Acórdão nº 0295/17.0BELRA de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Maio de 2022
Magistrado Responsável | PAULA CADILHE RIBEIRO |
Data da Resolução | 04 de Maio de 2022 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1. Relatório 1.1.
A………… e B…………, identificados nos autos, interpõem recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou improcedente a impugnação judicial intentada contra a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) n.º 2016 5003292937, respeitante ao ano de 2012, no valor a pagar de € 50.139,99, a que correspondeu a Demonstração de Acerto de Contas n.º 2016 00009553184, no valor a pagar de € 14.482,71, concluindo da seguinte forma as suas alegações de recurso:
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Considera o Tribunal a quo que “o valor de aquisição a considerar no apuramento das mais valias, como acertadamente concluiu a AT, é o valor da quota à data da constituição da sociedade “C............, L.da, de € 28.000,00€, uma vez que a data e o valor resultante do ato de aumento de capital social da referida sociedade, por incorporação de reservas, não releva para efeitos de apuramento de mais valias, em conformidade com o disposto nos artigos 10º, nº1, al. b) e nº4, 43º, nºs 1 e 6, al. a) e 48º al. a), todos do CIRS, não vigorando, consequentemente, a tese defendida pelos impugnantes de que para apuramento da mais valia, apenas devem ser levados em consideração dois atos: o primeiro, o apuramento de capital por incorporação de reservas e o segundo, a escritura pública de cessão de quotas”.
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Mais não considera que o aumento de capital social por incorporação de reservas não existe verdadeiro incremento patrimonial, uma vez que não há contrapartida no património de quem detém as participações.
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Salvo o devido respeito que é muito, mal andou o tribunal a quo ao decidir como decidiu.
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A coberto da Ordem de Serviço n.º OI201500374 ocorreu procedimento de inspecção tributária dirigida ao exercício de 2012, tendo resultado correcções sem recurso a métodos indirectos, nos termos do disposto no nº4 do artigo 65º do Código do IRS, apurando-se uma Mais-valia (rendimento líquido da categoria “G”) no valor de 54.405,59€, sujeita a taxa especial de 26,5%, prevista no nº4 do artigo 72º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS).
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Nesse seguimento foram emitidas: - Liquidação nº 2016 5003292937 efectuada em sede de IRS relativo ao ano de 2012 resultando no valor a pagar de 50.137,99€; - Demonstração de acerto de contas nº 2016 00009553184 efectuada na sequência da liquidação referida que resultou um valor a pagar de 14.482,71€.
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Inicialmente era titular de uma quota de valor nominal de 28.000,00€, correspondente a 70% do capital social da referida sociedade (28.000,00€/40.000,00*100%).
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Através da inscrição 2 – AP.54/20120620 – Provisória por Dúvidas, mas convertida em definitiva pelo averbamento AV.1-AP.12/20120718 registou-se o aumento do capital social da referida sociedade comercial no valor de 187.703,71€, pelo que o capital social após o aumento passou a perfazer o montante de 227.703,71€.
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O referido aumento ocorreu por incorporação de reservas legais por ambos os sócios na proporção e em reforço das respectivas quotas.
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Em consonância com o referido aumento, o impugnante A............ passou a ser titular de uma quota de valor nominal de 159.392,60€, correspondente aos mesmos 70% do capital social aumentado. (227.703,71€*70%).
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Através de escritura de Cessões de Quotas, Renúncia e Nomeação de Gerentes, celebrada no Cartório Notarial de Torres Vedras, os impugnantes cederam a quota de que o impugnante A............ era titular na empresa C............, L.da, no valor nominal de 159.392,60€, pelo preço de 367.500,00€.
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Resulta demonstrado que aumento do capital social da indicada sociedade deu-se por incorporação de reservas legais decorrente de lucros de exercícios que os sócios deliberaram não distribuir e decidiram levar a reservas legais, consequentemente, não só corresponde a um custo documentalmente comprovado, mas também a uma efectiva deslocação patrimonial do património pessoal para o da sociedade.
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O recorrente A............ não passou a ser titular de uma quota no valor nominal de 159.392,60€ através do documento consubstanciado no denominado pela AT de “Acordo” de Cessão de quotas, mas antes pelo acto de aumento de capital social referido supra, celebrado em data anterior.
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O aumento de capital social encontra-se perfeitamente justificado pela incorporação de reservas legais, (conforme documentos contabilísticos que o suportam) decorrentes de lucros não distribuídos, ocorrendo uma efectiva deslocação patrimonial do património pessoal para o da sociedade.
