Acórdão nº 5443/20.0T8BTG-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução19 de Maio de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães no seguinte RELATÓRIO R. L., residente na Rua … Braga, instaurou em 19/10/2015, ação especial de inventário para partilha dos bens comuns do casal na sequência do decretamento do divórcio, contra J. C., residente na Rue …, França, no Cartório Notarial do Dr. R. P., sito no Largo …, indicando para o cargo de cabeça de casal o requerido.

Por despacho proferido em 21/06/2016, nomeou-se para o cargo do cabeça de casal o requerido e designou-se data para juramento e tomada de declarações ao cabeça de casal.

Em 27/12/2016 foi tomado juramento ao cabeça de casal, que prestou declarações e requereu a concessão do prazo de trinta dias para apresentar a relação de bens, o que lhe foi deferido.

Em 20/02/2017 o cabeça de casal apresentou a relação de bens em que relacionou imóveis, móveis e passivo.

Por requerimento de 22/06/2017, a requerente R. L. reclamou contra a relação de bens apresentada pelo cabeça-de-casal, por excesso, requerendo que diversos móveis relacionados sejam excluídos da relação de bens apresentada, por serem inexistentes; que o imóvel relacionado sob a verba n.º 10 seja excluído da relação de bens, por se tratar de bem próprio da reclamante; não aceitou a generalidade do passivo relacionado pelo cabeça de casal e acusou a falta de relacionamento do passivo que identifica na reclamação.

Juntou prova documental e arrolou testemunhas.

Observado o contraditório, em 05/07/2017, o cabeça de casal impugnou parte da facticidade alegada pela reclamante e manteve a relação de bens que antes tinha apresentado.

Arrolou testemunhas e requereu a realização de perícia a fim de se “determinar o valor dos gastos das benfeitorias descritas em 11 da relação de bens, devendo ser nomeado perito, por consenso de ambas as partes”.

Por despacho proferido em 12/02/2008, o notário ordenou a citação do Banco …, Banco ... e Credora ..., nos termos e para os efeitos do disposto nos arts 28º, 29º, n.º 2, 30º e 32º do RJPI, que uma vez citados, nada requereram nos autos.

Designou-se data para inquirição das testemunhas arroladas pela reclamante e pelo cabeça de casal.

Essa diligência teve lugar em 25/09/2018, à qual presidiu o notário.

Por despacho proferido em 10/10/2018, o notário determinou que a perícia requerida pelo cabeça de casal seria realizada por um único perito e ordenou a notificação das partes para, no prazo de quinze dias, se pronunciarem quanto ao perito a nomear.

Notificadas as partes em 10/10/2018 para os termos acabados de referir, aquelas mantiveram-se silentes.

Entretanto, até 19/10/2020 nenhum ato processual foi praticado no âmbito dos presentes autos de inventário.

Em 19/10/2020, a requerente R. L. solicitou a remessa do processo de inventário para o Tribunal, ao abrigo do disposto no art. 12º, n.º 2, al. b), da Lei n.º 117/2019, de 13/09, alegando como fundamento dessa pretensão o facto de a “última diligência útil” que neles teve lugar foi “praticada há mais de seis meses, encontrando-se assim verificado o requisito que permite o requerido”.

Observado o contraditório (cfr. despacho de 19/10/2020), apenas o cabeça de casal se pronunciou, opondo-se ao requerido, advogando ser “seu entendimento que os autos devem prosseguir os seus termos nesse cartório” e indicando a pessoa a ser nomeada como perito para a realização da prova pericial que antes tinha requerido na resposta à oposição à reclamação de bens apresentada pela requerente R. L..

Em 03/11/2020, a Senhora Notária substituta do senhor notário anterior proferiu a seguinte decisão, determinando a remessa dos autos para o Juízo de Família e Menores de Braga: “Por requerimento (…) enviado via e-mail no dia 16 de outubro de 2020, registado no sistema informático de tramitação do processo de inventário sob os números, veio a interessada R. L., através da sua mandatária, requerer a remessa ao tribunal, do presente inventário, alegando que “a última diligência útil foi praticada há mais de seis meses”, invocando o disposto no artigo 12º, n.º 2, al. b) da Lei n.º 117/2019, de 13 de setembro.

Em cumprimento do previsto no artigo 13º, n.º 1 da Lei n.º 117/2019, de 13 de setembro, foram ouvidos os restantes interessados.

Pronunciou-se, quanto ao requerido, o interessado J. C. – conforme documento registado no sistema informático de tramitação do processo de inventário sob o número 2184688 - dizendo que “se opõe que os autos sejam remetidos para o Tribunal”, entendendo que os mesmos devem prosseguir neste cartório.

Os restantes interessados nada disseram.

Face ao exposto, cumpre decidir.

Prevê o artigo 12º, n.º 2, al. b) da Lei n.º 117/2019, de 13 de setembro, que qualquer dos interessados diretos na partilha pode requerer a remessa ao tribunal competente, sempre que os inventários estejam parados, sem realização de diligências úteis, há mais de seis meses.

