Acórdão nº 50/16.5GAASL.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelRENATO BARROSO
Data da Resolução26 de Abril de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM OS JUÍZES, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA 1. RELATÓRIO A – Decisão Recorrida No processo comum singular nº 50/16.5GAASL, da Comarca de Setúbal, Juízo Local Criminal de Grândola, o arguido Esp… foi absolvido da prática de um crime de ofensa à integridade física simples, p.p., pelo Artº 143 nº1 do C. Penal, que lhe era imputado por acusação do M.P., bem como, do pedido de indemnização civil contra si formulado pela assistente Fia….

Desta decisão foi interposto recurso pela assistente, tendo sido proferido acórdão por esta Relação que considerando a sentença nula, concedeu parcial provimento ao recurso e em consequência, determinou, ao abrigo do Artº 426 nº1, do CPP, o reenvio do processo para novo julgamento, relativamente à totalidade do seu objecto, com a prolação de nova sentença face ao que então se apurasse.

Tendo os autos baixado à 1ª instância, foi realizada nova Audiência de Julgamento onde foi decidido condenar o arguido pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, p.p., pelo Artº 143 nº1 do C. Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão suspensa na sua execução por igual período com a condição de até ao final do mesmo pagar a indemnização fixada em sede civil; Foi por isso, ainda condenado o arguido a pagar à assistente/demandante a quantia de € 2.872,41 (dois mil oitocentos e setenta e dois euros e quarenta e um cêntimos), a título de indemnização por danos morais e patrimoniais, acrescida de juros civis desde a data da notificação para contestar o pedido de indemnização civil até efectivo e integral pagamento.

B – Recurso Inconformado com o assim decidido, recorreu o arguido, apresentando as seguintes conclusões (transcrição): 1. È tempo de concluir, dando cumprimento ao legalmente estabelecido.

  1. Vai o presente Recurso interposto da Sentença de 27 de Outubro de 2021, que decide condenar arguido Esp… pela prática de um de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143º, nº 1 do Código Penal, na pena de 1 ano de prisão suspensa subordinada à condição do pagamento até ao termo do período da suspensão que será igualmente de 1ano, da indemnização fixada em sede civil e a pagar à assistente/demandante Fia…, a quantia de € 2.872,41 a titulo de indemnização por danos morais e patrimoniais, acrescida dos juros civis desde a data da notificação para contestar o pedido de indemnização civil e até efectivo e integral pagamento.

  2. A Sentença em crise é nula por falta de exame critico da prova, nos termos dos artigos 374º, nº 2 e 379º, nº 1, alínea a), ambos do CPP.

  3. É que o Tribunal deverá identificar as provas que foram produzidas ou examinadas em audiência de julgamento e expor as razões, de forma objectiva e precisa porque é que determinadas provas serviram para alicerçar a conviccção e porque é que outras não serviram – artigos 374º do CPP e 205º da CRP.

  4. Salvo o devido respeito, entende o arguido que o Tribunal a quo não explicitou as razões pelas quais deu credibilidade às declarações da assistente e aos depoimentos das testemunhas.

  5. Em primeiro lugar, na motivação da decisão de facto, começa por reproduzir as declarações da assistente e os depoimentos das testemunhas, o que significa não ter feito qualquer juízo sobre aqueles elementos de prova, pelo que não cumpriu o previsto no artigo 374º, nº 2 do CPP.

  6. Em segundo lugar, em sede de fundamentação, conclui que o depoimento da assistente se revelou “sério, espontâneo e credível”, sem, no entanto, justificar a razão de lhe ter atribuído credibilidade.

  7. Quanto aos depoimentos das testemunhas Val… e Ana…, apesar de lhes ter merecido credibilidade, não demonstrou quaisquer razões objectivas para se ter convencido por tal credibilidade.

  8. Acresce que, o Tribunal ao motivar está obrigado a identificar e a analisar as provas que serviram para formar a sua convicção, devendo, na motivação, explicitar claramente que foi de determinada prova (identificada e examinada) que aquele facto resultou ou não provado.

  9. Ora, a Sentença em crise não especifica quais as concretas provas (testemunhal) que serviram para formar a convicção do Tribunal quantos aos factos considerados provados, fazendo apenas uma alusão genérica sobre os depoimentos, sem, no entanto, especificar qual a concreta prova que serviu para provar ou não determinado facto.

  10. Sem prejuízo da nulidade arguida supra que, na perspetiva do recorrente invalida a decisão sob recurso, também se impugnam os factos provados que a seguir se indicam, especificando-se, em relação a cada um deles, os pontos de facto incorrectamente julgados, as provas que impõem decisão diversa da recorrida, nos termos das alíneas a) e b) do artigo 412º, nº 3 do CPP.

  11. Se correctamente valorada a prova, os factos provados nos Pontos 2), 3), 4), 5), 6), 7), 8) e 9) (Acusação Pública) deveriam ter sido considerados não provados, assim como os factos provados nos Pontos 10) a 24) (Pedido de Indemnização Civil) deveriam ter sido considerados não provados, tudo quanto se invoca expressamente para todos os efeitos legais.

