Acórdão nº 0235/20.0BEPNF de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Maio de 2022
Magistrado Responsável | ANÍBAL FERRAZ |
Data da Resolução | 04 de Maio de 2022 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa; # I.
A……………, S.A., …, recorre de sentença, proferida, em 30 de novembro de 2021, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Penafiel, que julgou totalmente improcedente impugnação judicial, visando a “liquidação das taxas devidas pela legalização e pela utilização, no âmbito de um procedimento de legalização de obras de construção de alpendres sombreadores, no valor de € 23.321,02, da qual foi notificada, nos termos e para os efeitos do artigo 20.º, n.º 4 do Regulamento das Taxas e Outras Receitas Municipais do Município de Valongo”.
Alegou e concluiu: « A. A Recorrente vem apresentar recurso da sentença proferida nos presentes autos, que julgou improcedente a impugnação em crise, mantendo a liquidação das taxas alegadamente devidas pela utilização e legalização, no âmbito do procedimento de legalização de obras de construção de alpendres sombreadores.
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O presente recurso terá por objecto a decisão quanto às seguintes questões de direito: (i) a errada interpretação da lei e dos conceitos técnicos nos domínios do ordenamento do território e do urbanismo, mais concretamente, do conceito de “área bruta de construção”, e consequente liquidação da taxa pela realização, manutenção e reforço de infraestruturas urbanísticas; (ii) a falta de fundamentação da decisão recorrida no que diz respeito à equiparação dos conceitos de “área total de construção”, “área bruta” e “área bruta de construção”, com base no Decreto Regulamentar nº 5/2019 de 27 de Setembro; e (iii) a errada aplicação das regras de distribuição do ónus da prova quanto à demonstração da existência de uma efectiva contraprestação pelo pagamento da taxa impugnada e do juízo de proporcionalidade.
Quanto à interpretação do conceito de “área bruta de construção”, C. As taxas impugnadas foram calculadas tendo por base o Regulamento de Taxas e Outras Receitas Municipais do Município de Valongo, publicado no Diário da República, 2.ª Série, nº 31, de 13-07-2017.
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Para o cálculo das referidas taxas, este Regulamento faz menção ao conceito de “área bruta de construção” (vide ponto 2.2 do Quadro 9 e ponto 3.3.3 do Quadro 6 do Anexo I – Tabela de Taxas).
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A Recorrente não concorda com a sentença recorrida, na medida em que esta, tendo por base o Decreto Regulamentar nº 5/2019, equipara o conceito de “área bruta de construção” ao conceito de “área total de construção”.
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Entende, a Recorrente, que estamos perante uma análise pouco cuidado dos conceitos técnicos definidos pela legislação aplicável, com total confusão dos mesmos.
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O Decreto Regulamentar nº 5/2019, apesar de garantir a actualização de alguns conceitos técnicos, não define expressamente o conceito de “área bruta de construção” – conforme resulta da própria sentença recorrida.
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Face a esta ausência de definição, a solução não passa, nem pode passar, por interpretar o vocábulo de forma arbitrária, fazendo uma equiparação, sem mais, por semelhança de termos.
I. Não nos parece desadequado que a definição de “área bruta de construção” se possa encontrar em instrumentos oriundos da Direcção Geral de Ordenamento e Território Urbano, nomeadamente no Vocabulário do Ordenamento do Território, onde se consagra que o conceito de área bruta de construção corresponde “ao valor expresso em m2, resultante do somatório das áreas de todos os pavimentos, acima e abaixo do solo, medidas pelo extradorso das paredes com exclusão de […] terraços, varandas e alpendres”.
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Aliás, resulta do próprio Decreto Regulamentar nº 5/2019, no seu artigo 4.º, n.º 4, que “nos casos em que se revele necessário o recurso a conceitos técnicos não abrangidos pelo presente decreto regulamentar, devem ser utilizados, prioritariamente, conceitos técnicos definidos na legislação aplicável, quando for o caso, ou conceitos técnicos constantes de documentos oficiais de natureza normativa produzidos pelas entidades nacionais legalmente competentes em razão da matéria” – … .
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A “área bruta de construção” mede-se pelo extradorso das paredes exteriores, com a exclusão de: sótãos não habitáveis; áreas destinadas a estacionamento; áreas técnicas; terraços, varandas e alpendres; galerias exteriores, arruamentos e outros espaços livres de uso público cobertos pela edificação.
L. Ou seja, o alpendre sombreador que a Recorrente construiu não deverá ser incluído na “área bruta de construção”.
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Fazer uma imediata associação entre “área total de construção” e “área bruta de construção”, como faz a Sentença do Tribunal a quo - para além de não ter imediata correspondência literal – constitui um evidente salto lógico que inquina a decisão do Tribunal a quo.
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Assim, não existindo área bruta de construção no procedimento de licenciamento em apreço que legitime o aumento da área bruta de construção previamente licenciada, o cálculo da liquidação das taxas mostra-se incorrecto, devendo a liquidação em causa (da segunda taxa colocada a pagamento na Fatura nº 003/8995, de 23.09.2019, com o código 02.07.02.02, bem como da terceira taxa colocada a pagamento na Fatura nº 003/8996, de 23.09.2019, com o código 02.04.03.03.03) ser anulada por erro nos pressupostos de facto e de direito.
Quanto à insuficiência de fundamentação da decisão recorrida, O. O raciocínio apresentado na decisão recorrida para concluir pela equiparação de “área total de construção” e “área bruta de construção”, não pode, de todo em todo, manter-se, por violar os mais basilares princípios de direito, nomeadamente, o previsto no artigo 9º do Código Civil, segundo o qual “não pode […] ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal”.
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O Decreto Regulamentar nº 5/2019 em causa não refere expressamente que a designação “área total de construção” é vulgarmente utilizada para referir “área bruta de construção”, mas sim apenas “área bruta” (cfr. nota complementar que consta da pág. 26 do diploma) – o que não é suficiente para se concluir que representa o mesmo conceito.
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O argumento de ligação no raciocínio do Tribunal a quo é, salvo o devido respeito, muito frágil, e carece de fundamentação. Até porque o referido Tribunal retira uma conclusão de equiparação de conceitos, sem a fundamentar.
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Esta equiparação de conceitos não decorre da lei. Assim, no domínio dos conceitos técnicos, porque precisos e específicos, não deve o intérprete equiparar conceitos de forma arbitrária e infundada.
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Observa-se, no presente caso, que a fundamentação invocada pelo Tribunal a quo é insuficiente, na medida em que procede a um salto de lógica que a Recorrente não acompanha e que não tem qualquer apoio no texto da lei.
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Andou andou mal, salvo o devido respeito, o Tribunal a quo, interpretando e aplicando erradamente o direito aos factos dados como provados em primeira instância.
Quanto à errada...
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