Acórdão nº 1507/17.6PBFAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 10 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelMARTINHO CARDOSO
Data da Resolução10 de Maio de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

IAcordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: Nos presentes autos de Processo Comum com intervenção de tribunal singular acima identificados, do Juiz 1 do Juízo Local Criminal de Faro, em que ALC se constituiu assistente e deduziu pedido cível contra a arguida MAP, esta foi, na parte que agora interessa ao recurso, condenada pela prática de um crime de violação de domicílio, p. e p. pelo art.º 190.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 100 dias de multa, à razão diária de 10,00 €, perfazendo o montante total de 1.000,00 €, e a pagar à demandante a quantia global de 3.000,00 € a título de danos patrimoniais e danos não patrimoniais, mais juros.

B) E fê-lo °. .pelo facto de a porta se encontrar entreaberta, percorreu as várias divisões, nomeadamente o quarto de ALC. Ato seguido, mudou a fechadura da porta de entrada".

C) Pelo que cometeu a arguida MAP, em autoria material e na forma consumada - 1 (um) crime de violação de domicílio, previsto e punido pelo artigo 190°, n°1 do Código Penal (perpetrado na pessoa de ALC).

" D) Conforme se extrai do capítulo da "Fundamentação da Matéria de Facto" daquela douta sentença, quanto "...à participação da arguida nos factos, certo e evidente é, que nenhuma prova testemunhal e/ou documental foi produzida a tal respeito, melhor dizendo, nenhuma prova se produziu que atestasse que houvesse sido efetivamente a arguida a introduzir-se na habitação que havia arrendado à assistente.

" E) No decorrer da audiência de julgamento, a arguida não prestou declarações.

F) Limitando-se no final a produzir uma declaração, negando e desmentindo tudo o que fora ali revelado pela acusação e pela assistente, tendo, passados alguns minutos, sido interrompida pelo presidente do tribunal ad quo.

1 - Das declarações da assistente e das testemunhas, não constituírem prova material: G) A assistente nas suas declarações, efabulou, simulou e mentiu, sem, contudo, indicar factos, que colocassem a arguida, no interior da habitação onde aquela residia, ou seja, "Entre as 13h30 do dia 18-11-2017, e as 00h10 horas do dia 19-11-2017".

H) Pelo que é totalmente falso, os factos dados como provados em 1, 3, 4, 5, 6 e 7 da douta sentença.

1) Apenas o facto dado como provado em 2 da douta sentença, é parcialmente verdadeiro, uma vez que a assistente apenas transferiu 50% da renda em falta na tarde daquele dia 18-11-2017.

J) Das testemunhas arroladas pela acusação, a 1°, ARS, declarou que "nada viu, pois naquele período, encontrava-se em viagem por Coimbra", a 2ª, LUA, "foi prescindida a sua presença" e a 3°, FRN, agente da PSP, limitou-se a confirmar o conteúdo do "Auto de Notícia".

K) Do depoimento da única testemunha arrolada pela arguida, esta confirma a presença da arguida à porta da residência da assistente na manhã de 18-11-2021, conforme 1° parte do facto provado em 2, da douta sentença.

L) Logo, o tribunal ad quo, na falta de prova (testemunhal ou documentai), que envolvesse a arguida na comissão dos factos plasmados na acusação, baseando-se apenas nas declarações da assistente, lançou "...mão da prova indiciária ou por presunção...

", para indiretamente formar a sua convicção, quanto à implicação da arguida na prática dos factos, procedendo à "...alteração não substanciai dos factos...

", agora considerados como provados, a fls. 169 a 174.

M) Em sua defesa, a arguida voltou a negar a sua participação naqueles factos, conforme artigo 9°, deste recurso.

N) Com a nova acusação, que se traduziu numa verdadeira "decisão surpresa" em violação dos mecanismos do artigo 358° do CPP, a arguida não se conforma.

O) Porquanto, não estão preenchidos os elementos objetivos da prática do crime, nem tampouco, estão sumariamente preenchidos os elementos subjetivos do tipo de crime pelo qual a arguida foi condenada.

Ill - Do Pedido de indemnização civil: P) Refere a douta sentença "Esta situação causou à assistente um enorme transtorno da sua vida pessoal, escolar e profissional, bem como ao nível da sua saúde, uma vez que o seu estado nervoso alterou-se a partir daquele momento, passando a viver inquieta e nervosa".

Q) Contudo, não consta que a assistente tivesse junto aos autos, qualquer documento de ordem clínica, (relatório ou atestado médico), que ateste a alteração do seu estado saúde psíquico ou mental, com repercussões na sua atividade escolar ou profissional.