  12. O Tribunal a quo fez uma errada interpretação da prova, atribuindo credibilidade às declarações da assistente, que revelou, uma inimizade de longa data com o arguido, recusando-se, por vezes, a responder a questões que lhe eram colocadas - acta de audiência de discussão e julgamento de 30/09/2021, gravado no sistema em uso do tribunal das 10h:11:36 às 10h:40:39, ficheiro 20210930101134_3590726_3995000 (00:00:26 a 00:14:29 e 00:26:51 a 00:29:02).

  13. Também a testemunha Val… deveria ter gerado no Tribunal a quo, pelo menos, uma dúvida razoável, em virtude de ter manifestado má relação com o arguido e uma relação muito próxima com a assistente, que é sua cunhada, cfr. acta de audiência de discussão e julgamento de 30/09/2021, gravado no sistema em uso do tribunal das 11h:03:35 às 11h:13:58, ficheiro 20210930110334_3590726_3995000 (00:00:54 a 00:01:16 e 00:08:09 a 00:09:40) 15. O Tribunal a quo deu a factualidade constante da Acusação Pública como provada contrariando frontalmente a prova testemunhal e por declarações.

  14. A testemunha Val…, que estava num café a acerca de 40 ou 50 metros, conseguiu visualizar o arguido a dar umas porradas/murros na assistente, não conseguindo, no entanto, responder quanto à posição em que se encontrava a assistente no momento da agressão, à forma como esta caiu ao chão nem à questão do arguido lhe ter dado pontapés, cfr. acta de audiência de discussão e julgamento de 30/09/2021, gravado no sistema em uso do tribunal das 11h:03:35 às 11h:13:58, ficheiro 20210930110334_3590726_3995000 (00:01:55 e 00:03:22 a 00:03:39 e 00:04:06 a 00:04:20) .

  15. Contraindo a tese da assistente de que terá sido agredida pelo arguido com apertão no pescoço, murros na cabeça e pontapés no corpo, temos a testemunha Ana…, que ia passando no local, tendo visto o arguido a dar uma orelhada/estalo na face da assistente, cfr. acta de audiência de julgamento de 19/10/2021 gravado no sistema em uso do tribunal das 14h:39:38 às 15h:09:44, ficheiro 20211019143936_3590726_3995000 (00:14:11 a 00:17:58).

  16. Repare-se que a testemunha Val… que estava a 40 ou 50 metros do local dos factos viu o arguido a dar murros na cabeça da assistente e a testemunha Ana…, que ia a passar e portanto muito mais próxima do local, viu o arguido a dar uma orelhada/estalo na face da assistente e nem a viu caída no chão.

  17. Sendo que nenhuma destas testemunhas viu os pontapés que a assistente alegada ter sofrido.

  18. Na verdade o único ponto coincidente entre as declarações da assistente e os depoimentos das testemunhas Val… e Ana… é que o arguido terá estado presente no dia 29 de Dezembro de 2016, pelas 10h00, no Largo (…), e nada mais.

  19. Os vários intervenientes revelaram versões não coincidentes, com incontornáveis incoerências e contradições, o que impunha de acordo com critérios de razoabilidade e regras de experiência comum entendimento oposto ao preconizado pelo Tribunal a quo.

  20. O princípio in dubio pro reo traduz o correspectivo do princípio da culpa em Direito Penal, ao garantir a não aplicação de qualquer pena sem prova suficiente dos elementos típicos, é um corolário lógico do principio da presunção da inocência do arguido, mas não tem quaisquer reflexos ao nível da interpretação das normas penais.

  21. Em caso de dúvida sobre o conteúdo e o alcance das normas penais, deve o aplicador do direito recorrer às regras de interpretação, entre as quais, o principio in dubio pro reo, neste caso, absolvendo o recorrente do crime de que vinha acusado, bem como do pedido civil contra si formulado, uma vez que o pedido civil deduzido em processo penal tem que ser sempre fundado na prática de um crime.

    Caso assim não se entenda e por mero dever de patrocínio, 24. Na determinação da medida concreta da pena, deve o julgador atender, nomeadamente à culpa do agente, às exigências decorrentes do fim preventivo especial, ligadas à reinserção social daquele e às exigências decorrentes do fim preventivo geral.

  22. O Tribunal a quo entendeu que o grau de ilicitude e a intensidade do dolo prefiguram-se em patamares de muito elevada gravidade/intensidade, sendo as necessidades de prevenção muito relevantes, por questões de diferença de sexo e idades.

  23. Com a devida vénia, a Sentença em crise, que pretende ser exemplar e simbólica, objectiva e nega a pessoa humana, neste caso, o recorrente.

  24. O recorrente considera que é excessiva e desproporcional a pena de prisão de 1 ano de prisão suspensa subordinada à condição do pagamento até ao termo do período da suspensão que será igualmente de 1 ano, da indemnização fixada em sede civil e a pagar à assistente/demandante Fia…, a quantia de € 2.872,41 a titulo de indemnização por danos morais e patrimoniais, acrescida dos juros civis desde a data da notificação para contestar o pedido de indemnização civil e até efectivo e integral pagamento.

  25. O Tribunal a quo cingiu-se apenas ao grau de ilicitude e à intensidade do dolo (directo)...

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