Com efeito, - Verifica-se que a última atividade realizada no presente inventário data de 10 de outubro de 2018, não tendo sido realizada qualquer diligência útil a partir dessa data; - Verifica-se, ainda, que a requerente tem legitimidade.

Pelo que, por preenchidos os pressupostos legais e nos termos do disposto no artigo13º, n.º 1 da Lei n.º 117/2019, de 13 de setembro, defiro o peticionado e determino a remessa do presente processo de inventário para o Juízo de Família e Menores, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, com a consequente tramitação judicial do mesmo.

*Elabore-se a conta de custas do processo, em cumprimento do previsto no artigo 14º, n.º 1 do mencionado diploma legal, estando, ainda, em falta o pagamento dos honorários ainda não liquidados e as despesas inerentes ao processo, no valor total de € 387,22 (trezentos e oitenta e sete euros e vinte e dois cêntimos), tudo nos termos do disposto nos artigos 18º, n.º 8, al. a), i), 19º, n.º 1 e 22º da Portaria n.º 278/2013, de 26 de agosto, na redação da Portaria n.º 46/2015, de 3 de fevereiro.

Considerando que à requerente foi concedido apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, o pagamento do referido valor será solicitado ao IGFEJ, I.P. – artigos 18º, n.º 8, al. a), i), 19º, n.º 1, 22º e 26º-D, n.º 1 da Portaria n.º 278/2013, de 26 de agosto, na redação da Portaria n.º 46/2015, de 3 de fevereiro e artigo 7º da Portaria n.º 46/2015, de 23 de fevereiro.

Mais se determina a entrega, nas instalações do mencionado tribunal e por via presencial, das peças processuais e dos documentos que integram o presente processo em suporte físico”.

O despacho acabado de transcrever foi notificado aos ilustres mandatários das partes informaticamente, em 03/11/2020, bem como ao Banco ... e Credora ..., estes últimos, por cartas registadas expedidas em 04/11/2020.

Remetidos os autos ao Juízo de Família e Menores de Braga, Juiz 3, por despacho proferido em 13/11/2020, este determinou que, após trânsito, os autos fossem reenviados ao Cartório Notarial para efeitos de conclusão da fase de instrução do incidente de reclamação contra a relação de bens pendente e prolação da respetiva decisão, constando esse despacho do seguinte teor: “Compulsados os autos, verifica-se que foi produzida prova no Cartório Notarial, relativamente à reclamação deduzida contra a relação de bens, sem que tivesse sido proferida decisão.

Com efeito, em 25/09/2018, foram inquiridas as testemunhas arroladas pelos interessados, pelo Sr. Notário R. P..

Sucede que, o cabeça de casal, em resposta à reclamação de bens, requereu a prova pericial para se determinar o valor dos gastos com as benfeitorias realizadas no prédio urbano.

Por despacho de 10.10.2018, proferido em ata, determinou-se que essa prova fosse feita de harmonia com o que estipula o nº 2 do artigo 33º do RJPI, observado o disposto no CPC. Assim, determinou que a perícia seria efetuada por um único perito por si nomeado. Porém, sendo essa nomeação precedida pela audição das partes, no sentido de indicarem um de sua escolha. Para o efeito determinou-se a notificação das partes no sentido de se pronunciarem, no prazo de 15 dias, sobre o perito encarregado da avaliação.

Nesse ínterim, porém, entrou em vigor a Lei n.º 117/2019 e foi requerida a remessa dos autos ao Tribunal.

Ora, não obstante o requerimento formulado pelos interessados nesse sentido, a verdade é que o incidente de reclamação contra a relação de bens se encontra em curso, foi produzida prova, interrompida a sua conclusão e não foi terminado o processo decisório assim iniciado.

Ora, dispõe o artigo 82.º, do RJPI, diploma sob cuja égide se iniciou o processo em apreço, que assim foi tramitado até 01/01/2020, que é aplicável subsidiariamente o Código de Processo Civil ao processo de inventário notarial.

Como tal, consagra o artigo 605.º, do Código de Processo Civil, o princípio da plenitude da assistência do juiz (aqui aplicável ao Notário que iniciou o processo decisório), o qual, conforme enuncia Lebre de Freitas1, “é um corolário dos princípios da oralidade e da apreciação da prova: para a formação da livre convicção do julgador, este terá de ser o mesmo ao longo de todos os atos de instrução e discussão da causa realizados em audiência”.

Este princípio centra-se na instrução e apreciação da prova que é produzida em sede da audiência de julgamento, prolongando-se, após a Lei n.º 41/2013, de 26-06, que aprovou o Novo Código de Processo Civil, até fase da sentença (n.º 4 do artigo 605.º), pois que se entendeu atribuir “a elaboração da sentença a quem já estudou o caso, assim se impedindo que o trabalho de análise já realizado pelo juiz que conduziu a audiência se perca”.

Ademais, é no âmbito da audiência de julgamento que se cumpre o princípio da imediação e os princípios que deste são instrumentais, concretamente, da oralidade e, na medida do possível, da concentração. Como refere Alberto dos Reis, “o que se passa oralmente na audiência de julgamento só pode ser captado por quem assista, do princípio ao fim...

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