R) Tal como não consta que a assistente tivesse de baixa clínica ou dado faltas ao trabalho, pelo que chegar-se à conclusão de "...que o seu estado nervoso alterou-se a partir daquele momento, passando a viver inquieta e nervosa", não passa de uma conclusão temerária que carece de fundamentação.

S) Por outra banda, o tribunal ad quo ao concluir que "...a assistente foi penalizada numa das disciplinas do seu curso, uma vez que teria de realizar a apresentação de um trabalho e o mesmo não foi possível, porque foi privada do seu computador, bem como da pen onde guardava a informação...

", fê-lo apenas com base nas declarações da assistente, a qual, não juntou qualquer prova de que tal penalização tivesse ocorrido.

T) Compulsados quer o "Auto de Notícia", quer no "Auto de Denúncia" a fls., no que tange às primeiras declarações prestadas pela assistente, não consta que tivesse desaparecido o computador e a pen, pelo que se levanta a dúvida que a assistente fosse `...penalizada numa das disciplinas do seu curso, uma vez que teria de realizar a apresentação de um trabalho e o mesmo não foi possível, U) Só passados cerca de 20 meses, no "Auto de Declarações" de 13-06-2019 a fls., é que a assistente fala pela 1 ° vez num computador, alegando que "...teve prejuízo na sua vida escolar, urna vez que o trabalho que tinha para entregar na semana seguinte estava no computador retido pela Sr.' MAP", sem, contudo, fazer prova da disciplina a que o trabalho se destinava, do curso e do estabelecimento de ensino que frequentava.

IV - Erro na apreciação da prova material.

V) A apreciação crítica das provas, ainda que concisa, como refere o n° 2 do art.° 374° do CPP, deve permitir uma melhor compreensão dos motivos, pelos quais o Tribunal ad quo, julgou suficientes e adequados os meios de prova indiciários ou por presunção, que suportam e fundamentam a sua decisão.

W) Não será demais fazer lembrar que "...o exame crítico das provas deve ser aferido, com critérios de razoabilidade que permita avaliar cabalmente o porquê da decisão e o processo lógico-mental que serviu de suporte ao respetivo conteúdo.

" (Ac. STJ de 11.10.2000).

X) No caso concreto, o Tribunal a quo, na apreciação que fez das provas, com o devido respeito, excedeu-se de sobremaneira, quanto ao princípio da livre apreciação das provas a que se encontra vinculado, por força do disposto nos artigos 127° e 374° n° 2 do CPP, limitando apenas a sua apreciação, às declarações da assistente.

Y) Tal vício resulta de forma clara do texto da decisão recorrida, não só por si, como também daquelas que se extraem das regras do senso comum.

Z) Uma vez que, das declarações da assistente, não resultam como provados, os factos que colocam a arguida, no período temporal indicado no ponto 1 da acusação, ou seja, AA) De que entre as 13h30 do dia 18-11-2017 e as 00h10 do dia 19-11-2017, a arguida introduzira-se na residência da assistente, de que fosse possuidora de uma chave de acesso àquela residência, de ter percorrido várias divisões, nomeadamente, o quarto da assistente, e, simultaneamente, de ter mudado a fechadura da porta de entrada.

BB) E foi com base de indícios ou presunções, que o tribunal ad quo, procedeu à alteração não substancial dos factos.

CC) Pelo que o tribunal ad quo, excedeu-se na apreciação da matéria de facto, incorrendo em erro, pois não atendeu à natureza das declarações produzidas, nem nos meios que tinha ao seu alcance para aferir da sua legitimidade, socorrendo-se de "indícios" e das "regras da experiência comum", para obtenção de uma condenação.

DD) Pelo que, os elementos de prova carreados na alteração não substancial dos factos, que suportam a acusação, teriam necessariamente de semear no espírito do julgador, a dúvida sobre a prova material dos factos, dúvida essa, que mais não poderia ser, do que levar a decidir-se a favor da arguida, absolvendo-a do crime de violação de domicílio, em obediência ao princípio in dubio pro réu.

TERMOS EM QUE, NOS MELHORES DE DIREITO, DOUTAMENTE SUPRIDOS POR V. EXCIAS. REQUER-SE A ANULAÇÃO DA SENTENÇA ORA RECORRIDA, EM OBIDIÊNCIA AO PRINCÍPIO IN DÚBIO PRÓ RÉU, COM A CONSEQUENTE ABSOLVIÇÃO DA ARGUIDA, FAZENDO-SE ASSIM, A COSTUMADA JUSTIÇA#A Exma. Magistrada do...

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