Acórdão nº 2515/19.8T8STB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 09 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução09 de Junho de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. n.º 2515/19.8T8STB.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal Juízo Local Cível de Setúbal – Juiz 1 Apelantes: (…) e (…) Apeladas: (…) – Companhia de Seguros, SA Caixa Geral de Depósitos, SA *** Sumário do Acórdão (Da exclusiva responsabilidade do relator – artigo 663.º, n.º 7, do CPC) (…) * Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora no seguinte: I – RELATÓRIO (...) e (…), residentes na Rua Dr. (…), n.º 40, Cv.-Ft., 2910-586 Setúbal, instauraram acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra (…), Companhia de Seguros, S.A., com sede no Largo do (…), n.º (…), 1249-001 Lisboa e Caixa Geral de Depósitos, S.A., com sede na Av. (…), n.º (…), 1000-300, Lisboa.

Peticionaram o pagamento das quantias pagas em excesso que se apurarem no âmbito do contrato de seguro ramo vida, acrescidas de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, a contar do efectivo desembolso, até integral pagamento, bem como a quantia de € 5.000,00, a título de danos morais sofridos, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, a contar da citação até integral pagamento.

Alegaram para o efeito, em suma, que celebraram com a 1.ª Ré um contrato de seguro de vida em Grupo por conta de contrato de crédito habitação existente com a 2.ª Ré com o n.º (…), cujo capital seguro no início do contrato (19/06/2009), correspondia a 100% do capital em dívida, ou seja, € 40.000,00, acrescentando que as Rés tinham o dever de ir actualizando os prémios dos seguros consoante a amortização do capital em dívida, esclarecendo que até Agosto de 2018 as mesmas mantiveram o capital seguro em apólice inalterado, data em que efetuaram a atualização do capital seguro, que foi reduzido de € 37.412,05 para € 14.446,64, não tendo, contudo, creditado, ou restituído, aos Autores as quantias entretanto pagas a mais no âmbito do contrato de seguro.

Notificadas para contestar, as Rés defenderam-se, em articulados autónomos, por impugnação, negando as razões invocadas pelos Autores, referindo, em suma, não terem a obrigação de efectuar a actualização automática do capital em dívida.

Realizou-se audiência prévia.

Após, proferiu-se despacho saneador-sentença, ao abrigo do disposto no artigo 595.º, n.º 1, alínea b), do CPC, do qual consta o seguinte dispositivo: “Decisão final: Pelo exposto, julgo a vertente acção improcedente, por não provada, e absolvo as Rés de tudo o quanto foi peticionado.

Custas pelos Autores.” * Inconformados com a decisão plasmada na sentença vieram os Autores apresentar requerimento de recurso para este Tribunal da Relação de Évora, alinhando as seguintes: “III. CONCLUSÕES: I. O presente recurso tem como objeto: toda a matéria de facto e de direito da Sentença proferida nos presentes autos.

II. No nosso país, é condição sine qua non para concessão de crédito à habitação, a contratação, em paralelo, de um contrato de seguro de vida que garanta àquelas o pagamento das importâncias devidas em caso de morte e ou invalidez do devedor.

III. O Decreto-Lei n.º 222/2009, de 11 de setembro, foi instituído justamente para assegurar a não imposição aos consumidores de contratos de seguros de vida associados ao crédito à habitação com condições que vão além do que justificaria a preocupação legítima de protecção do interesse dos credores.

IV. Não é legal, nem parece justo e razoável, que um contrato de seguro de vida associado a crédito à habitação, permaneça 7 anos sem atualização do capital seguro, em flagrante desrespeito ao que diz a Lei, bem como aos Recorrentes na qualidade de consumidores lesados.

V. Ora, nos termos da cláusula 9.ª do contrato de seguro de vida – (Doc. 2 da P.I.) –, tratando-se de um contrato de seguro com renovação periódica, associado a contrato de mútuo, o valor do seguro na data de início de cada adesão, deveria corresponder à totalidade do valor do capital em dívida informado ao segurador, sobre o qual seria calculado o prêmio.

VI. Não obstante, a previsão contratual acima mencionada, a Lei, através do Decreto-Lei n.º 222/2009, de 11 de setembro, em vigor desde 10/12/2009, também prevê no seu artigo 5.º, n.º 4, que o contrato de seguro de vida associado a contrato de mútuo, tem um capital seguro igual ao capital em dívida.

VII. Em idêntico sentido, o artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 222/2009, de 11 de setembro, indica ser dever da 2.ª Recorrida informar a 1.ª Recorrida, acerca da evolução do montante em dívida, sendo dever desta, proceder a imediata atualização do capital seguro, com efeitos reportados à data de cada alteração do montante em dívida ao abrigo do contrato de crédito à habitação, creditando ou restituindo aos Recorrentes as quantias entretanto pagas ao âmbito do contrato de seguro.