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Com relevância para o caso em apreço importa reter que o aumento do capital social pode ser realizado por incorporação de quaisquer reservas disponíveis para o efeito, designadamente reserva livres ou legais. (Cfr. Artigo 91º nº1 do Código das Sociedades Comerciais).
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Por essa via concretiza-se através de meios que já existiam na sociedade, verificando-se apenas uma alteração qualitativa pela sua transformação em capital social.
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Por isso, passando o valor definitivamente a incorporar o capital da sociedade resulta a deslocação patrimonial dos sócios para a sociedade, uma vez que ficam impedidos de efectuar o seu levantamento, enquanto direito que têm em participar nos lucros, já que estes passam a integrar definitivamente o capital social da empresa. Tendo ocorrido, por essa via, um custo para o recorrente.
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Neste conspecto não é necessário efectuar qualquer demonstração do depósito dos meios necessários à constituição da reserva legal, uma vez que já existem na sociedade. No caso em apreço o aumento de capital social não se deu por entradas em dinheiro.
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Temos um custo documentalmente provado de 159.392,60€ correspondendo também ao seu valor nominal na data da alienação, devendo ser este o valor a considerar para efeitos de apuramento de mais-valias.
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Tendo sido corretamente indicado o referido valor de 159.392,60€ na respectiva declaração de rendimento modelo 3 relativa ao ano de 2012.
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Ou seja, para efeitos de apuro do valor da quota transmitida, tendo em vista o apuramento de mais-valias, apenas deve ser levado em consideração dois actos, primeiro, o aumento de capital por incorporação de reservas legais devidamente sustentado nos documentos contabilísticos, e segundo, a Escritura Pública de Cessão de Quotas.
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Pelo que jamais ocorreu uma mais-valia no montante de 54.405,59€ (cinquenta e quatro mil quatrocentos e cinco euros e cinquenta e nove cêntimos).
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Nos termos do disposto no artigo 44º do CIRS, para determinação dos ganhos sujeitos a IRS considera-se o valor da realização o valor da respectiva contraprestação.
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Sendo que, nos termos do disposto no artigo 48º al. b) do CIRS, o valor de aquisição é o custo documentalmente provado, ou na sua falta o respectivo valor nominal.
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Não tendo os sujeitos passivos, aqui recorrentes, violado qualquer norma tributária, designadamente, as que se referem no relatório de inspecção e decisão final em sede de Reclamação Graciosa, mencionados supra, deve ser anulada a decisão proferida pelo Tribunal a quo e a liquidação objecto de impugnação ser anulada, bem como a respectiva demonstração de acerto de contas, no que diz respeito a IRS – 2012.
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Em consequência do que supra se disse deve ser anulada da liquidação adicional bem como as respectivas demonstrações de acerto de contas, efectuadas em sede de juros, no que diz respeito a IRS correspondente ao ano de 2012.
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No sentido, pronunciou-se o Digno Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal a quo, emitindo parecer no sentido da procedência da impugnação, por entender, e bem, que “De facto, em face dos documentos juntos, entendemos resultar demonstrado que o aumento do capital social realizado antes da cessão de quotas resultou da incorporação de reservas legais, devendo tal ser atendido para efeitos de determinação do valor de aquisição a ter em conta para a tributação das mais valias”.
A
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Estando as liquidações dos impostos feridas de ilegalidade, devia o Tribunal a quo ter decidido pela anulação das liquidações adicionais de IRS referente ao ano de 2012. Como assim não aconteceu, violou o disposto nos artigos 10º, nº1, al. b) e nº4, 43º, nºs 1 e 6, al. a), 44º e 48º al. a), todos do CIRS e artigo 91º nº1 do Código das Sociedades Comerciais.
NESTES TERMOS E COM O MUITO QUE DOUTAMENTE SERÁ SUPRIDO, DEVE DAR-SE PROVIMENTO AO RECURSO E REVOGAR-SE A DOUTA DECISÃO RECORRIDA, COMO É DE JUSTIÇA! 1.2.
A Fazenda Pública não contra-alegou.
1.3.
O excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, assim fundamentando: (….) III. Análise do Recurso.
A questão que se vem suscitada pelos Recorrentes consiste em saber se para efeitos de apuramento das mais-valias mobiliárias com a transmissão da quota social, há ou não que atender no caso concreto ao aumento do capital social por incorporação de reservas legais.
Resulta dos autos e da matéria de facto fixada na sentença recorrida que aquando da constituição da sociedade “C…………, Lda.”- 2009 -, o Recorrente marido ficou detentor de uma quota social no valor de €...
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