrente que não comete qualquer crime há cerca de uma década – v. conclusão 5 – assim lançando mão de mais um argumento contra a execução da pena de prisão.

10. Veio esta Veneranda Relação responder que (transcrição): “o recorrente alega factos – conclusões 5.ª a 8.ª – que sequer se demonstram nos autos. Não está demonstrado que o arguido não comete crimes desde 2012, sobe-se apenas que não é condenado desde 2012”.

11. Ora, sabemos que o Recorrente não comete crimes desde 2012, pois só nessa data que se situa, cronologicamente, a sua última condenação.

12. O argumento de que não se sabe se comete ou não crimes neste hiato temporal, apenas se sabendo que não ó condenado, para além de uma inaceitável especulação, constitui uma violenta afronta ao princípio da presunção de inocência, constante da norma do artigo 32.º, n.º 2, da Constituição.

13. Verifica-se, pois, uma inconstitucionalidade do Acórdão nesta parte, e cumpre expurgar.

[…]”.

1.1.2. Por acórdão de 16/12/2021, a nulidade foi desatendida.

1.1.3. O arguido recorrente requereu, ainda, a aclaração do acórdão, o que viu indeferido, com fundamento no trânsito em julgado da decisão, “[…] pois que pedidos de aclaração não suspendem prazos de recurso ou reclamação […]”, acrescentando que “[…] não há que ‘aclarar’ decisão transitada em julgado”.

1.1.4. O recorrente interpôs, então, recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, nos termos seguintes:

“[…]

[Não] se conformando com o Douto Acórdão desta Veneranda Relação de Évora, na parte em que não conheceu da inconstitucionalidade por violação do princípio da presunção de inocência, previsto no artigo 32.º, n.º 2, da CRP, vem nos termos dos artigos 70.º, n.ºs 2 e 4, 72.º, n.º 1, alínea b), e 75.º, n.º 1, da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional, requerer a V.ª Ex.ª que admita a interposição do recurso previsto no artigo 280.º, n.º 1, alínea b), da Lei Fundamental e no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da referida Lei Orgânica, pelo seguinte:

1. Perante a Veneranda Relação de Évora, o recorrente invocou, entre o mais, o vício de inconstitucionalidade, por violação do princípio da presunção de inocência, na aplicação do artigo 43.º do Código Penal (Regime de Permanência na Habitação) quando se afirma, para afastar aquele regime de cumprimento de pena, que “a inexistência de condenações não permite afirmar a não prática de crimes”.

2. O Recorrente expressamente invocou a referida inconstitucionalidade, embora o Venerando Tribunal da Relação de Évora nada tenha dito neste conspecto.

3. Ademais, ainda a propósito da aplicação do regime previsto no artigo 43.º do Código Penal, no Acórdão proferido podem ser lidas expressões como “suposta pandemia”, “que se assiste a uma pandemia de não vacinados e não uma verdadeira pandemia, que já se transformou numa endemia, mas que se acena como forma de incutir o medo com vários fins, numa evidente nostalgia das sociedades fechadas”, e que a suposta pandemia é mero “obter dictum”,

6. Tendo o recorrente requerido a aclaração do Acórdão proferido quanto à matéria da pandemia – e do perigo que a mesma constitui para o condenado, pessoa com quase 80 anos – a Veneranda Relação de Évora não esclarece se o Venerando Desembargador relator nega a existência da pandemia e se a mesma tem ou não a virtualidade de impor a ponderação do regime de permanência na habitação.

7. No seu ver, e considerando a factualidade em apreço, a decisão proferida viola o dever de fundamentação plasmado no artigo 205.º/1 da CRP a aplicação do artigo 43.º do C. Penal no sentido de não substituir a pena de prisão pelo supra citado regime em que, tendo o condenado invocado perigo para a sua vida, se nega a existência da pandemia – facto científico insofismável.

8. Tal vício foi invocado na sequência da prolação do Acórdão da Veneranda Relação de Évora, que não conheceu do mesmo.

[…]” (sublinhados acrescentados).

1.2. No Tribunal da Relação de Évora, o requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional foi objeto de um despacho de não admissão, – que constitui a decisão ora reclamada –, com os fundamentos seguintes:

“[…]

Interposto recurso pelo arguido, por este TRE e por acórdão de 9 de novembro de 2021 foi decidido negar provimento ao recurso interposto e, consequentemente, manter a sentença recorrida.

O mandatário do recorrente foi notificado do acórdão a 10/11/2021.

O recorrente veio reclamar e deduzir uma inconstitucionalidade. Mais propriamente, se declarasse “a nulidade do acórdão por falta de fundamentação” e se julgasse verifica da a “inconstitucionalidade por violação do princípio da presunção de inocência, nos termos do artigo 32.º/2 da Constituição”.

Por acórdão de 16 de dezembro de 2021 negou-se provimento à reclamação.

Entretanto o arguido veio reclamar do indeferimento da reclamação, o que foi rejeitado.

Foi lavrada nos autos certidão de trânsito em julgado do acórdão a 25/11/2021.

A 21/01/2022, foi lavrado o seguinte despacho na sequência de segunda “aclaração” apresentada pelo recorrente: […] ‘…não há que aclarar decisão...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT