Acórdão nº 293/22 de Tribunal Constitucional (Port, 27 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelCons. Assunção Raimundo
Data da Resolução27 de Abril de 2022
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 293/2022

Processo n.º 251/21

2.ª Secção

Relatora: Conselheira Assunção Raimundo

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I. Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa, A., Lda. veio interpor recurso ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, doravante, abreviadamente, LTC), do acórdão proferido em conferência, datado de 12 de janeiro de 2021, que manteve a decisão singular, nos seus precisos termos, assim confirmando a decisão de primeira instância que dispensou a sua citação no processo de insolvência, decretando, de seguida, a sua insolvência.

2. Pela Decisão Sumária n.º 758/2021, proferida ao abrigo do artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, decidiu-se não conhecer do objeto do recurso, com a fundamentação seguinte (cf. fls. 195-199):

«[…]

4. No requerimento de interposição de recurso apresentado nos autos, ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º da LTC, a recorrente vem suscitar a inconstitucionalidade da interpretação normativa que «respeita à recusa de aplicação do nº 2, por via da remissão do nº 3, do art. 12º do CIRE, ao caso de pessoa coletiva, em relação à necessidade de audição de familiar do respetivo representante», por entender que a referida interpretação viola o direito a um processo equitativo.

Sucede, porém, que a interpretação normativa tal como enunciada nos autos não constitui a ratio decidendi – ou o fundamento jurídico determinante – da decisão recorrida.

Vejamos.

5. Olhando para o percurso argumentativo do Tribunal a quo, pode claramente constatar-se que o seu critério de decisão é diverso da questão convocada pela recorrente no presente recurso. Com efeito, pode ler-se no acórdão recorrido:

«[…] Como decorre da Decisão Sumária/Singular a citação da apelante foi tentada nos moldes previstos na lei, incluindo através do seu legal representante, com esgotamento das várias hipóteses previstas na lei, sempre sem êxito, não obstante o legal representante da citanda ter perfeito conhecimento das diligências de citação em curso.

[…]

E, não obstante, ter perfeito conhecimento dos atos tendentes à citação da sociedade da qual é legal representante, nunca colaborou com o Tribunal no sentido de indicar uma morada para onde pudesse ser enviada a citação da sua representada ou local onde o mesmo, na qualidade de legal representante, pudesse receber a citação através de correio ou através de contato pessoal. A conclusão de que tudo fez para evitar a citação da sua representada encontra-se espelhada nas várias tentativas de citação que foram levadas a cabo como consta da Decisão Sumária/Singular corroborando o antes decidido pela 1.ª instância».

De seguida, o tribunal recorrido pronuncia-se sobre a interpretação do artigo 12.º, n.ºs 2 e 3 do CIRE, referindo que:

«[…] No caso sub judice, as razões do afastamento do regime previsto no n.º 2 às pessoas coletivas, encontram-se fundamentada na Decisão Sumária/Singular, que se reitera e corrobora, acrescentando-se, ex abunante, como bem faz notar o Ministério Público que «A tentativa de contacto com qualquer familiar do legal representante da Reclamante (art. 12º, nº 2 do CIRE), contra cuja omissão esta indignamente se insurge, mostrar-se-ia, no contexto de desconhecimento de paradeiro do próprio, quase impossível, o que, sendo do seu conhecimento, se traduz em alegação próxima da litigância de má-fé». […]».

E, por fim, sintetiza o seu raciocínio, afirmando:

«Ademais, como dito na Decisão Sumária/Singular, a dispensa de citação não significa a preterição do contraditório e violação do direito a um processo equitativo.

As razões de celeridade em processos desta natureza devem prevalecer, mormente considerando, in casu, os quase sete meses em que decorreram as várias tentativas de citação, o conhecimento do legal representante da citanda das diligências em curso e a sua patente e incompreensível falta de colaboração para a concretização do ato».

Considerando a fundamentação aduzida pelo acórdão recorrido, dúvidas não há que a solução da questão sub judice, neste caso, passou pela análise e interpretação do direito infraconstitucional aplicável, designadamente do regime previsto no artigo 29.º, n.º 1 do CIRE e nos artigos 225.º e seguintes do Código de Processo Civil (em especial, dos seus artigos 246.º, n.º 1, 228.º, n.º 1 e 236.º), aplicáveis ex vi artigo 17.º do CIRE. Ao pronunciar-se sobre a questão convocada pela recorrente, quanto à interpretação do artigo 12.º, n.º 2 do CIRE, o tribunal pronunciou-se como questão acessória, de conhecimento incidental (e, naturalmente também, por ter sido suscitada pela recorrente, relativamente à qual tinha um dever de pronúncia). Com efeito, como se viu, o acórdão recorrido ao julgar válida a dispensa de citação prévia da devedora no âmbito da declaração de insolvência, considerou determinante que: (i) a citação da apelante foi tentada nos moldes previsto na lei, com esgotamento das várias hipóteses previstas na lei, sempre sem êxito; (ii) o representante legal da citanda tinha perfeito conhecimento das diligências de citação em curso; (iii) a sua falta de colaboração com o tribunal para a concretização do ato; e, por fim, (iv) a natureza urgente do processo.

O tribunal não precisou, por isso, de convocar o regime previsto no n.º 2 do artigo 12.º do CIRE, apenas remetendo para o que já era dito...

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