Acórdão nº 318/22 de Tribunal Constitucional (Port, 28 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelCons. Gonçalo Almeida Ribeiro
Data da Resolução28 de Abril de 2022
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 318/2022

Processo n.º 273/2022

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Gonçalo de Almeida Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3.ª secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A. e recorridos o Ministério Público e B., foi interposto o presente recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»), do acórdão daquele Tribunal, de 17 de novembro de 2021.

2. Pela Decisão Sumária n.º 212/2022, decidiu-se, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto. Tal decisão tem a seguinte fundamentação:

«4. Constitui requisito do recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC a aplicação pelo tribunal recorrido, como ratio decidendi, da norma cuja constitucionalidade é questionada pelo recorrente.

No caso vertente, é manifesto que tal requisito não se mostra preenchido.

O recorrente pretende a apreciação da constitucionalidade da norma do artigo 30.º, n.º 3, do Código Penal, na medida em que dela resulta que o regime do crime continuado não tem aplicação quando estejam em causa crimes praticados contra bens eminentemente pessoais.

Recorde-se que o recorrente foi condenado pela prática, em concurso efectivo, de 312 crimes de violação agravada, os quais tiveram por vítima sempre a mesma pessoa, foram praticados com continuidade temporal e adotando uma forma de atuação essencialmente homogénea. Com a inconstitucionalidade da norma excludente contida no n.º 3 do artigo 30.º do Código Penal, pretende o recorrente afastar o obstáculo legal a que possa beneficiar da aplicação do regime do crime continuado, previsto no n.º 2 do mesmo artigo, designadamente do seu especial regime punitivo.

Todavia, de acordo com a decisão recorrida, não só o contestado n.º 3 do artigo 30.º do Código Penal não padece da inconstitucionalidade que lhe é assacada pelo recorrente, como existe, desde logo, um outro fundamento legal que, no entender do Supremo Tribunal de Justiça, sempre implicaria a inaplicabilidade do regime do crime continuado ao caso vertente: o facto de não se terem provado factos dos quais se possa inferir que a atuação do arguido se deu no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente. Dado que esse requisito constitui condição necessária para a aplicabilidade do regime do crime continuado, nos termos do n.º 2 do artigo 30.º do Código Penal, nunca o desiderato visado pelo recorrente com o presente recurso poderia ser alcançado.

Nestas circunstâncias, revela-se inútil a apreciação da questão de inconstitucionalidade colocada nestes autos. De facto, ainda que se viesse a concluir pela não conformidade constitucional da norma que constitui objeto do mesmo, sempre subsistiria a inaplicabilidade do regime do crime continuado por mor da não verificação da condição adicional indicada.

Constitui entendimento sedimentado deste Tribunal que «(…) não visando os recursos dirimir questões meramente teóricas ou académicas, a irrelevância ou inutilidade do recurso de constitucionalidade sobre a decisão de mérito torna-o uma mera questão académica sem qualquer interesse processual, pelo que a averiguação deste interesse representa uma condição da admissibilidade do próprio recurso» (Acórdão n.º 366/96). Ora, como o eventual juízo de inconstitucionalidade da norma sindicada nenhuma virtualidade teria de alterar a decisão recorrida, importa concluir pela não verificação do pressuposto da utilidade do recurso de constitucionalidade, o que implica o não conhecimento do objeto do recurso, justificando-se a prolação da presente decisão, nos termos do artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC.»

3. De tal decisão vem agora o recorrente reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 78.º-A da LTC, invocando as seguintes razões:

«1 - Não se conformando com a decisão de julgar improcedente o recurso por si apresentado, no que concerne à inconstitucionalidade da aplicação do preceituado no n.° 3 do artigo 30.° do Código Penal, bem como do teor da respetiva norma, apresentou o mesmo recurso junto do Tribunal Constitucional.

2 - O qual foi objeto de...

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