Acórdão nº 55/21.4PEBRG-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Abril de 2022
Magistrado Responsável | C |
Data da Resolução | 04 de Abril de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
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Relatório 1.
Nos autos de inquérito (Atos Jurisdicionais) com o NUIPC 55/21.4PEBRG, a correr termos no DIAP de Vila Nova de Famalicão, em que é arguido H. M., já melhor identificado nos autos, foi proferido em 9/12/2021, no âmbito de primeiro interrogatório de arguido detido, nos termos do artigo 141º do C.P.P., despacho judicial que impôs ao arguido, como medida de coação, para além do TIR já prestado, a medida de prisão preventiva, nos termos do disposto nos artigos 191º,193º,202º, als.a) e c) e 204º,als.b)e c), do CPP, por estar fortemente indiciado da prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo disposto no art.21º,nº1, do D.L. nº15/93, de 22/1, por referência às Tabelas Anexa I-A e I-B.
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Inconformado com a decisão, dela interpôs recurso o arguido, concluindo a sua motivação do seguinte modo (transcrição).
1- A busca domiciliária é nula atento aos fundamentos aduzidos nos pontos 1 a 6 do item A da motivação de recurso, que aqui se dão como reproduzidos, para os devidos e efeitos legais.
2- Em súmula, considera o recorrente que, tendo em conta a definição legal de flagrante delito que a busca foi realizada fora de flagrante delito, uma vez que não se estabelece qualquer nexo de causalidade entre a apreensão do produto estupefaciente na viatura do arguido e o seu domicilio.
Não existe em concreto qualquer referência nos autos que permitam concluir que o arguido tinha no seu domicilio produtos relacionados com o crime de tráfico de estupefacientes, utilizasse o seu domicilio para a guarda desses mesmos produtos, ou no dia dos factos tenha vindo deste mesmo domicilio.
Sendo o arguido é detido, e conduzido à esquadra, constituído arguido e só depois é realizada a busca domiciliária. isto é, 1 hora e 20 m depois da sua detenção.
3- Face ao exposto, para a realização da busca domiciliária haveria necessidade de consentimento do visado, o arguido acompanhou a busca, todavia não se encontra documentado qualquer consentimento por parte do mesmo para a sua realização.
4- Pelo que, a busca realizada nos termos supra deverá ser declarada nula, por violação dos arts 26 nº 1, 34 e 18 da CRP e 174 nº 5 do C.P.P 5- Entende, o recorrente que não existem fortes indícios dos factos descritos nos pontos 1 a 4 e 8 a 10 do despacho recorrido 6- As razões pelas quais sustenta a sua posição, são as indicadas nos pontos 6 a 8 da motivação de recurso que aqui se dão por integralmente reproduzidas.
7- Em súmula, os elementos probatórios coligidos nos autos para sustentar a factualidade que lhe é imputada, não permitem concluir pela existência de actividade ilícita em data anterior à sua detenção, nomeadamente que o arguido se deslocava ao Porto para adquirir produtos estupefacientes, procedendo posteriormente à sua comercialização na cidade de Braga, obtendo as margens de lucro indicadas no ponto 4.
Na verdade, os elementos probatórios elencados para sustentar a referida materialidade, circunscrevem-se ao dia da detenção do arguido e à apreensão de droga e demais objectos. Não são indicados quaisquer elementos que sustentem uma actividade delituosa anterior que concretizem quando, a onde, a quem porque preço, o arguido adquiriria o produto estupefaciente, como, a onde e a quem o vendia na cidade de Braga.
8- Acresce ainda que, quanto aos valores de aquisição e aos lucros presumivelmente obtidos, o tribunal coloca o arguido como revendedor, mas imputa-lhe a obtenção dos valores das vendas a retalho. Por outro lado, o número de doses apurado, é um valor indicativo, uma vez que, não está apurado o grau de pureza do produto estupefaciente e nessa medida, é o valor que será necessariamente diverso.
9- Pelo que, entendemos que os autos não permitem qualificar como "fortes "os indícios da prática pelo arguido dos factos supra descritos, ainda que os demais preenchem a tipo legal do crime que lhe vem indiciado.
Devendo a sua conduta integrar o mesmo dispositivo, mas subsumindo-se à detenção do produto estupefaciente, no dia da sua apreensão.
10- Violou-se o disposto no art 202, nº 1 al a) do C.P.P 11- Entende o recorrente que outras medidas de coacção poderiam acautelar o perigo de continuação da actividade criminosa.
12- O conhecimento da investigação em curso, a ausência de antecedentes criminais e o enquadramento familiar e profissional de que dispõe atenuam o perigo elencado, 13- Aduz no caso da al b), para além da referência genérica da sua existência, o tribunal não concretiza, nem especifica as razões pelas quais, em concreto, existem um enorme alarme social e perturbação da paz publica.
Estamos perante uma situação comum a muitas outras que ocorrem, infelizmente nos dias de hoje, mas que não assume particularidades que permitam qualificar como “enorme “o alarme social, ou que ponham em causa a paz publica.
14- Entende o recorrente que atento ao facto da conduta do arguido se subsumir ao dia da detenção, não existe em concreto perigo de perturbação do inquérito.
15- Na verdade, determina a lei, que a aplicação da prisão preventiva, seja aplicada, quando nenhuma outra se mostrar adequada a acautelar os perigos do artigo 204 do C.P.P.
16- Face ao carácter excepcional da medida de coaçção de prisão preventiva, e por entender que face às razões aduzidas, os perigos das als b) e c) do artigo 204 do C.P.P, estão atenuados, se entende adequado e proporcional, a aplicação de medida de OPHV, prevista no artigo 201 do C.P.P, em casa diversa daquela onde o arguido residia à data dos factos.
17- Violou-se o disposto nos arts 204 al b) e c) e 201 do C.P.P.
18 -Em consequência, deve a decisão recorrida ser revogada, pelas razões aduzidas, substituindo-se a medida de coacção, prisão preventiva, pela medida ora sugerida.
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A Exma Procuradora da República junto da primeira instância respondeu ao recurso, concluindo pela sua improcedência nos seguintes termos: 1. Não merece reparo o despacho ora posto em crise pelo arguido H. M..
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Avultam nos autos fortes e consistentes sinais da prática, por banda do arguido recorrente, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º, nº1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, sendo, neste particular, abundante a prova indiciária existente.
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A busca domiciliária que originou as apreensões efectuadas nos autos não enferma de qualquer nulidade, uma vez que a mesma foi realizada por órgão de polícia criminal, entre as 7 e as 21 horas, na sequência de detenção em flagrante delito por crime punido com pena de prisão, tudo ao abrigo dos art.ºs 177.º n.ºs 3 alínea a) e 174.º n.º 5, do Código de Processo Penal.
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Os perigos de fuga, de perturbação do decurso do inquérito, de perturbação da ordem e tranquilidade públicas e de continuação da actividade criminosa foram bem diagnosticados no despacho impugnado e foram observados os princípios e regras subjacentes à aplicação da prisão preventiva, nomeadamente, os contidos nos arts. 28º, nº2 da C. R. Portuguesa e 191, nº1, 193º, 202º e 204º do C. P. Penal.
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Só a prisão preventiva é susceptível de responder às exigências de natureza cautelar que no caso se fazem sentir, sendo a mesma a única adequada à salvaguarda das referidas exigências cautelares e proporcional à sanção que previsivelmente será aplicada e que passará, inelutavelmente, por pena de prisão efectiva.
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A substituição da prisão preventiva por medida de coacção de permanência na habitação acompanhada de vigilância electrónica (prevista no artigo 201º e Lei 33/2010, de 2/09) não acautela de forma adequada o perigo de fuga, de continuação de actividade criminosa e de perturbação do decurso do inquérito.
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No despacho impugnado não se surpreendem violados os arts. 193º, 202º, 204º ou quaisquer outros preceitos do C. P. Penal ou da C. R. Portuguesa, devendo, pois, o arguido ser mantido em prisão preventiva.
Nestes termos e nos demais de direito aplicável, que vossas excelências doutamente suprirão, deve o recurso ser julgado improcedente, mantendo-se a decisão recorrida, na integra e nos seus precisos termos, assim se fazendo justiça.
4 Neste Tribunal, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Notificado deste parecer, nos termos e para os efeitos do artigo 417º, nº2, do Código de Processo Penal, o arguido nada disse.
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Colhidos os vistos, o processo foi presente à conferência, por o recurso dever ser aí julgado.
Cumpre decidir.
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Fundamentação Sendo pacífico o entendimento de que o âmbito do recurso é dado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação, delimitando para o tribunal superior ad quem as questões a decidir e as razões que devem ser decididas em determinado sentido, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso que eventualmente existam, no caso vertente, atentas as conclusões apresentadas pelo recorrente, as questões a decidir são as seguintes: - nulidade da busca e apreensão domiciliária; - inexistência de fortes indícios dos factos descritos nos pontos 1 a 4 e 8 a 10 do despacho recorrido; - inexistência dos perigos de perturbação grave da ordem e tranquilidade públicas e de perturbação do decurso do inquérito; - adequação e suficiência da medida de coação de obrigação de permanência na habitação à satisfação das exigências cautelares.
Vejamos então.
- Nulidade da Busca e Apreensão Domiciliária Defende o recorrente que a busca domiciliária é nula.
Alega, para o efeito, que “(…) a busca foi realizada fora de flagrante delito, uma vez que não se estabelece qualquer nexo de causalidade entre a apreensão do produto estupefaciente na viatura do arguido e o seu domicilio; Não existe em concreto qualquer referência nos autos que permitam concluir que o arguido tinha no seu domicilio produtos relacionados com o crime de tráfico de estupefacientes, utilizasse o seu domicilio para a guarda desses mesmos produtos, ou no dia dos factos tenha vindo deste mesmo domicilio; (…) o arguido é detido, e conduzido à esquadra, constituído arguido e só depois é realizada a busca domiciliária...
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