Acórdão nº 2465/20.5T8VIS-A.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 31 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelNUNO PINTO OLIVEIRA
Data da Resolução31 de Março de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. — RELATÓRIO 1.

AA e BB, Executados nos autos principais, em que é Exequente Banco Santander Totta, S.A., vieram deduzir oposição à execução, através de embargos.

  1. O Exequente Banco Santander Totta, S.A., contestou, pugnando pela improcedência dos embargos.

  2. O Tribunal de 1.ª instância julgou procedentes os embargos, extinguindo a execução por falta de título executivo.

  3. Inconformado, o Exequente Banco Santander Totta, S.A., interpôs recurso de apelação.

  4. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões: A. A escritura pública do contrato de mútuo com hipoteca – dada à execução – consubstancia título executivo, legalmente admissível nos termos do artigo 703.º, n.º 1 do CPC, resultando daquela a certeza, exigibilidade e liquidação da obrigação exequenda.

    1. A carta que alterou as condições, limitou-se a alargar o prazo de pagamento - a pedido e em benefício exclusivo dos Executados - bem como ajustou correspondentemente o indexante e spread, não pode colocar em causa a exequibilidade do título originário.

    2. A decisão recorrida ao considerar que a obrigação exequenda resulta da carta de alteração de condições datada de 30.09.2013, recusou injustificadamente a exequibilidade do contrato originário, contrariando o regime da ação executiva prevista no Código de Processo Civil.

    3. Resulta a todas as luzes que contrato de mútuo consubstancia o título executivo e reúne todos os elementos necessários à verificação da certeza, exigibilidade e liquidez da dívida.

    4. O aditamento ao aludido contrato apenas altera os prazos de pagamento - aumentando o número de prestações - e atualiza juros, pelo que não modifica o núcleo essencial do contrato nem gera novas obrigações para as partes, sendo certo que nem com essa alteração ora Recorridos pagaram os elevados montantes que o Exequente lhes emprestou.

    5. O facto deste documento revestir forma escrita, mas não estar autenticado, não pode ser motivo atendível e suficiente para retirar força executória ao contrato de mútuo dado à execução.

    6. Os Embargantes, aqui Recorridos, em manifesta e inaceitável má fé processual e material, recusam assim abusivamente a existência de título executivo na presente ação, uma vez que a liquidação da obrigação resulta de alguns elementos constantes da carta de alteração de condições.

    7. Importa ter presente que a aludida modificação das cláusulas terceira e quarta do anexo ao contrato de mútuo, não representa uma modificação contratual substancial e não afeta a certeza jurídica da obrigação exequenda.

      I. A falta de forma do aludido aditamento não é suficiente para prejudicar ou sequer afetar a exequibilidade do contrato originário, o qual cumpre todos os requisitos para assumir força executória.

    8. A concessão de prazo adicional para o cumprimento das obrigações decorrentes do contrato originário, jamais poderá beliscar ou enfraquecer a certeza e força executória conferida ao contrato de mútuo, uma vez que não cria novas obrigações para as partes ou afeta o núcleo essencial do contrato, pelo que não poderá nunca colocar em crise a exequibilidade do contrato de mútuo apresentado como título executivo.

    9. O próprio contrato de mútuo prevê nas cláusulas Nona e Décima Terceira que as alterações das respetivas condições particulares «podem ser feitas por simples troca de correspondência» e que as condições contratuais podem realizar-se através de «documento particular».

      L. Ainda que a liquidação da obrigação em sede executiva resulte de outros elementos que não estejam autenticados, tal não representa um óbice em relação à execução, aliás, existem vários exemplos na ordem jurídica em que os instrumentos de atualização e modificação de condições contratuais não comprometem a validade e força executiva do título M.É perfeitamente admissível que acordos complementares ou extensões de prazo de cumprimento de obrigações sejam alterados sem que tal determine a inexequibilidade do contrato originário – uma vez que não existe uma alteração substancial do contrato – e não fica deste modo comprometida a obrigação exequenda.

    10. Não é razoável a Decisão proferida pelo Tribunal a quo, uma vez que faz uma avaliação incorreta da existência e da validade do título executivo expressamente indicado nos autos principais e além disso, desconsidera o impacto extrajudicial e os riscos que esta decisão poderá ter na desejável e necessária segurança do comércio jurídico.

    11. A Decisão recorrida desrespeita as expectativas legítimas do exequente que acordou com os Executados ora Recorridos a alteração do prazo de cumprimento - a pedido destes e em seu benefício exclusivo - sem nunca afetar as obrigações originárias e nucleares que constam do título executivo apresentado à execução: a escritura pública de contrato de mútuo.

    12. A Decisão recorrida viola inclusivamente o princípio da proteção da confiança uma vez que daquela resulta que o título executivo na posse do Exequente, não é exequível fruto de uma mera extensão do prazo de pagamento concedido a favor dos Executados.

    13. A Decisão a quo coloca em causa a possibilidade de o Exequente ver pagos os montantes mutuados e que não foram liquidados pelos Executados.

    14. A visão formalista e desconectada da realidade que o Tribunal a quo propugna através da Decisão recorrida, viola a confiança legítima do Exequente e gera uma perigosa instabilidade nas relações comerciais, pois abre a porta para que toda e qualquer alteração ao contrato originário lhe retire a força executiva que lhe é conferida por lei.

    15. A Decisão recorrida coloca em crise a estabilidade dos contratos, ignora a teleologia das normas que definem a tipicidade dos títulos executivos e contribui, por fim, para o agravamento das condições dos devedores bancários que em última instância, serão também eles, verdadeiramente prejudicados por uma jurisprudência da qual resulte que os acordos para extensão de prazos de pagamento prejudicam a força executiva do contrato originário.

    16. A decisão do Tribunal a quo ignora o que é o núcleo essencial do contrato, não distinguindo alterações substanciais e não-substanciais dos contratos.

    17. O aditamento apenas procedeu a uma extensão do prazo de pagamento e inerente atualização de taxas de juro, o que a todas as luzes é diferente de uma alteração contratual (substancial) que resulte no aumento do capital mutuado, na prestação de novas garantias ou na vinculação de novos devedores ou terceiros garantes.

      V. A decisão recorrida jamais poderia assumir a insuficiência do título executivo apresentado uma vez que: W. Os acordos posteriores ou documentos complementares não estão sujeitos a formalidade especial, sob pena de o contrato originário perder a sua força executiva – quando essa possibilidade vem expressamente prevista no contrato de mútuo – cláusulas Nona e Décima Terceira.

      X. O título executivo é o instrumento legal de demonstração da obrigação exequenda e representa a certificação da aquisição do direito à prestação pelo exequente – condição indispensável à execução.

    18. A lei não exige que a exigibilidade e/ou liquidação dos valores em dívida decorra exclusivamente do título executivo, podendo alcançar-se este fito através de documentos complementares.

    19. Havendo título executivo válido nos termos do artigo 703.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil, tal é bastante para atribuir ao Exequente o direito à execução coativa da prestação que lhe é devida e foi gerada por contrato aquele contrato que serve de base à execução.

      AA. A escritura pública desse contrato de mútuo com hipoteca é título executivo, uma vez que confere a certeza necessária à pretensão do Exequente, independentemente de posteriormente a liquidação da obrigação e a contagem dos juros devidos tenha de ser feita com recurso a documentos complementares.

      BB. E prevê, tal como se refere, alterações diversas no decurso da vigência do contrato de mútuo com expresso acordo dos mutuários, ora Executados.

      CC. Ao contrário do que resulta da decisão a quo, não se verifica qualquer insuficiência ou falta de título executivo, uma vez que está verificada a certeza, exigibilidade e liquidez da obrigação exequenda que resulta do documento dado à execução e dos documentos juntos, alcançando-se a segurança e certeza suficiente para que a execução prossiga.

      DD. A decisão recorrida coloca ainda em causa a confiança legítima do credor, ora Recorrente, cuja pretensão de executar o crédito em dívida, e desrespeita a força executiva que é atribuída por lei aos documentos exarados por notário.

      EE. A decisão recorrida, ao colocar em crise a exequibilidade da escritura, violou todas as expectativas legítimas, justificadas e fundadas do Exequente, e coloca em causa o princípio da proteção da confiança, sendo a manutenção desta jurisprudência uma ofensa grave ao princípio da proteção da confiança e aos direitos de crédito dos seus titulares.

      Nestes termos e nos melhores de Direito roga-se mui respeitosamente aos Venerandos Desembargadores do Tribunal ‘ad quem’ que concedam provimento a este recurso e revoguem a decisão recorrida por douto Acórdão que:

      1. Decida que a execução prossiga, até aos limites máximos constantes do título executivo junto no processo, entenda-se o contrato de mútuo com hipoteca, nos termos do artigo 726º, nº 3 do Código de Processo Civil.

      2. Caso assim não se entenda, contra o que se espera, nos termos do disposto no artigo 726.º, nº 4 do Código de Processo Civil, requer-se que a Recorrente seja convidada a aperfeiçoar ou a sanar os vícios as irregularidades que lhe sejam apontados.

  5. Os Executados contra-alegaram, pugnando pela improcedência do recurso.

  6. Finalizaram a sua alegação com as seguintes conclusões: 1. São aos presentes contra-alegações a resposta ao recurso interposto pelo Embargado Banco Santander Totta SA, do Mui Douto Saneador Sentença proferida nos autos à margem identificados, que julgou procedentes os presentes embargos de executado e, em consequência, decidiu: 2.

    “Considerando o supra...

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