VIII. Dever esse que era conjunto das Recorridas nos termos do n.º 2, do artigo 8.º Decreto-Lei n.º 222/2009, de 11 de setembro, e que foram sempre descumpridos por estas.

IX. E nos termos do artigo 9.º do Decreto-Lei, de 11 de setembro, uma vez descumprido tais deveres de informação por parte das recorridas, faz incorrer em Responsabilidade Civil nos termos gerais, e confere aos recorrentes o direito de, a qualquer momento exigir a sua correção, bem como o ressarcimento dos danos causados.

X. A respeitável Sentença recorrida deixou de observar o Decreto-Lei n.º 222/2009, de 11 de setembro, e em especial os artigos acima citados.

XI. Ao contrário do que foi fundamentado na respeitável Sentença recorrida, o Decreto-Lei n.º 222/2009, de 11 de setembro, visa assegurar o cumprimento do imperativo constitucional de proteção dos direitos dos consumidores, tendo sem sombra de dúvidas um cariz protecionista, o que por si só já é suficiente para que seja aplicável aos contratos em curso.

XII. E não só, o contrato de seguro de vida discutido nestes autos, é renovado periodicamente mês a mês.

XIII. E também por esta razão, todos os benefícios posteriores, advindos com o advento do Decreto-Lei n.º 222/2009, de 11/09, norma cogente (imperativa e de ordem pública), cujo interesse social subjacente – (é assegurar o cumprimento do imperativo constitucional de protecção dos direitos dos consumidores) –, exige sua aplicação imediata sobre todas as relações jurídicas de trato sucessivo, a exemplo do contrato de seguro de vida discutido nestes autos, merecendo também por esta razão a respeitável Sentença recorrida ser reformada.

XIV. Discorda da respeitável Sentença na parte em que afirma que: “o diploma em causa nada prevê quanto à sua aplicação aos contratos vigentes, pelo que teremos de recorrer às normas gerais relativas à aplicação da lei no tempo”.

XV. A Lei geral dos contratos de Seguros, nos termos dos seus artigos 2.º e 3.º, indica sobre a aplicação imediata do conteúdo de natureza supletiva contido no Decreto-Lei n.º 222/2009, de 11 de Setembro, a partir da primeira renovação posterior à data da sua entrada em vigor em 11 de dezembro 2009.

XVI. Não se vislumbra antinomia entre o D.-L. n.º 72/2008, de 16 de Abril e o Decreto-Lei n.º 222/2009, de 11 de Setembro, os quais devem ser interpretados de modo a propiciar um diálogo coerente entre as fontes normativas, à luz dos princípios da boa-fé objetiva e da equidade, sem desamparar a parte vulnerável na contratação, ou seja, os Recorrentes.

XVII. Não pode prevalecer o ato ilícito das recorridas, praticados na vigência do contrato de seguro em discussão, visto que, aquelas estavam cientes que descumpriam o contrato, a Lei, mantendo o capital seguro em apólice inalterado (Cfr. Doc. 3 da P.I.), pese embora, os recorrentes fossem amortizando o capital em dívida junto da 2.ª Recorrida regularmente, na forma que se verificou nestes autos.

XVIII. As Recorridas deverão, recalcular os prémios do contrato de seguro de vida, de acordo com as alterações do valor do capital em dívida à Entidade Mutuante, com efeitos reportados, mês a mês, à data de cada uma das atualizações do capital seguro, referente ao período compreendido entre 01-10-2009 à 31-07-2017, restituindo aos recorrentes as quantias entretanto pagas em excesso que se apurarem, no âmbito do contrato de seguro, acrescidas de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, a contar do efetivo desembolso, até integral pagamento; XIX. De forma solidária, as recorridas devem ainda ser condenadas a pagar aos recorrentes a quantia de € 5.000,00, a título de danos morais sofridos, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, a contar da citação até integral pagamento, conforme artigo 496.º do Código Civil; XX. Deve, por isso, ser modificada a douta Sentença impugnada, no sentido de ser julgado totalmente procedente o pedido dos Recorrentes constante da Petição Inicial e que aqui se dá por integralmente reproduzido.

XXI. Disposições violadas: as referidas supra e as demais que V. Exias suprirão.

Face ao exposto, e muito que será suprido por vossas excelências, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, revogando a douta Sentença, julgando a vertente acção procedente e condenando as recorridas de tudo o quanto foi peticionado pelos Recorrentes. Assim se fazendo a habitual e almejada, Justiça!” * A Apelada (…) -Companhia de Seguros, SA, respondeu ao recurso alinhando as seguintes “CONCLUSÕES: 1-O contrato de seguro que se discute nos autos, teve inicio em 16.09.2009, altura em que não se encontrava legalmente contemplada a atualização automática do capital de...

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